Baixe o material de estudo
A dosimetria da pena no direito penal brasileiro segue o critério trifásico previsto no artigo 68 do Código Penal. O processo começa com a fixação da pena-base, prossegue com a análise das circunstâncias agravantes e atenuantes e, por fim, considera as causas de aumento ou de diminuição de pena. Esse modelo busca assegurar que a punição seja proporcional ao fato praticado e às condições pessoais do agente.
As circunstâncias agravantes e atenuantes desempenham importante papel nesse processo, pois ajustam a pena conforme a gravidade do crime e as condições subjetivas do réu. São mecanismos que permitem ao julgador individualizar a sanção de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto.
As agravantes estão ligadas a situações que aumentam a gravidade da conduta ou a reprovação social do ato. Exemplos comuns são a reincidência, o uso de violência excessiva, a premeditação, o emprego de arma de fogo ou a motivação discriminatória. Nessas hipóteses, a lei entende que a conduta merece punição mais severa.
Já as atenuantes correspondem a fatores que reduzem a culpabilidade do agente, reconhecendo que, apesar do crime, existem elementos que justificam uma resposta menos rigorosa. A confissão espontânea, a primariedade, a menoridade relativa (menor de 21 anos ao tempo do fato), a senilidade (maior de 70 anos na data da sentença) e a reparação do dano antes da sentença são exemplos relevantes.
O Código Penal disciplina essas hipóteses de forma expressa. As agravantes estão previstas principalmente nos artigos 61 e 62, enquanto as atenuantes aparecem no artigo 65 e, de maneira aberta, no artigo 66, que autoriza o juiz a considerar outras circunstâncias relevantes ainda que não previstas em lei.
Em casos de concurso entre agravantes e atenuantes, o magistrado deve ponderar qual delas tem maior peso no caso concreto. Essa análise envolve aspectos como a personalidade do agente, a gravidade do crime e eventual reincidência, permitindo um equilíbrio na dosimetria da pena.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem papel essencial na consolidação de entendimentos sobre o tema. O tribunal define limites e orientações sobre como as circunstâncias devem ser aplicadas, garantindo segurança jurídica e uniformidade no cálculo das penas.
Um dos entendimentos mais importantes é a Súmula 231/STJ, que estabelece que a incidência de atenuante não pode reduzir a pena abaixo do mínimo legal. Assim, mesmo havendo circunstâncias favoráveis ao réu, o juiz não pode fixar a sanção aquém do limite estabelecido pelo legislador.
Outro ponto reafirmado pelo STJ é que não se admite compensação entre institutos de fases distintas da dosimetria. Ou seja, agravantes e atenuantes da segunda fase não podem servir para neutralizar causas de aumento ou diminuição que pertencem à terceira fase do cálculo.
Nos crimes de roubo circunstanciado, por exemplo, o STJ exige fundamentação concreta para a majoração da pena. Não basta que o juiz mencione a existência de agravantes; é necessário justificar de forma clara como elas influenciaram a fixação da pena.
A confissão espontânea também é objeto de atenção na jurisprudência. O tribunal reconhece que essa atenuante pode incidir mesmo quando o réu admite a autoria, mas tenta justificar a conduta com alegação de excludente de ilicitude ou culpabilidade. Esse entendimento amplia o alcance da chamada “confissão qualificada”.
A reincidência, por sua vez, é constantemente debatida. O STJ admite que ela seja considerada tanto na segunda fase da dosimetria, como agravante, quanto na primeira, para caracterizar maus antecedentes. Essa possibilidade, entretanto, exige cautela para evitar o chamado bis in idem.
Outro aspecto relevante é a exigência de prova formal para o reconhecimento de certas atenuantes, como a menoridade relativa. Não basta a alegação da defesa; é necessário documento hábil que comprove a idade do réu no momento do fato.
Há ainda situações em que o STJ admite a compensação parcial entre reincidência e confissão espontânea, uma vez que se trata de uma agravante e uma atenuante da mesma fase. Contudo, a Corte ressalta que essa compensação não pode ser integral em casos de reincidência múltipla, pois a gravidade da conduta reiterada não pode ser anulada apenas pela confissão.
Em síntese, a aplicação de agravantes e atenuantes, conforme a interpretação consolidada pelo STJ, busca conciliar justiça e proporcionalidade. O sistema penal reconhece que cada crime tem suas particularidades e que a pena deve refletir não apenas a gravidade objetiva do fato, mas também a trajetória pessoal e as circunstâncias do agente. Esse equilíbrio é fundamental para que a pena cumpra seu papel de retribuição e prevenção, sem deixar de observar critérios de humanidade e razoabilidade.
Autora: Carolina Carvalhal Leite. Mestranda em Direito Penal. Especialista em Direito Penal e Processo Penal; e, Especialista em Ordem Jurídica e Ministério Público. Graduada em Direito pelo UniCeub – Centro Universitário de Brasília em 2005. Docente nas disciplinas de Direito Penal, Processo Penal e Legislação Extravagante em cursos de pós-graduação, preparatórios para concursos e OAB (1ª e 2ª fases). Ex-servidora pública do Ministério Público Federal (Assessora-Chefe do Subprocurador-Geral da República na Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão – PFDC). Advogada inscrita na OAB/DF e OAB/SC.
Fonte: Gran Cursos Online