O morador de Parnaíba, no Piauí, Dener Silva Miranda, de 31 anos, hoje é engenheiro de software e trabalha à distância para uma empresa de Los Angeles, nos Estados Unidos. A sua irmã, Vitória, de 23 anos, estuda Medicina em São Paulo com uma bolsa do Fies, programa de financiamento estudantil do governo federal.
Os pais deles passaram a receber nos anos 2000, o Bolsa Escola e, logo após, o Bolsa Família, o programa de transferência de renda que está prestes a completar 20 anos em outubro de 2023.
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Programa promove mudança social
Do grupo inicial da primeira geração beneficiada pelo programa, apenas 1 em cada 5 filhos continuava sendo atendido pelo Bolsa Família após 14 anos, de acordo com uma pesquisa conduzida pelo Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social, divulgada em abril de 2022.
Tanto Dener quanto sua irmã integram o grupo dos “filhos do Bolsa Família” que conseguiram se desvincular do programa ao entrar na vida adulta. Eles conversaram com a reportagem da BBC News Brasil.
A reportagem, lembra que os pais, a pernambucana Luzinete e o maranhense Francisco foram para São Paulo nos anos 1980. “Minha mãe cortava cabelo e cobrava R$ 2 por corte, mas tinha dia que cortava três, quatro cabelos, e tinha dia que não cortava nenhum, então não tinha uma estabilidade de renda”, recorda.
Dener recorda o início do programa Bolsa Escola em 2001, quando sua família começou a receber um benefício de R$ 15 por criança entre 6 e 15 anos. Esse programa, criado durante o segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), tinha como objetivo auxiliar famílias com renda per capita abaixo de R$ 90 por pessoa, com a contrapartida de manter as crianças na escola.
Em 2003, durante o primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a família de Dener passou a receber o Bolsa Família. Esse novo programa unificou quatro programas de transferência de renda do governo FHC (Bolsa Escola, Vale Gás, Bolsa Alimentação e Cartão Alimentação).
Inicialmente, o Bolsa Família oferecia um benefício básico de R$ 50 para famílias com renda per capita de até R$ 50 e um benefício variável de R$ 15 (também com limite de R$ 45) para famílias com crianças cuja renda per capita fosse de até R$ 100.
Bolsa Família proporcionou estabilidade financeira
Para Dener, o Bolsa Família proporcionou uma certa estabilidade à sua família naquela época, garantindo o essencial. Embora reconheça que o programa não resolvia todos os problemas, ele representava uma fonte confiável de apoio financeiro.
No entanto, a vida ainda apresentava desafios. Dener lembra de uma situação em que recebeu uma bolsa parcial para estudar em uma escola particular, mas não havia recursos para comprar lanches.
Sua mãe usava parte do dinheiro do Bolsa Família para pagar a mensalidade escolar, e Dener, preocupado com as finanças da família, optou por mudar para uma escola pública, onde a merenda era oferecida, evitando assim a fome durante as aulas.
Dener estudou a maior parte do ensino fundamental em escola pública, enquanto sua irmã Vitória, em um período de melhoria econômica da família, frequentou o Sesi e escolas particulares em Parnaíba.
Receberam o Bolsa Família até 2006 ou 2007, mas à medida que a situação econômica no Brasil melhorou, seus pais começaram a prosperar. Quando a assistente social visitou a família para renovar o benefício, sua mãe declarou que não precisava mais da assistência.
Mudando de realidade
A grande reviravolta na vida da família ocorreu quando o pai de Dener se tornou professor de mecânica de motos no Pronatec, um programa de ensino técnico criado durante o governo de Dilma Rousseff.
Dener ingressou em uma escola técnica estadual em 2007 e, posteriormente, no Instituto Federal do Piauí em Parnaíba, onde teve acesso a professores especializados em programação.
Com a expansão das universidades públicas, Dener se tornou o primeiro membro de sua família a cursar uma faculdade, estudando Ciência da Computação na Universidade Federal do Ceará (UFC) e participando do programa Ciência sem Fronteiras como bolsista internacional.
Aos 23 anos, Vitória segue o mesmo caminho, estudando Medicina em São Paulo com uma bolsa do Fies. Dener enfatiza que o Bolsa Família não foi a única ferramenta responsável por essa transformação. Ele destaca a importância do investimento em educação, infraestrutura e outras áreas para alcançar uma mudança social significativa.
Essa visão é corroborada por estudos do Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social (IMDS) que mostram que a maioria dos beneficiários do Bolsa Família encontra uma “porta de saída” do programa ao longo do tempo.
Além disso, segundo a reportagem, esses estudos revelam que muitos jovens que cresceram em famílias beneficiárias do programa acessaram o mercado de trabalho formal e buscaram mais educação, desafiando a ideia de que o Bolsa Família cria dependência.
Os dados também apontam que fatores como gênero, raça e nível de escolaridade dos pais influenciam o acesso ao mercado de trabalho e à educação dos filhos de beneficiários do programa.
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