Conteúdo liberado – Informativo STJ 844 Parte 1 Comentado

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O tempo passa, o tempo voa, e a nossa caminhada jurisprudencial continua numa boa…. Informativo nº 844 Parte 1 do STJ COMENTADO na sua telinha!

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1.          Litigância Predatória e Emenda da Inicial

Indexador                                                     

Disciplina: Direito Processual Civil

Capítulo: Petição Inicial

Área

Magistratura

Destaque

Diante de indícios de litigância predatória, o juiz pode exigir, de forma fundamentada, a emenda da petição inicial com apresentação de documentos que demonstrem o interesse de agir e a verossimilhança do direito, desde que observadas as regras de distribuição do ônus da prova.

REsp 2.021.665-MS, Rel. Min. Moura Ribeiro, Corte Especial, julgado em 13/03/2025 (Tema 1198).

Conteúdo-Base

???? O art. 319 do CPC disciplina os requisitos da petição inicial, e o art. 321 permite ao juiz determinar sua emenda para suprir irregularidades.

???? A medida visa coibir fraudes processuais em demandas massificadas, protegendo a boa-fé objetiva, a efetividade da jurisdição e o sistema de justiça.

???? O juiz pode exigir documentos como extratos, contratos, procuração atualizada, comprovantes de residência, entre outros, conforme as peculiaridades do caso concreto.

???? A exigência deve respeitar os princípios do devido processo legal, da cooperação e da duração razoável do processo.

???? A cautela não configura cerceamento de acesso à justiça, mas instrumento de filtragem de lides potencialmente abusivas.

Discussão e Tese

???? A controvérsia girou em torno da possibilidade de o magistrado exigir documentos além dos previstos legalmente quando identificados sinais de litigância predatória ou abusiva.

⚖️ Para o STJ:

            •          A exigência é válida se fundamentada e proporcional.

            •          A verificação da legitimidade da demanda protege a jurisdição contra fraudes.

            •          O juiz deve zelar pela higidez do processo, mesmo em fase inicial.

Como será Cobrado em Prova

???? O juiz pode exigir a emenda da petição inicial com apresentação de documentos que demonstrem o interesse de agir, quando houver indícios de litigância predatória.

✅ Correto. O STJ afirma que essa medida é compatível com os princípios constitucionais do processo.

???? A exigência judicial de documentos não previstos no rol do art. 319 do CPC constitui nulidade por cerceamento de defesa.

❌ Errado. A jurisprudência admite a emenda da inicial com base na razoabilidade e na boa-fé processual.

Versão Esquematizada

???? Litigância Abusiva e Emenda da Inicial
???? Juiz pode exigir documentos adicionais em caso de indício de fraude. ???? Exigência deve ser fundamentada e proporcional. ???? Visa garantir efetividade da jurisdição e segurança jurídica. ???? Não há nulidade se respeitados os princípios processuais.

Inteiro Teor

     Cinge-se a controvérsia em verificar a possibilidade de o juiz, em um estágio inicial do processo, exigir que a parte apresente documentos capazes de evidenciar a verossimilhança do direito alegado, pavimentando, dessa forma, o caminho para a entrega de uma tutela jurisdicional efetiva e coibindo, a um só tempo, a prática de fraudes processuais. Ou seja, saber até que ponto ou em qual medida o juiz, antevendo a natureza temerária da lide, pode exigir da parte autora que apresente documentos capazes de confirmar a seriedade da pretensão deduzida em juízo.

     Nas sociedades de massa, em que a grande maioria da população integra processos de produção, distribuição e consumo de larga escala, é esperado o surgimento de demandas e lides também massificadas. Essa litigância de massa, conquanto apresente novos desafios ao Poder Judiciário, constitui manifestação legítima do direito de ação.

     Observa-se, no entanto, em várias regiões do país, verdadeira avalanche de processos infundados, marcados pelo exercício de advocacia abusiva, predatória, que não encontra respaldo no legítimo direito de ação. Tais feitos não apenas embaraçam o exercício de uma jurisdição efetiva, mas verdadeiramente criam sérios problemas de política pública, conforme identificado por órgãos de inteligência de vários tribunais do país.

     A possibilidade de o juiz exigir a apresentação de documentos para comprovar o interesse de agir ou a verossimilhança do direito alegado tem sido admitida por esta Corte e também pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em diversas situações.

     Por isso, poderá o juiz, a fim de coibir o uso fraudulento do processo, exigir que o autor apresente extratos bancários, cópias de contratos, comprovante de residência, procuração atualizada e com poderes específicos, dentre outros documentos, a depender de cada caso concreto.

     A procuração outorgada para determinada causa em regra não subsiste para outras ações distintas e desvinculadas, porque uma vez executado o negócio cessa o mandato para o qual outorgado (art. 682, IV, do Código Civil – CC). Assim, caso o advogado apresente instrumento muito antigo, dando margem a descrença de que não existe mais relação atual com o cliente, é lícito ao juiz determinar que a situação seja esclarecida, com juntada de um eventual novo instrumento.

     A cautela indicada tem respaldo em princípios constitucionais de acesso à justiça, de proteção ao consumidor e de duração razoável do processo, harmonizando-se, ainda, com os postulados legais que privilegiam o julgamento de mérito e impõem o dever de cooperação entre os sujeitos do processo que, afinal, precisa ter desenvolvimento válido e regular.

     O risco de exigências judiciais excessivas, como de resto o de qualquer decisão judicial equivocada, constitui realidade inexpugnável, ínsita ao sistema de Justiça, mas que deve ser controlado pontualmente em cada processo, não podendo ser invocado como obstáculo à adoção de boas práticas na condução judicial do feito.

2.         Militar Temporário Licenciado: Aplicação do Estatuto dos Militares

Indexador

Disciplina: Direito Administrativo Militar

Capítulo: Regime Jurídico dos Militares

Área

Magistratura

Procuradoria

Destaque

Militar temporário licenciado antes da vigência da Lei n. 13.954/2019 tem seu eventual direito à reintegração e à reforma apreciado com base na Lei n. 6.880/1980, à luz do princípio tempus regit actum.

REsp 2.175.376-PE, Rel. Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 18/03/2025.

Conteúdo-Base

???? O princípio tempus regit actum determina a aplicação da lei vigente à época do ato jurídico.

???? O Supremo Tribunal Federal, no Tema 24 da Repercussão Geral, reconheceu que militares não possuem direito adquirido a regime jurídico.

???? Para ex-militares temporários desligados antes da nova lei, não subsiste vínculo jurídico atual com a União que permita aplicação retroativa da nova legislação.

???? A análise do direito à reforma ou reintegração deve observar a legislação em vigor no momento do licenciamento.

???? A Lei n. 13.954/2019 não retroage para alcançar atos jurídicos perfeitos e acabados, como licenciamento já consumado.

Discussão e Tese

???? A controvérsia tratou de pedido de reforma por incapacidade feito por militar temporário licenciado antes da vigência da Lei n. 13.954/2019.

⚖️ Para o STJ:

            •          Aplica-se a Lei n. 6.880/1980, vigente à época do licenciamento.

            •          O princípio tempus regit actum impede retroação da nova lei.

            •          A reforma ou reintegração deve ser analisada conforme o regime jurídico anterior.

Como será Cobrado em Prova

???? O direito à reforma de militar temporário licenciado antes da vigência da Lei n. 13.954/2019 deve ser analisado conforme o Estatuto dos Militares então vigente.

✅ Correto. O STJ aplicou o princípio tempus regit actum e afastou a retroatividade da nova lei.

Versão Esquematizada

???? Militar Temporário e Direito à Reforma
???? Aplica-se a lei vigente ao tempo do licenciamento. ???? A Lei n. 13.954/2019 não tem efeito retroativo para ex-militares. ???? O STF reconhece ausência de direito adquirido a regime jurídico futuro. ???? STJ aplica o princípio tempus regit actum para definir o regime aplicável.

Inteiro Teor

     Trata-se de controvérsia a envolver matéria de Direito Intertemporal.

     Com efeito, o caso em análise volta-se a situação envolvendo militar temporário licenciado quando da vigência da Lei n. 13.954/2019.

     Como é cediço, a relação jurídica existente entre os militares em atividade das Forças Armadas e a Administração Pública é de trato sucessivo e, portanto, sujeita-se à cláusula rebus sic stantibus, no que concerne aos efeitos dessa relação jurídica que se protrai no tempo.

     Essa compreensão se ampara na premissa de que os militares não possuem direito adquirido a regime jurídico, tal como decidido pelo Supremo Tribunal Federal no Tema n. 24/STF (RE n. 563.708); sendo assim, inexistindo ressalva em sentido contrário, as modificações introduzidas pela Lei n. 13.954, de 16/12/2019, às Leis n. 6.880/1980 (Estatuto dos Militares) e 4.375/1965 (Lei do Serviço Militar) são plenamente aplicáveis aos militares que, à época, já se encontravam no serviço ativo das Forças Armadas, temporários ou de carreira.

     Contudo, ao contrário da hipótese mencionada acima, é a do o ex-militar temporário que, ao tempo do início da vigência da Lei n. 13.954/2019 já se encontrava licenciado das Forças Armadas, não possuía vínculo jurídico com a União.

     Em tal situação, uma vez que não é possível falar em uma relação jurídica de trato sucessivo, o eventual direito à reintegração e à reforma do ex-militar temporário deve ser examinado segundo o princípio tempus regit actum, levando-se em consideração a legislação vigente ao tempo do licenciamento tido por ilegal.

     Portanto, ao ex-militar temporário licenciado do serviço ativo das Forças Armadas antes da vigência da Lei n. 13.954/2019, deve-se aplicar legislação vigente ao tempo do licenciamento, motivo pelo qual seu eventual direito à reintegração e à reforma militar deve ser apreciado à luz das disposições contidas na Lei n. 6.880/1980 (anteriores à Lei n. 13.954/2019).

3.        Embargos de Declaração por Maioria: Aplicação da Técnica de Julgamento Ampliado

Indexador

Disciplina: Direito Processual Civil

Capítulo: Recursos

Área

Magistratura

Defensoria Pública

Ministério Público

Destaque

Aplica-se a técnica de julgamento ampliado ao julgamento não unânime de embargos de declaração quando o voto vencido for apto a alterar o resultado da apelação, pois os embargos constituem extensão do próprio recurso.

REsp 2.072.052-RJ, Rel. Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 11/03/2025.

Conteúdo-Base

???? O art. 942 do CPC/2015 prevê que, havendo julgamento não unânime de apelação, deve haver ampliação do colegiado.

???? Quando os embargos de declaração são julgados por maioria e o voto vencido tem aptidão para modificar o resultado da apelação, a técnica do art. 942 também se aplica.

???? Os embargos integram a sequência lógica do julgamento da apelação e podem impactar substancialmente o mérito da causa.

???? O STJ entende que, nessas hipóteses, a divergência nos embargos tem o potencial de subverter o resultado do julgamento anterior, exigindo nova composição.

???? A omissão reconhecida por voto vencido nos embargos, se acolhida, poderia alterar a decisão inicial, razão pela qual deve ser julgada com observância ao rito ampliado.

Discussão e Tese

???? A controvérsia foi se a técnica de julgamento ampliado deve ser aplicada quando os embargos de declaração opostos à apelação forem rejeitados por maioria, com voto vencido apto a alterar o resultado da apelação.

⚖️ Para o STJ:

            •          A técnica se aplica mesmo aos embargos, se eles tiverem potencial de alterar o julgamento da apelação.

            •          A lógica do art. 942 prioriza a colegialidade qualificada e a coerência decisória.

            •          O rito ampliado garante maior segurança e legitimidade processual.

Como será Cobrado em Prova

???? A técnica do art. 942 do CPC aplica-se exclusivamente aos julgamentos da apelação, não alcançando os embargos de declaração, ainda que não unânimes.

❌ Errado. A jurisprudência admite a aplicação da técnica aos embargos quando houver divergência relevante com aptidão modificativa.

???? O voto vencido em embargos de declaração pode ensejar a aplicação da técnica de julgamento ampliado, se tiver potencial de alterar o resultado da apelação.

✅ Correto. O STJ entende que, nessa hipótese, o julgamento dos embargos constitui extensão da apelação e deve observar o rito do art. 942.

Versão Esquematizada

???? Julgamento Ampliado em Embargos Não Unânimes
???? Aplica-se o art. 942 se o voto vencido puder alterar o resultado da apelação. ???? Embargos são extensão lógica do julgamento da apelação. ???? Técnica reforça a colegialidade e a legitimidade da decisão. ???? Divergência relevante exige reexame por composição ampliada.

Inteiro Teor

          A questão jurídica controvertida diz respeito à necessidade ou não de aplicação da técnica do julgamento ampliado, previsto no art. 942 do Código de Processo Civil/2015, na hipótese em que, a despeito de se ter sido julgado por unanimidade o recurso de apelação, os aclaratórios opostos na sequência são decididos por maioria, possuindo, o voto vencido, aptidão para inverter o resultado unânime inicial no apelo ordinário.

     No caso em deslinde, foi aviado o recurso de apelação contra sentença favorável à parte autora, tendo sido desprovida à unanimidade, já na vigência do CPC/2015. Naquela assentada, concluiu-se pelo descabimento da alegação de fraude à execução e manteve-se o comando sentencial pela desconstituição de penhora.

     Contra esse primeiro decisum, valeu-se, a parte, do recurso integrativo referindo omissão no acórdão embargado. Os embargos de declaração foram rejeitados por maioria.

     Importa destacar, contudo, que o voto vencido, no julgamento integrativo, vislumbrou a existência de omissão passível de reverter o resultado inicial da apelação.

     Nessa situação, a despeito de a letra do art. 942 do CPC/2015 não determinar o julgamento ampliado para os embargos de declaração opostos contra acórdão em apelação, a doutrinária sinaliza em favor da necessidade de se aplicar a aludida técnica também nesses casos, isto é, quando o julgado integrativo se der por maioria.

     Nesse contexto, o Superior Tribunal de Justiça já se posicionou no sentido de que “a técnica de julgamento ampliado, positivada no art. 942 do códex processual em vigor, deve ser observada nos embargos de declaração não unânimes decorrentes de acórdão de apelação, quando a divergência for suficiente à alteração do resultado inicial, pois o julgamento dos embargos constitui extensão da própria apelação, mostrando-se irrelevante o resultado majoritário dos embargos (se de rejeição ou se de acolhimento, com ou sem efeito modificativo)” (REsp 1.786.158/PR, rel. Ministra Nancy Andrighi, rel. p/ acórdão Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, DJe de 1/9/2020).

     Destarte, ao deixar de aplicar a técnica de julgamento ampliado no exame dos embargos de declaração, o Tribunal a quo incorreu, a um só tempo, em negativa de vigência ao art. 942 do CPC e em error in procedendo, sendo, por isso, de rigor o retorno dos autos à origem para que prossiga na análise colegiada do recurso integrativo, desta feita, observando-se o aludido rito legal ampliado.

4.        Erro Médico no SUS: Inversão do Ônus da Prova por Hipossuficiência Técnica do Paciente

Indexador

Disciplina: Direito Administrativo

Capítulo: Responsabilidade Civil do Estado

Área

Magistratura

Ministério Público

Defensoria Pública

Destaque

Embora não se aplique o CDC aos serviços prestados pelo SUS, é possível redistribuir o ônus da prova em razão da hipossuficiência técnica do paciente e da melhor condição probatória do ente público.

REsp 2.161.702-AM, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Segunda Turma, julgado em 18/03/2025.

Conteúdo-Base

???? A legislação consumerista não incide sobre serviços públicos universais e indivisíveis, como os prestados pelo SUS.

???? A responsabilidade civil do Estado continua sendo objetiva, mas o processo é regido pelo direito administrativo, não pelo CDC.

???? A redistribuição do ônus da prova pode ser determinada diante da hipossuficiência técnica do paciente e da maior facilidade probatória da administração.

???? A inversão não é automática: exige demonstração de verossimilhança da alegação e da desvantagem técnica do usuário do serviço.

???? A análise deve considerar o caso concreto e o equilíbrio entre as partes, à luz do princípio da cooperação processual.

Discussão e Tese

???? A controvérsia envolveu pedido indenizatório por erro médico no SUS e a aplicação da inversão do ônus da prova com base no CDC, afastada pelo STJ, mas com admissão de redistribuição com base em critérios técnico-probatórios.

⚖️ Para o STJ:

            •          O CDC não se aplica aos serviços prestados uti universi.

            •          A redistribuição do ônus da prova é possível diante da hipossuficiência técnica do paciente.

            •          A análise é casuística e visa à paridade efetiva no processo.

Como será Cobrado em Prova

???? O CDC se aplica, ainda que diante da prestação de serviços públicos gratuitos como os do SUS.

❌ Errado. A legislação consumerista não incide sobre serviços públicos universais e indivisíveis, como os prestados pelo SUS.

???? Ainda que afastada a aplicação do CDC, pode-se redistribuir o ônus da prova em ação por erro médico no SUS com base na hipossuficiência técnica do paciente.

✅ Correto. O STJ reconhece essa possibilidade para assegurar equilíbrio processual.

Versão Esquematizada

???? Erro Médico no SUS e Ônus da Prova
???? O CDC não se aplica ao SUS. ???? A responsabilidade do Estado é objetiva. ???? A redistribuição do ônus da prova é possível por hipossuficiência técnica. ???? Deve haver verossimilhança da alegação e desvantagem probatória do autor.

Inteiro Teor

          Cinge-se a controvérsia em definir se é aplicável a legislação consumerista aos pedidos indenizatórios decorrentes de erro médico na rede pública de saúde e se é possível a inversão do ônus probatório.

     A regra disposta no art. 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor – CDC reconhece que serviço, para atrair a legislação consumerista, é a atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

     Desse modo, parece evidente que os serviços capazes de atrair a incidência da legislação consumerista são aqueles remunerados, seja essa remuneração direta ou indireta, que, nesta hipótese, configura-se quando o pagamento não é específico e individual, mas coletivo ou quando o consumidor paga por outros meios por um suposto “benefício gratuito”.

     Essa afirmação poderia levar a crer que todos os serviços públicos subordinar-se-iam às normas de proteção do consumidor, já que nenhum deles pode ser considerado efetivamente gratuito, haja vista que todos são colocados à disposição da população a partir de receitas originárias da arrecadação de tributos, todavia, esse entendimento não merece prosperar.

     Mostra-se, assim, imprescindível a distinção entre os serviços públicos passíveis de serem regidos pelo Código de Defesa do Consumidor e aqueles que se subordinam exclusivamente ao direito administrativo, sobretudo porque nem todo fornecedor de serviço público poderá ser submetido aos deveres estabelecidos no art. 22 do CDC.

     Diante dessas considerações, tem-se defendido a incidência da legislação consumerista apenas nas hipóteses em que o usuário do serviço público atue como agente de uma relação de aquisição remunerada do serviço, individualmente e mensurável, ou seja, naqueles serviços uti singuli.

     Consequentemente, afasta-se a aplicação do CDC naqueles casos em que a prestação do serviço público é financiada pelo esforço geral e colocado à disposição de toda a coletividade indistintamente, sem a possibilidade de mensuração ou determinação de graus de sua utilização, sendo conhecidos como serviços uti universi.

     Nesses termos, não há dúvidas de que o serviço público de saúde é oferecido a toda a coletividade e sem a retribuição financeira direta por seus usuários, porquanto seu financiamento advém da arrecadação tributária e não há possibilidade de se mensurar o grau de utilização de cada um, inclusive sendo ele utilizado pela doutrina como um exemplo de serviço público não subordinado às regras consumeristas.

     Dadas tais ponderações, constata-se que o caso em discussão trata exatamente da responsabilidade civil do Estado por danos materiais, morais e estéticos decorrentes de alegado erro médico por parte dos servidores públicos da saúde, mas o acórdão recorrido, aplicando a legislação consumerista, reconheceu a necessidade de inversão do ônus probatório, o que não merece prosperar.

     Destaca-se que o afastamento da legislação consumerista não implica a modificação da natureza da responsabilidade civil do Estado, que continua a responder objetivamente por suas condutas comissivas, tratando-se aqui apenas de afastar a inversão do ônus da prova ope legis.

     Dessa forma, mostra-se imperioso afastar a incidência do CDC à espécie, reconhecendo-se a regência do regime jurídico de direito administrativo.

     Contudo, mesmo que afastada a incidência da legislação consumerista ao caso, ao se constatar a ausência de conhecimentos específicos por parte dos pacientes, sobretudo nos casos em que a situação socioeconômica do paciente é desvantajosa (a exemplo dos atendimentos prestados pelo SUS), pode-se vislumbrar com maior facilidade a sua hipossuficiência técnica capaz de justificar a redistribuição do ônus da prova.

     Destaca-se, todavia, que o simples fato de o serviço de saúde ser prestado pelo SUS não implica, necessariamente, a redistribuição do ônus da prova por hipossuficiência técnica do paciente, devendo ele demonstrar a verossimilhança das alegações aduzidas em juízo, de modo que, a partir de então, o Magistrado possa avaliar se o caso requer a adequação do ônus probatório por constatar que o ente público possua maior facilidade de obtenção de prova do fato contrário ou haja uma dificuldade excessiva na produção da prova por parte do paciente.

     Destarte, na hipótese de existência de vulnerabilidades técnica e informacional, ainda que afastada a incidência do CDC no pedido indenizatório decorrente de erro médico na rede pública de saúde, cabível a redistribuição do ônus probatório.

5.        Fornecimento de Medicamento: Erro na Aplicação da Verba Não Justifica Suspensão ao Menor

Indexador

Disciplina: Direito Administrativo

Área

Magistratura

Ministério Público

Defensoria Pública

Procuradorias

Destaque

A aquisição de medicamento diverso daquele autorizado judicialmente, ainda que com verba pública, não autoriza a suspensão do fornecimento ao menor beneficiário, por se tratar de medida desproporcional e atentatória à dignidade da criança.

Processo em segredo de justiça, Rel. Min. Afrânio Vilela, Segunda Turma, julgado em 18/03/2025.

Conteúdo-Base

???? O art. 5º, XLVII, “e”, da CF veda penas cruéis, inclusive na esfera administrativa.

???? O menor não pode ser responsabilizado por eventual desvio na utilização de verba pública por seus responsáveis legais.

???? A genitora usou os valores para adquirir outro medicamento em favor da mesma criança, após cirurgia, em situação de urgência.

???? A jurisprudência do STJ afirma que o fornecimento de medicamento não pode ser suspenso como forma de compensação ao erário.

???? Mesmo que se considere indevido o uso da verba, a conduta não justifica sanção que atinja diretamente o direito fundamental à saúde do menor.

 

Discussão e Tese

???? O debate girou em torno da validade de decisão que suspendeu judicialmente o fornecimento de medicamento ao menor por ter havido uso da verba pública em remédio diferente, ainda que destinado à mesma criança.

⚖️ Para o STJ:

            •          O menor não responde pelos atos dos responsáveis.

            •          A urgência do tratamento justifica a conduta da genitora.

            •          Suspender o medicamento configura sanção indevida e desumana.

Como será Cobrado em Prova

???? A suspensão do fornecimento de medicamento a menor é medida legítima quando se constata desvio na aplicação da verba por parte dos responsáveis legais.

❌ Errado. O STJ considera desproporcional essa medida, por atingir direito fundamental da criança.

Versão Esquematizada

???? Fornecimento de Medicamento e Responsabilidade por Erro na Verba
???? A criança não pode ser punida por ato do responsável. ???? Suspensão do tratamento é medida desproporcional. ???? O uso da verba em medicamento diverso, mas necessário, não configura má-fé. ???? A proteção à saúde da criança é prioridade constitucional.

Inteiro Teor

     No caso, a genitora de um menor incapaz levantou do Estado valores em dinheiro para aquisição de medicamentos em favor de seu filho e adquiriu outros remédios, em caráter de urgência, destinados à mesma criança, após a cirurgia.

     O Tribunal de origem reconheceu o emprego ilícito da verba pública e, ante a impossibilidade material de devolução do dinheiro, determinou a compensação do erário por meio da suspensão do fornecimento do medicamento por um mês.

     Contudo, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça aponta para a responsabilidade não só subsidiária do incapaz, como pela sua responsabilidade mitigada e condicional.

     Nesse sentido, ele apenas responde por seus atos próprios quando os responsáveis não tiverem, eles próprios, condições de arcar com as despesas ressarcitórias (responsabilidade subsidiária), e quando essa indenização não comprometer seu próprio sustento ou de seus dependentes (responsabilidade condicional e mitigada).

     Dessa forma, o menor incapaz e doente não é responsável nem mesmo pelos ilícitos que ele próprio comete (art. 932, I, do Código Civil – CC/2002), podendo, ainda menos, arcar pessoal e fisicamente pelas ilicitudes eventualmente cometidas por seus responsáveis.

     Ademais, no caso em discussão, nem sequer é inequívoco o caráter ilícito do ato, tendo em conta que a verba foi destinada ao tratamento médico da mesma criança, ainda que em medicamento diverso do originalmente (art. 188, I, do CC/2002).

     Sendo assim, em qualquer situação, a interrupção do fornecimento de medicamento ao doente como meio sancionador é desarrazoada, até mesmo ante a vedação constitucional (e do próprio direito natural) de imposição de penas cruéis (art. 5º, XLVII, e, da Constituição Federal – CF/1988).

6.        Menor Aprendiz: Remuneração Integra a Base de Cálculo da Contribuição Previdenciária

Indexador

Disciplina: Direito Tributário

Capítulo: Contribuições Previdenciárias

Área

Magistratura

Procuradorias

Destaque

A remuneração paga a menor aprendiz integra a base de cálculo da contribuição previdenciária patronal, do RAT e das contribuições destinadas a terceiros, sendo inaplicável a isenção prevista para menores assistidos.

AgInt no AREsp 2.520.394-RS, Rel. Min. Afrânio Vilela, Segunda Turma, julgado em 12/02/2025.

Conteúdo-Base

???? O art. 4º, § 4º, do Decreto-Lei n. 2.318/1986 concede isenção apenas aos gastos com menores assistidos, figura distinta do menor aprendiz.

???? O menor aprendiz formaliza contrato de aprendizagem com vínculo previdenciário, o que atrai a incidência da contribuição patronal.

???? A jurisprudência do STJ adota interpretação restritiva das normas que outorgam isenção tributária, conforme art. 111 do CTN.

???? Não se pode equiparar o menor assistido ao aprendiz, pois este tem contrato especial com direitos e obrigações específicos.

???? A isenção não alcança a remuneração paga no âmbito do contrato de aprendizagem.

Discussão e Tese

???? A controvérsia foi se a remuneração do menor aprendiz poderia ser excluída da base de cálculo das contribuições previdenciárias patronais, por analogia ao benefício legal concedido aos menores assistidos.

⚖️ Para o STJ:

            •          A isenção deve ser interpretada restritivamente.

            •          O menor aprendiz não se confunde com menor assistido.

            •          Os valores pagos no contrato de aprendizagem são tributáveis.

Como será Cobrado em Prova

???? A remuneração paga ao menor aprendiz integra a base de cálculo da contribuição previdenciária patronal e das contribuições a terceiros.

✅ Correto. O STJ reafirmou que a isenção prevista no Decreto-Lei n. 2.318/1986 não se aplica a aprendizes.

???? A isenção concedida a menores assistidos pode ser estendida, por analogia, à remuneração do menor aprendiz com base no princípio da equidade tributária.

❌ Errado. A jurisprudência exige interpretação literal das normas de isenção, nos termos do art. 111 do CTN.

Versão Esquematizada

???? Menor Aprendiz e Contribuição Previdenciária
???? A remuneração é tributável. ???? A isenção aplica-se apenas ao menor assistido. ???? O aprendiz possui vínculo jurídico e previdenciário. ???? Interpretação de isenção deve ser restritiva.

Inteiro Teor

     Cinge-se a controvérsia quanto à possibilidade de aplicação da isenção prevista aos menores assistidos, art. 4º, § 4º, do Decreto-Lei n. 2.318/1986, à figura dos menores aprendizes, de modo que os valores pagos a estes sejam excluídos da base de cálculo da contribuição previdenciária patronal, do RAT e das contribuições a terceiros.

     A isenção prevista no art. 4º, § 4º, do Decreto-Lei n. 2.318/1986, que trata da exclusão dos gastos efetuados pela empresa com os menores ASSISTIDOS da base de cálculo da contribuição previdenciária patronal, não se aplica à remuneração paga no contexto do contrato especial de aprendizagem.

     Segundo o dispositivo legal acima mencionado, o termo “menor assistido” refere-se ao contratado com idade entre 12 (doze) e 18 (dezoito) anos, cuja frequência escolar esteja regular, para prestar serviços à empresa com carga horária de 4 (quatro) horas por dia, sem vínculo com a Previdência Social.

     Por outro lado, o menor aprendiz, definido no art. 428 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, é o jovem de 14 a 24 anos que participa de um programa de formação técnico-profissional. Tal jovem formaliza um contrato especial, que deve ser devidamente anotado na Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS, com uma empresa que se compromete a oferecer a capacitação necessária enquanto recebe os serviços prestados por ele no âmbito dessa formação.

     Como se vê, a figura do menor assistido não se confunde com a do menor aprendiz. Assim, nos termos do art. 111 do CTN, bem como da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que impõe a interpretação literal das normas que outorgam isenção ou exclusão de obrigação tributária, não é possível a extensão do benefício fiscal conferido pelo § 4º do art. 4º do Decreto-Lei n. 2.318/1986 à remuneração paga aos menores aprendizes.

     Ademais, devido à similaridade com a base de cálculo da contribuição previdenciária, o raciocínio acima se aplica igualmente ao RAT e às contribuições destinadas a terceiros (AgInt no REsp n. 1.962.721/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 14/3/2022, DJe de 28/3/2022).

7.        Identificação de Usuário de E-mail Difamatório: Obrigação do Provedor de Conexão

Indexador

Disciplina: Direito Civil

Capítulo: Direito Digital

Área

Magistratura

Destaque

O provedor de conexão deve fornecer dados para identificação de usuário, mesmo na ausência de prévia indicação da porta lógica, pois também é responsável pelo armazenamento dessa informação.

REsp 2.170.872-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 18/03/2025.

Conteúdo-Base

???? A identificação do usuário deve ser viabilizada com base nos dados técnicos disponíveis, ainda que o IP esteja compartilhado entre múltiplos usuários.

???? A obrigação não depende da especificação exata do minuto da conexão.

???? O Marco Civil da Internet (Lei n. 12.965/2014) obriga provedores de conexão a manter registros de data, hora e IP com respectiva porta lógica.

???? A omissão no fornecimento de dados por falta da porta lógica é indevida, quando essa informação também está sob responsabilidade do próprio provedor de conexão.

???? A decisão reforça a proteção contra ilícitos virtuais e a efetividade da responsabilização civil.

Discussão e Tese

???? O caso envolveu pedido para que o provedor de conexão identificasse o autor de e-mail ofensivo, mesmo sem indicação da porta lógica, o que foi inicialmente negado sob argumento de insuficiência técnica.

⚖️ Para o STJ:

            •          O provedor de conexão também deve armazenar a porta lógica.

            •          A ausência de indicação prévia não exime da obrigação legal.

            •          A prestação jurisdicional efetiva exige a colaboração técnica dos provedores.

Como será Cobrado em Prova

???? O provedor de conexão deve fornecer dados para identificação de usuário, ainda que o pedido judicial não indique previamente a porta lógica.

✅ Correto. O STJ entendeu que a obrigação decorre da própria responsabilidade do provedor pelo armazenamento.

???? Os provedores de conexão devem manter registros de data, hora e IP com respectiva porta lógica.

✅ Correto. O Marco Civil da Internet (Lei n. 12.965/2014) obriga provedores de conexão a manter esses dados.

Versão Esquematizada

???? Identificação de Usuário e Porta Lógica
???? Provedor de conexão é responsável pelo armazenamento da porta lógica. ???? Não se exige prévia informação pelo provedor de aplicação. ???? A ausência da porta não exime o dever de identificar o usuário. ???? A medida garante a responsabilização por ilícitos digitais.

Inteiro Teor

     Cinge-se a controvérsia em decidir se o provedor de conexão deve individualizar o usuário diante de identificação do IP, sem a informação de porta lógica.

     Em resumido histórico, já explorado em detalhes pela Terceira Turma do STJ quando do julgamento do REsp 1.777.769 (DJe 8/11/2019), os números IPs da versão 4 (IPv4) são finitos, necessitando de adaptações e novas versões que permitam sua expansão. Atentos ao esgotamento dos números de IP, especialistas propuseram uma nova versão para o protocolo, que é o chamado Protocolo de Internet Versão 6 (IPv6), que permite uma quantidade virtualmente inesgotável de endereços. Enquanto não for finalizada a transição para o IPv6, a univocidade do número IP depende da associação de número adicional, a chamada porta de origem (ou porta lógica).

     Na hipótese, uma empresa ajuizou ação cominatória em face de provedor de conexão, buscando individualizar o usuário que enviou e-mail difamatório para seus clientes e colaboradores. O provedor de conexão em sua defesa argumentou que não seria possível individualizar o remetente, porque a ausência de informação quanto à porta lógica, somada ao intervalo de conexão impreciso (10 minutos), indicam mais de quinhentos usuários do mesmo IP.

     A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que tanto provedores de aplicação quanto provedores de conexão têm a obrigação de guardar e fornecer as informações relacionadas à porta lógica de origem.

     Dessa forma, não há necessidade de prévia informação por parte do provedor de aplicação sobre a porta lógica para que o provedor de conexão disponibilize os demais dados de identificação do usuário, pois também esse segundo agente está obrigado a armazenar e fornecer o IP (e, portanto, a porta lógica).

     Na requisição judicial de disponibilização de registros (art. 10, §1º, Marco Civil da Internet), para identificação de usuário, não há necessidade de especificação do minuto exato de ocorrência do ilícito.

8.        Vacinação Infantil Obrigatória: Recusa Injustificada Autoriza Multa aos Pais

Indexador

Disciplina: Direito Constitucional e Direito da Criança e do Adolescente

Capítulo: Direito à Saúde

Área

Magistratura

Ministério Público

Defensoria Pública

Destaque

A recusa dos pais em vacinar o filho contra a COVID-19, mesmo após advertência dos órgãos competentes, caracteriza infração administrativa e autoriza a aplicação da multa prevista no art. 249 do ECA.

Processo em segredo de justiça, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 18/03/2025.

Conteúdo-Base

???? O art. 14, § 1º, do ECA estabelece a obrigatoriedade da vacinação de crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias.

???? O art. 249 do ECA prevê multa aos pais que descumprirem os deveres inerentes à autoridade parental, como negligência à saúde do filho.

???? A autoridade parental está submetida à função protetiva e deve observar o princípio da paternidade responsável.

???? A vacinação é medida de saúde pública e proteção integral, cuja recusa injustificada representa afronta ao melhor interesse da criança.

???? O STF, no Tema 1103 da repercussão geral, reconheceu a constitucionalidade da vacinação obrigatória nos moldes definidos pela autoridade sanitária.

Discussão e Tese

???? A controvérsia envolveu pais que, mesmo advertidos pelo Conselho Tutelar e Ministério Público, recusaram-se a vacinar o filho contra a COVID-19, sob alegações ideológicas.

⚖️ Para o STJ:

            •          A recusa injustificada configura descumprimento de dever legal.

            •          A vacinação obrigatória visa não apenas proteção individual, mas coletiva.

            •          A sanção pecuniária é legítima e proporcional.

Como será Cobrado em Prova

???? A recusa dos pais em vacinar o filho contra a COVID-19, após advertência dos órgãos de proteção, autoriza a aplicação da multa.

✅ Correto. O STJ considerou válida a sanção prevista no art. 249 do ECA diante do descumprimento do dever legal.

???? A recusa à vacinação configura exercício legítimo da autonomia parental.

❌ Errado. A jurisprudência entende que a negligência à saúde do menor autoriza resposta estatal proporcional.

Versão Esquematizada

???? Vacinação Obrigatória e Dever Parental
???? O ECA prevê vacinação obrigatória em casos recomendados. ???? Recusa injustificada é infração administrativa. ???? A proteção integral da criança se sobrepõe à autonomia dos pais. ???? STF confirmou constitucionalidade da vacinação obrigatória (Tema 1103).

Inteiro Teor

          Cinge-se a controvérsia em decidir se é obrigatória a vacinação de criança e adolescente contra a COVID-19 no território nacional.

     A autoridade parental teve sua significação modificada a partir da Constituição Federal de 1988: o que antes se entendia como um poder de chefia do marido para com seus filhos, a partir da Constituição passou-se a entender como um poder-dever dos pais e das mães de cuidarem e protegerem seus filhos. Encontra suas balizas no princípio da paternidade responsável e na doutrina da proteção integral da criança e do adolescente, posto que, consoante determina o art. 5º do ECA, nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência aos seus direitos fundamentais.

     O exercício da parentalidade enfrenta diversas complexidades, uma vez que a intervenção parental é essencial, especialmente em tenra idade, pois a vulnerabilidade das crianças impede que compreendam o que é melhor para seu saudável desenvolvimento. Essa autonomia, no entanto, não é absoluta: quando a Constituição confia aos pais a tarefa primordial de cuidar dos filhos, não lhes credita permissão para abusos.

     O direito à saúde da criança e do adolescente é albergado pelo ECA, em seu art. 14, §1º, o qual determina a obrigatoriedade da vacinação de crianças quando recomendado por autoridades sanitárias.

     Salvo eventual risco concreto à integridade psicofísica da criança ou adolescente, não lhe sendo recomendável o uso de determinada vacina, a escusa dos pais será considerada negligência parental, passível de sanção estatal, ante a preponderância do melhor interesse sobre sua autonomia.

     O Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do ARE n. 1267879/SP, fixou o Tema n. 1103, estabelecendo como requisitos para a obrigatoriedade de vacinação: a) inclusão no Programa Nacional de Imunizações; ou b) determinação da obrigatoriedade prevista em lei; ou c) determinação da União, Estado, Distrito Federal ou Município, fundada em consenso médico-científico.

     A vacinação infantil não significa, apenas, a proteção individual de crianças e adolescentes, mas representa um pacto coletivo pela saúde de todos, a fim de erradicar doenças ou minimizar suas sequelas, garantindo-se uma infância saudável e protegida.

     Portanto, a vacinação de crianças e adolescentes é obrigatória, pois assim prevê o art. 14, §4º do ECA. A recusa em vacinar criança ou adolescente contra a COVID-19, mesmo advertidos dos riscos de sua conduta pelo Conselho Tutelar Municipal e pelo Ministério Público Estadual, caracteriza o descumprimento dos deveres inerentes à autoridade familiar, autorizando a aplicação da sanção pecuniária prevista no art. 249 do ECA.

9.        Querela Nullitatis: Possibilidade de Alegação como Questão Incidental

Indexador

Disciplina: Direito Processual Civil

Capítulo: Querela Nullitatis

Área

Magistratura

Ministério Público

Destaque

A pretensão de querela nullitatis pode ser formulada incidentalmente em outra ação, como questão prejudicial, sendo desnecessária a propositura de ação declaratória autônoma para reconhecimento de vício transrescisório.

REsp 2.095.463-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 18/03/2025

Conteúdo-Base

???? A querela nullitatis é a via adequada para declarar nulidades absolutas que contaminam decisão transitada em julgado, especialmente nos casos de vício transrescisório, como ausência de citação.

???? O STJ reconhece que o vício insanável pode ser alegado de modo incidental, sem a formalização de ação específica, respeitando os princípios da instrumentalidade das formas, da celeridade e da economia processual.

???? A jurisprudência afasta o formalismo excessivo, permitindo que a nulidade seja suscitada como fundamento prejudicial ao exame de outros pedidos.

???? A nulidade pode ser reconhecida ex officio e não se sujeita à preclusão ou à coisa julgada formal.

???? A pretensão à anulação, nesse contexto, é autônoma do procedimento — o que importa é o reconhecimento do vício, e não a via eleita.

 

Discussão e Tese

???? O debate foi se o reconhecimento de vício transrescisório exige ação autônoma de querela nullitatis ou se pode ser formulado como questão incidental em outra demanda, sem comprometer o interesse de agir.

⚖️ Para o STJ:

            •          A nulidade pode ser arguida incidentalmente.

            •          Não é obrigatória a via autônoma.

            •          A admissibilidade se justifica pelo interesse público na higidez da decisão judicial.

Como será Cobrado em Prova

???? A querela nullitatis não pode ser formulada como questão incidental em ação posterior, quando necessária à análise de outros pedidos.

❌ Errado. O STJ reconheceu que a nulidade absoluta pode ser suscitada fora de ação autônoma, desde que prejudicial ao julgamento.

???? A existência de vício transrescisório em sentença transitada em julgado somente pode ser reconhecida mediante ação declaratória autônoma.

❌ Errado. A jurisprudência permite a formulação incidental, sem perda do interesse de agir.

Versão Esquematizada

???? Querela Nullitatis e Interesse de Agir
???? Nulidade absoluta pode ser alegada em qualquer demanda. ???? Vícios transrescisórios não exigem ação específica. ???? A pretensão pode ser acessória a outro pedido. ???? O STJ privilegia efetividade sobre formalismo.

Inteiro Teor

     A controvérsia consiste em decidir se, para fins de verificação do interesse de agir como condição da ação, a pretensão de querela nullitatis (para declaração de nulidade de sentença transitada em julgado por vício transrescisório) deve ser requerida em ação declaratória específica e autônoma ou se pode ser formulada em demanda em que se apresenta como questão incidental ou prejudicial para o exame de outros pedidos.

     Inicialmente, é válido esclarecer que, após o prazo decadencial de dois anos para ação rescisória (art. 975 do Código de Processo Civil), como regra, forma-se a chamada “coisa julgada soberana”.

     No entanto, conforme leciona a doutrina, “existem nulidades absolutas tão graves, tão ofensivas ao sistema jurídico, que a sua manutenção é algo absolutamente indesejado; surgem os chamados vícios transrescisórios, que apesar de serem situados no plano da validade não se convalidam, podendo ser alegados a qualquer momento, como ocorre com o vício ou inexistência da citação”.

     Nesse contexto, vício transrescisório representa nulidade que, dado seu elevado grau de ofensividade ao sistema jurídico, não pode ser mantida ainda que decorrente de decisão transitada em julgado e após ultrapassado o prazo decadencial da ação rescisória.

     Diante da gravidade dos vícios transrescisórios (como ocorre diante da falta de citação), a ordem jurídica admite o reconhecimento da nulidade da decisão transitada em julgado a qualquer momento, por meio da chamada querela nullitatis insanabilis (reclamação de nulidade incurável), ou apenas querela nullitatis.

     A pretensão da querela nullitatis, no âmbito da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, tem recebido tratamento direcionado à promoção do princípio da instrumentalidade das formas, de modo a garantir celeridade, economia e efetividade processual (artigos 3º, 4º, 6º e 8º do CPC). Em decorrência disso, o STJ tem admitido a invocação da nulidade de decisões transitadas em julgado eivadas de vícios transrescisórios sem a exigência de propositura de uma ação específica.

     É dizer que a querela nullitatis, ou reclamação de nulidade, para o reconhecimento de vício transrescisório, tem sido visualizada, pelo STJ, como pretensão e não como procedimento. Com isso, afasta-se o excesso de formalismo, para admitir o reconhecimento da nulidade de decisões maculadas por defeitos transrescisórios por meio de diferentes formas de tutela jurisdicional.

     Ademais, segundo o STJ, a decisão maculada por tal tipo de vício “jamais transita em julgado, constituindo a ação anulatória (querella nullitatis) a via mais comumente utilizada para o reconhecimento dessa nulidade, não obstante seja possível a provocação do juízo por diversos outros meios”.

     Outro relevante exemplo que se extrai da jurisprudência do STJ é a possibilidade de que a pretensão da querela nullitatis seja julgada por meio de ação rescisória ajuizada após o prazo decadencial. Em tais casos, a demanda não deve ser extinta, por falta de interesse de agir e inadequação da via eleita, mas deve ser remetida pelo Tribunal de ofício ao primeiro grau, para apreciada como ação declaratória de nulidade.

     Portanto, a pretensão da querela nullitatis, a depender das circunstâncias de cada hipótese, pode estar inserida em questão prejudicial ou principal da demanda, bem como pode ser arguida através de diferentes meios processuais (como ações declaratórias em geral, alegação incidental em peças defensivas, cumprimento de sentença, ação civil pública e mandado de segurança).

10.         Saldo de Alienação Fiduciária: Cabimento de Ação Monitória para Cobrança do Resíduo

Indexador

Disciplina: Direito Civil e Direito Processual Civil

Capítulo: Alienação Fiduciária

Área

Magistratura

Destaque

É necessária a intimação pessoal do devedor acerca da realização do leilão extrajudicial de bem alienado fiduciariamente, sob pena de invalidade da cobrança do saldo remanescente por ação monitória.

AgInt no REsp 2.076.261-AP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 11/3/2025.

Conteúdo-Base

???? O art. 2º do Decreto-Lei n. 911/1969 exige a intimação pessoal do devedor para o leilão extrajudicial em contratos de alienação fiduciária.

???? O STJ tem jurisprudência consolidada no sentido de que a ausência de intimação pessoal invalida a pretensão de cobrança do saldo remanescente após a venda do bem.

???? A notificação deve possibilitar ao devedor acompanhar o procedimento e, se for o caso, saldar a dívida antes da consolidação da propriedade.

???? A exigência de intimação pessoal é medida de garantia do contraditório e da boa-fé objetiva na execução extrajudicial.

???? A cobrança do saldo remanescente sem esse requisito caracteriza enriquecimento sem causa e ofensa ao devido processo legal.

Discussão e Tese

???? A questão envolveu ação monitória ajuizada por instituição financeira visando à cobrança de saldo remanescente após venda extrajudicial de veículo, sem prova de intimação pessoal prévia do devedor.

⚖️ Para o STJ:

            •          A intimação pessoal é condição de validade do procedimento.

            •          Sua ausência impede a cobrança do saldo por qualquer via judicial.

            •          A proteção ao consumidor exige respeito estrito aos requisitos legais da alienação fiduciária.

Como será Cobrado em Prova

???? A ausência de intimação pessoal do devedor sobre o leilão do bem alienado fiduciariamente impede a cobrança judicial do saldo remanescente.

✅ Correto. O STJ firmou que a cobrança é inválida sem essa formalidade essencial.

???? A notificação feita ao endereço do contrato, ainda que após o leilão, supre a exigência legal e autoriza a cobrança do saldo devedor.

❌ Errado. A jurisprudência exige intimação pessoal prévia, e sua ausência invalida o procedimento.

Versão Esquematizada

???? Alienação Fiduciária e Cobrança do Saldo Remanescente
???? Exige-se intimação pessoal prévia ao leilão. ???? Ausência da notificação invalida a cobrança. ???? Ação monitória não pode ser usada sem essa formalidade. ???? Protege o direito de informação e defesa do devedor.

Inteiro Teor

     Trata-se, na origem, de ação monitória ajuizada para cobrança de saldo remanescente decorrente da venda de veículo alienado fiduciariamente.

     A sentença acolheu a preliminar de carência de ação e extinguiu o processo sem resolução por entender que a notificação extrajudicial cientificando da venda e da existência de débito foi encaminhada ao endereço da parte quase 1 ano após a venda do bem. O Tribunal de origem, por sua vez, manteve a sentença, sob o fundamento de que “não houve comunicação prévia ao devedor, requisito necessário para a continuidade do feito”.

     Nesse contexto, o entendimento adotado nas instâncias de origem está em harmonia com a jurisprudência do STJ sobre o dever de comunicação prévia ao devedor em tal circunstância (AgInt nos EDcl no REsp 1.931.921/SP, Relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 22/11/2021, DJe 25/11/2021).

     Na aplicação do art. 2º do Decreto 911/1996, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça se encontra consolidada no sentido da necessidade de intimação pessoal do devedor acerca da data da realização do leilão extrajudicial, de modo a proporcionar-lhe a defesa de seus interesses, especialmente ante a possibilidade de o credor vir a lhe cobrar eventual saldo remanescente posteriormente (AgInt no REsp 1.800.044/PR, Relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 11/6/2019, DJe 14/6/2019).

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Fonte: Estratégia Concursos

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