Acesse o conteúdo completo – As guardas municipais na jurisprudência do STJ e do STF
Olá turma, como estão os estudos? Recentemente o STJ proferiu mais uma decisão que envolve uma instituição que tem ganhado destaque no ordenamento jurídico nacional, seja por sua presença constante já jurisprudência nacional, seja por sua presença em recentes legislações: as guardas municipais.
As guardas municipais na legislação
A instituição foi prevista na Constituição Federal de 1988 (CF/88), em seu artigo 144, § 8: Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei.
Essa lei referida pela CF/88 chegou apenas em 2014 (Lei n. 13.022), a qual dispões de normas gerais sobre as guardas municipais, definindo-as como “instituições de caráter civil, uniformizadas e armadas conforme previsto em lei” e que têm como incumbência “proteção municipal preventiva, ressalvadas as competências da União, dos Estados e do Distrito Federal”.
Ademais, a referida lei ordinária detalhou a destinação das guardas municipais estabelecida pela CF/88, ao explicitar que é “competência geral das guardas municipais a proteção de bens, serviços, logradouros públicos municipais e instalações do Município”.
Outra norma infraconstitucional que disciplina a atuação das Guardas Municipais é a lei do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), a qual dispões que: “É instituído o Sistema Único de Segurança Pública (Susp), que tem como órgão central o Ministério Extraordinário da Segurança Pública e é integrado pelos órgãos de que trata o art. 144 da Constituição Federal , pelos agentes penitenciários, pelas guardas municipais e pelos demais integrantes estratégicos e operacionais, que atuarão nos limites de suas competências, de forma cooperativa, sistêmica e harmônica”.
No SUSP, as guardas municipais são colocadas ao lado das policiais civis e militares, como órgão operacional do referido sistema (art. 9°, § 2º, VII).
Outra normativa que trata sobre as guardas municipais é o Estatuto do Desarmamento, o qual estabelece que os integrantes das guardas municipais têm porte de arma de fogo em todo o território nacional, nas condições do regulamento da referida lei, fixando de antemão que “A autorização para o porte de arma de fogo das guardas municipais está condicionada à formação funcional de seus integrantes em estabelecimentos de ensino de atividade policial, à existência de mecanismos de fiscalização e de controle interno, nas condições estabelecidas no regulamento desta Lei, observada a supervisão do Ministério da Justiça” (art. 6º, III e § 3º).
O regulamento do estatuto do desarmamento fixa ainda que o porte de armas é funcional e limitado ao território “do Estado em que exercerem a função”, podendo portá-las “nos deslocamentos para suas residências, mesmo quando localizadas em Município situado em Estado limítrofe” (art. 57, II e parágrafo único, do Decreto n. 11.615/2023).
Por fim, a regulação desse órgão compete ainda aos municípios, por meio de leis locais.
O porte de armas fora de serviço
A decisão recente do STJ[1] que chamou a atenção do público jurídico foi expedida por seu Presidente em exercício, il. Ministro Og Fernandes, o qual analisou pedidos de habeas corpus preventivos no sentido de conceder salvo-conduto para que agentes de guarda municipal pudesse portar arma de fogo mesmo fora de serviço.
Segundo os alegados pacientes, a Polícia Rodoviária Federal estaria autuando por porte ilegal de arma de fogo integrantes de guardas municipais que estiverem de posse do objeto fora do exercício das funções, em horários de folga, por exemplo.
A demanda não foi admitida pelo então Presidente do STJ, em virtude de vícios processuais (ausência de risco iminente de violação ao direito de locomoção), as a discussão permanece: guardas municipais têm direito a portar arma de fogo fora do horário de serviço?
As guardas municipais como órgãos de segurança pública
Outra discussão envolvendo as guardas municipais envolveu o debate sobre sua natureza jurídica. O STJ proferia diversos precedentes no sentido de que “A Constituição Federal de 1988 não atribui à guarda municipal atividades ostensivas típicas de polícia militar ou investigativas de polícia civil, como se fossem verdadeiras polícias municipais, mas tão somente de proteção do patrimônio municipal, nele incluídos os seus bens, serviços e instalações. A exclusão das guardas municipais do rol de órgãos encarregados de promover a segurança pública (incisos do art. 144 da Constituição) decorreu de opção expressa do legislador constituinte, apesar das investidas em contrário, por não incluir no texto constitucional nenhuma forma de polícia municipal” (REsp n. 1.977.119/SP, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 16/8/2022, DJe de 23/8/2022).
Assim, o STJ em limitado a atividade das guardas municipais, obstando sua autuação em atividades de patrulhamento urbano ou a realização de busca pessoal em caso de flagrante delito, em que pese poder realizar a prisão, assim como qualquer do povo.
Nesse contexto, o STF, ao analisar o já mencionado art. 9º da Lei do SUSP, definiu que “as Guardas Municipais executam atividade de segurança pública (art. 144, § 8º, da CF), essencial ao atendimento de necessidades inadiáveis da comunidade (art. 9º, § 1º, da CF). O reconhecimento dessa posição institucional das Guardas Municipais possibilitou ao CONGRESO NACIONAL, em legítima opção legislativa, no § 7º do artigo 144 da Constituição Federal, editar a Lei nº 13.675, de 11/6/2018, na qual as Guardas Municipais são colocadas como integrantes operacionais do Sistema Único de Segurança Pública (art. 9º, § 1º, inciso VII).
Assim, de modo expresso, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a Guarda Municipal é “órgão de segurança pública”[2].
O direito de greve
Antes mesmo de afirmar expressamente a natureza das guardas municipais como órgãos de segurança pública, o STF já havia reconhecido, sob o rito da repercussão geral, que desempenham serviço “essencial ao atendimento de necessidades inadiáveis da comunidade (art. 9º, § 1º, CF), pelo que se submetem às restrições firmadas pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE 654.432 (Rel. Min. EDSON FACHIN, redator para acórdão Min. ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 5/4/2017).
Nesses termos, os guardas municipais, como órgãos de segurança pública, não podem exercer o direito de greve[3].
As guardas municipais e o porte de armas: cenário atual
Voltando à discussão que iniciou este texto, sabe-se que a possibilidade de porte de arma de fogo por agentes das guardas municipais, fora de serviço, ainda é uma questão não resolvida definitivamente.
Ocorre que, sobre essa temática, o STF decidiu que anteriores restrições impostas pelo Estatuto do Desarmamento, ao porte de arma de fogo por integrantes das guardas municipais, tendo por base a população do município, era inconstitucionais, por falta de razoabilidade e por violação da isonomia[4].
Assim, o STF declarou a inconstitucionalidade do inciso III do art. 6º da Lei 10.826/2003, “a fim de invalidar as expressões ‘das capitais dos Estados’ e ‘com mais de 500.000 (quinhentos mil) habitantes’”, e declarar a inconstitucionalidade do inciso IV do art. 6º da Lei 10.826/2003, por desrespeito aos princípios constitucionais da igualdade e da eficiência.
Nesse contexto, o porte de arma em serviço tem sido reconhecido para integrante de guarda de qualquer município, independente de sua população, quando estiver atuando no exercício das funções.
Ocorre que, como verificado acima, o porte fora do serviço ainda é um problema a ser resolvido.
Guarda municipal não é polícia municipal
Em que pese esse olhar mais progressista lançado pelo STF sobre a instituição das guardas municipais, o Superior Tribunal de Justiça tem buscado reiteradamente delimitar suas atividades.
Recentemente, a Terceira Seção do STJ definiu que, “salvo na hipótese de flagrante delito, só é possível que as guardas municipais realizem excepcionalmente busca pessoal[5] se, além de justa causa para a medida (fundada suspeita), houver pertinência com a necessidade de tutelar a integridade de bens e instalações ou assegurar a adequada execução dos serviços municipais, assim como proteger os seus respectivos usuários.”
Essa orientação, inclusive, tem semelhança com julgado da Primeira Turma do STF, segundo o qual “as guardas municipais não estão autorizadas a, ultrapassando os limites próprios de uma prisão em flagrante, realizar diligências investigativas ou diligências prévias voltadas à apuração de crimes”[6] (Rel. Ministro Alexandre de Moraes, Rel. p/ o acórdão Ministro Roberto Barroso, DJe 13/6/2022).
Em síntese, para o STJ, que possui orientação consolidade por sua Terceira Seção nesse aspecto, “A Constituição Federal de 1988 não atribui à guarda municipal atividades ostensivas típicas de polícia militar ou investigativas de polícia civil, como se fossem verdadeiras ‘polícias municipais’”.
A aposentadoria especial por atividade de risco
Apesar do posicionamento mais restritiva do STJ, sobre a atuação das guardas municipais, sua orientação tem base em um entendimento do STF que veda aos guardas municipais a possibilidade aposentadoria especial por exercício de atividade risco, justamente porque guarda municipal não se equipara a policial civil ou militar.
Com efeito, segundo decidiu o STF, em regime de repercussão geral, “Os guardas civis não possuem direito constitucional à aposentadoria especial por exercício de atividade de risco prevista no artigo 40, § 4º, inciso II, da Constituição Federal”[7].
Segundo o STF, em precedente que fundamentou o referido julgado, “a maior proximidade da atividade das guardas municipais com a área de segurança pública é inegável. No entanto, trata-se de uma atuação limitada, voltada à preservação do patrimônio municipal, e de caráter mais preventivo que repressivo”[8].
Enfim, esperamos que esse rol exemplificativo de casos seja útil para estudos e revisões. Para maiores detalhes, os acórdãos dos julgados citados estão disponíveis por meio dos links constantes do texto e caso saibam de mais algum julgado interessante na jurisprudência do STJ e do STF sobre o tema, podem citar nos comentários.
[1] HC 884386/DF, relator Ministro OG FERNANDES, decisão monocrática, julgado em 22/1/2024, DJe de 24/1/2024.
[2] ADPF 995, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 28-08-2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 06-10-2023 PUBLIC 09-10-2023.
[3] RE 846854, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 01-08-2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-022 DIVULG 06-02-2018 PUBLIC 07-02-2018.
[4] ADI 5538, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 01-03-2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-094 DIVULG 17-05-2021 PUBLIC 18-05-2021.
[5] HC n. 830.530/SP, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 27/9/2023, DJe de 4/10/2023.
[6] RE 1281774 AgR-ED-AgR, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Relator(a) p/ Acórdão: ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 13-06-2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-170 DIVULG 25-08-2022 PUBLIC 26-08-2022.
[7] ARE 1215727 RG, Relator(a): MINISTRO PRESIDENTE, Tribunal Pleno, julgado em 29-08-2019, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-210 DIVULG 25-09-2019 PUBLIC 26-09-2019.
[8] MI 6515 AgR, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 20-06-2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-262 DIVULG 05-12-2018 PUBLIC 06-12-2018.
Fonte: Estratégia Concursos