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1. Taxa de juros moratórios nas dívidas civis: aplicação da SELIC
Destaque
O art. 406 do Código Civil de 2002, antes da entrada em vigor da Lei 14.905/2024, deve ser interpretado no sentido de que a taxa SELIC é a taxa de juros de mora aplicável às dívidas de natureza civil, por ser a mesma taxa em vigor para a atualização monetária e a mora no pagamento de tributos devidos à Fazenda Nacional.
REsp 2.199.164-PR e REsp 2.070.882-RS (Tema 1368/STJ), Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Corte Especial, por unanimidade, julgados em 15/10/2025.
Conteúdo-Base
???? CC, arts. 404 e 406; CTN, art. 161 §1º; Leis 8.981/1995, 9.065/1995, 9.250/1995, 9.393/1996, 10.522/2002; EC 113/2021.
???? O art. 406 do CC vincula os juros civis à taxa aplicável aos tributos federais, ou seja, à SELIC.
???? A taxa SELIC incorpora juros moratórios e correção monetária, evitando cumulação de índices.
???? A uniformização visa garantir previsibilidade e estabilidade macroeconômica.
???? A função dos juros civis é compensatória, não punitiva.
Discussão e Tese
???? A Corte Especial consolidou a jurisprudência das Seções de Direito Público e Privado sobre o alcance do art. 406 do Código Civil.
Tese do Tema 1368/STJ: “Antes da entrada em vigor da Lei 14.905/2024, o art. 406 do Código Civil deve ser interpretado no sentido de que a taxa de juros de mora aplicável às dívidas civis é a SELIC, por ser a taxa vigente para atualização monetária e mora de tributos federais.”
Como será Cobrado em Prova
???? A taxa de juros civis de mora, antes da Lei 14.905/2024, é de 1% ao mês, nos termos do art. 161 §1º do CTN.
Errado. A Corte Especial fixou a SELIC como taxa aplicável.
???? A SELIC é a taxa legal de juros moratórios nas dívidas civis, conforme interpretação do art. 406 do CC.
Correto. Essa foi a tese fixada no Tema 1368/STJ.
Versão Esquematizada
| ???? Juros moratórios civis – SELIC |
| ???? CC, art. 406 ???? CTN, art. 161 §1º ???? SELIC = juros + correção monetária ???? Tema 1368/STJ |
Inteiro Teor
A questão em discussão consiste em saber se a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia (SELIC) deve ser considerada para a fixação dos juros moratórios a que se referia o art. 406 do Código Civil antes da entrada em vigor da Lei n. 14.905/2024.
De início, ressalta-se que a taxa SELIC é a única taxa atualmente em vigor para a mora no pagamento de impostos federais, conforme previsto em diversas legislações tributárias (Leis n. 8.981/1995, 9.065/1995, 9.250/9195, 9.393/1996, 10.522/2002, Decreto 7.212/2010, entre outras), possuindo também status constitucional a partir da Emenda Constitucional n. 113.
Ainda destaca-se que o art. 161, § 1º, do CTN prevê a taxa de 1% ao mês apenas de forma subsidiária, ou seja, quando não houver disposição legal diversa. E como há leis específicas que determinam a aplicação da SELIC para os impostos federais, o dispositivo do CTN não se aplica ao caso.
Dessa forma, não há falar em função punitiva dos juros moratórios, eis que para isso existem as previsões contratuais de multa moratória, sendo a sua função apenas a de compensar o deságio do credor. Segundo o art. 404 do Código Civil, se os juros não cobrem o prejuízo, o juiz pode inclusive conceder indenização suplementar.
Nesse sentido, fixar juros civis de mora diferentes do parâmetro nacional viola o art. 406 do CC e causa impacto macroeconômico. A lei prevê que os juros moratórios civis sigam a mesma taxa aplicada à mora de impostos federais, garantindo harmonia entre obrigações públicas e privadas. Como esses índices oficiais são ajustados conforme a macroeconomia, o valor aplicado nas relações privadas não deve superar o nível básico definido para toda a economia.
Consigna-se, ademais, que nos Temas 99, 112 e 113 fixados em recursos especiais repetitivos, a Primeira Seção desta Corte definiu as teses no sentido de ser a SELIC a taxa legal referenciada na redação original do art. 406 do Código Civil. A jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal reconhece a validade da SELIC como índice de correção monetária e juros moratórios, aplicável às condenações cíveis em geral.
Ressalta-se, por fim, que, a SELIC, por englobar juros de mora e correção monetária, evita a cumulação de índices distintos, garantindo maior previsibilidade e alinhamento com o sistema econômico nacional.
2. IRPF e pagamento de multa de colaboração premiada por terceiro
Destaque
A quitação, por terceiro, de multa assumida por pessoa física em acordo de colaboração premiada configura acréscimo patrimonial indireto, caracterizando fato gerador do Imposto sobre a Renda das Pessoas Físicas (IRPF).
Processo em segredo de justiça, Rel. Min. Regina Helena Costa, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 7/10/2025.
Conteúdo-Base
???? CTN, art. 43; Lei 9.430/1996, art. 70.
???? A liberação de obrigação pessoal por terceiro representa disponibilidade de renda.
???? A multa de colaboração premiada tem natureza personalíssima.
???? A quitação voluntária por ex-empregadora constitui liberalidade sujeita à tributação.
???? O fato gerador do IRPF ocorre com o acréscimo patrimonial, ainda que indireto.
Discussão e Tese
???? O STJ confirmou que a assunção voluntária de dívida pessoal por terceiro gera acréscimo patrimonial tributável.
A Primeira Turma entendeu que, por não haver obrigação legal da empresa, o pagamento configurou benefício econômico ao colaborador, incidindo IRPF.
Como será Cobrado em Prova
???? O pagamento de multa de colaboração premiada por terceiro não configura fato gerador do IRPF, por não haver transferência direta de renda.
Errado. A liberação de despesa pessoal é acréscimo patrimonial indireto.
Versão Esquematizada
| ???? IRPF – colaboração premiada |
| ???? CTN, art. 43 ???? Lei 9.430/1996, art. 70 ???? Acréscimo patrimonial indireto ???? Incidência do imposto reconhecida |
Inteiro Teor
A controvérsia tem origem em Mandado de Segurança impetrado buscando-se afastar a incidência do Imposto sobre a Renda das Pessoas Físicas (IRPF), relativamente a acréscimo patrimonial experimentado diante da quitação, por sua ex-empregadora, empresa construtora, de multa assumida pelo impetrante em acordo de colaboração premiada.
Em primeira instância, a segurança foi denegada, decisão mantida pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região, sob o fundamento de que o pagamento de obrigação pecuniária firmada em acordo de colaboração premiada é dever exclusivo do colaborador, razão pela qual eventual assunção de ônus financeiro por terceiro, sobretudo a ex-empregadora, encerra mera liberalidade em decorrência de rescisão de contrato de trabalho, configurando, assim, acréscimo patrimonial sujeito ao Imposto sobre a Renda das Pessoas Físicas.
Com efeito, como consignado pelo tribunal de origem, a ex-empregadora disponibilizou o montante para pagamento da multa, tendo o depósito em conta judicial sido efetuado em seu próprio nome.
Ainda que a construtora tenha quitado diretamente o valor da penalidade assumida pelo recorrente em acordo de colaboração premiada e sem trânsito de valores nas contas da pessoa física, tal circunstância não é apta, por si só, a afastar a perfectibilização do aspecto material da hipótese de incidência do imposto em tela, porquanto a liberação de obrigação passiva do contribuinte por terceiros denota disponibilidade de renda mediante acréscimo patrimonial indireto, configurando, assim, o fato gerador descrito no art. 43 do Código Tributário Nacional.
No caso, a multa possui natureza jurídica de sanção, assumida pela parte em seu próprio nome, em caráter personalíssimo, a qual deve ser suportada pelo seu próprio patrimônio.
Assim, ausente dever legal ou decorrente de negócio jurídico de natureza pública impondo à empresa o ônus financeiro de adimplir com a sanção assumida pelo impetrante no acordo de colaboração premiada – o qual, reitere-se, detém natureza personalíssima -, impende reconhecer-se ter sido o valor espontaneamente creditado.
Dessa maneira, tendo o tribunal a quo firmado a premissa fática de que a companhia “[…] conferiu ao seu ex-empregado/impetrante verba por mera liberalidade, em decorrência da rescisão do contrato de trabalho”, de rigor a aplicação do art. 70 da Lei n. 9.430/1996, segundo o qual “[…] a multa ou qualquer outra vantagem paga ou creditada por pessoa jurídica, ainda que a título de indenização, a beneficiária pessoa física ou jurídica, inclusive isenta, em virtude de rescisão de contrato, sujeitam-se à incidência do imposto de renda”.
3. Execução fiscal e legitimidade passiva do consórcio de empresas
Destaque
O consórcio de empresas, embora desprovido de personalidade jurídica, possui personalidade judiciária e pode figurar no polo passivo de execução fiscal, desde que tenha realizado o fato gerador da obrigação tributária.
REsp 1.647.368-PE, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 7/10/2025.
Conteúdo-Base
???? CTN, art. 126 III; CC, arts. 45 e 985; CPC, art. 75 IX; Lei 6.404/1976, art. 278; Lei 12.402/2011, art. 1º §1º.
???? O consórcio é unidade econômica com capacidade tributária passiva.
???? A ausência de personalidade jurídica não afasta sua legitimidade processual.
???? A responsabilidade das consorciadas é solidária apenas nas condições contratuais.
???? O consórcio pode ser demandado por tributos devidos em seu nome.
Discussão e Tese
???? O STJ reconheceu que o consórcio, ainda que sem personalidade jurídica, possui legitimidade para responder em execução fiscal.
A Segunda Turma reafirmou que basta a configuração de unidade econômica para legitimar a cobrança, conforme o art. 126 III do CTN.
Como será Cobrado em Prova
???? O consórcio pode figurar no polo passivo da execução fiscal, desde que tenha praticado o fato gerador tributário.
Correto. O STJ reconheceu a personalidade judiciária do consórcio e capacidade tributária passiva.
Versão Esquematizada
| ???? Execução fiscal – consórcio de empresas |
| ???? CTN, art. 126 III ???? Lei 6.404/1976, art. 278 ???? Personalidade judiciária reconhecida ???? Responsabilidade conforme contrato |
Inteiro Teor
A questão em discussão consiste em saber se o consórcio de empresas, constituído nos termos da Lei n. 6.404/1976, possui legitimidade para integrar o polo passivo da execução fiscal, mesmo sem personalidade jurídica.
Assenta o art. 278, caput, da Lei n. 6.404/1976 que “as companhias e quaisquer outras sociedades, sob o mesmo controle ou não, podem constituir consórcio para executar determinado empreendimento, observado o disposto neste Capítulo”. No respectivo § 1º, especifica-se que “o consórcio não tem personalidade jurídica e as consorciadas somente se obrigam nas condições previstas no respectivo contrato, respondendo cada uma por suas obrigações, sem presunção de solidariedade”.
A despeito da ausência de personalidade jurídica do consórcio de empresas, tal circunstância não o impede que figure como sujeito passivo da obrigação tributária, visto que, nos termos do art. 126, III, do Código Tributário Nacional – CTN, “a capacidade tributária passiva independe […] de estar a pessoa jurídica regularmente constituída, bastando que configure uma unidade econômica ou profissional“.
Em relação a esse dispositivo legal, convém destacar que a regular constituição da pessoa jurídica dá-se, segundo a inteligência dos arts. 45 e 985 do Código Civil, a partir do registro do seu ato constitutivo (contrato social ou estatuto social) no registro competente (registro público de empresas mercantis – juntas comerciais – ou registro civil de pessoas jurídicas), o que marca o início da existência legal da pessoa jurídica de direito privado.
Através de uma leitura mais detida do art. 126 do CTN, infere-se, conforme entendimento doutrinário, que quem realiza o fato gerador está obrigado ao pagamento do tributo, ainda que não tenha ou não esteja no gozo de capacidade civil plena ou que esteja atuando mediante sociedade irregular ou de fato.
Logo, sendo o fato gerador praticado pelo consórcio de empresas, daí exsurge a sua responsabilidade pelo adimplemento da obrigação tributária, sendo irrelevante, para esse fim, a existência ou não de personalidade jurídica. Afinal, o consórcio consubstancia inequívoca unidade econômica, ensejadora da capacidade tributária passiva, como preceitua o inciso III do art. 126 do CTN.
Essa acepção de direito material converge com o tratamento jurídico dado pela norma adjetiva. O Código de Processo Civil de 2015 preconiza, em seu art. 75, IX, que serão representados em juízo, ativa e passivamente, a sociedade e a associação irregulares e outros entes organizados sem personalidade jurídica, pela pessoa a quem couber a administração de seus bens.
Além disso, a Lei n. 6.830/1980 – que regulamenta e execução fiscal de crédito tributário e não tributário – estabelece em seu art. 4º, III e IV, que a execução fiscal poderá ser promovida contra o espólio e a massa, que são espécies de entes despersonalizados, tal como o referido consórcio.
Por conseguinte, em interpretação sistemática do ordenamento jurídico pátrio, depreende-se que consórcio de empresas instituído com amparo na Lei n. 6.404/1976, embora não detenha personalidade jurídica, possui personalidade judiciária, podendo ser demandado – notadamente em execução fiscal – pelas obrigações tributárias a que deu causa.
Tal acepção é corroborada pelo art. 1º, § 1º, da Lei n. 12.402/2011, segundo o qual “o consórcio que realizar a contratação, em nome próprio, de pessoas jurídicas e físicas, com ou sem vínculo empregatício, poderá efetuar a retenção de tributos e o cumprimento das respectivas obrigações acessórias, ficando as empresas consorciadas solidariamente responsáveis”.
4. Penhora de bem indivisível e direito de preferência do coproprietário não executado
Destaque
Na penhora de bem indivisível, a quota-parte do coproprietário alheio à execução, que exerce o direito de preferência na arrematação, deve ser calculada com base no valor de avaliação do bem, e não sobre o valor de arremate.
REsp 2.180.611-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 16/9/2025, DJEN 19/9/2025.
Conteúdo-Base
???? CPC, art. 843 §§1º e 2º.
???? O exercício do direito de preferência visa a assegurar igualdade entre o coproprietário e terceiros interessados.
???? O cálculo sobre o valor de avaliação preserva o patrimônio do coproprietário alheio à execução.
???? A base de cálculo sobre o valor de arremate reduziria indevidamente o valor de sua quota-parte.
Discussão e Tese
???? O STJ analisou a extensão do direito de preferência e da proteção ao coproprietário não executado.
O Tribunal concluiu que o art. 843 do CPC garante o direito de preferência com base no valor de avaliação, para impedir perda patrimonial indevida.
Como será Cobrado em Prova
???? A quota-parte do coproprietário alheio à execução deve ser calculada sobre o valor de arremate.
Errado. O valor de avaliação do bem é a base para o cálculo da quota-parte do coproprietário que exerce a preferência.
Versão Esquematizada
| ???? Penhora – bem indivisível |
| ???? CPC, art. 843 §§1º-2º ???? Direito de preferência ???? Base de cálculo: valor de avaliação |
Inteiro Teor
Segundo o art. 843, caput e § 2º, do CPC, em se tratando de penhora de bem indivisível, a quota-parte do coproprietário ou do cônjuge alheio à execução recairá sobre o valor de avaliação do bem, como forma de preservar seu patrimônio.
O exercício do direito de preferência, conferido pelo § 1º do art. 843, visa a garantir ao coproprietário a possibilidade de aquisição integral do bem, em igualdade de condições com terceiros, sem prejuízo de assegurar-lhe o recebimento de sua quota-parte na integralidade, calculada sobre o valor de avaliação.
A proteção legal ao coproprietário não executado impede que sua quota-parte seja apurada sobre valor inferior ao da avaliação, mesmo no exercício de seu direito de preferência.
Com isso, o direito assegurado ao coproprietário não executado de receber sua quota-parte pelo valor de avaliação, subsiste ao exercício do direito de preferência da arrematação do bem leiloado. Pois do contrário, não estaria sendo garantida a igualdade de condições do coproprietário alheio à execução, uma vez que, ao recalcular sua quota-parte em relação ao valor de arremate, delapidaria seu patrimônio, o qual em nada é responsável pela dívida do coproprietário executado. Ensejando em prejuízo ao coproprietário alheio à execução quando este optasse pela preferência na arrematação.
Assim, em caso de arrematação inferior ao valor da avaliação, e preferindo o coproprietário alheio à execução pela preferência na arrematação, a igualdade de condições será efetivada ao complementar a diferença entre a sua quota-parte avaliada e o valor da arrematação.
5. Leilão extrajudicial e nulidade por descrição desatualizada do imóvel
Destaque
O edital de leilão extrajudicial deve conter a descrição atualizada do imóvel, sob pena de nulidade da arrematação, especialmente quando o bem tiver sofrido valorização relevante decorrente de obras ou benfeitorias.
REsp 2.167.979-PB, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 9/9/2025, DJEN 17/9/2025.
Conteúdo-Base
???? CPC, art. 886 I; Lei 9.514/1997.
???? A descrição do bem deve refletir a situação fática e registral atual.
???? A falta de atualização pode causar preço vil e enriquecimento sem causa do arrematante.
???? A nulidade protege o devedor e garante a efetividade da execução.
Discussão e Tese
???? O STJ definiu que o edital de leilão deve conter a descrição atualizada do bem, considerando as modificações ocorridas desde a constituição da garantia fiduciária.
O Tribunal concluiu que a omissão viola o princípio da menor onerosidade ao devedor e acarreta nulidade da arrematação.
Como será Cobrado em Prova
???? A ausência de descrição atualizada do imóvel no edital enseja nulidade da arrematação.
Correto. Esse foi o entendimento aplicado.
Versão Esquematizada
| ???? Leilão extrajudicial – descrição do imóvel |
| ???? CPC, art. 886 I ???? Atualização obrigatória ???? Preço vil → nulidade da arrematação |
Inteiro Teor
A controvérsia consiste em decidir se a descrição do imóvel constante no edital de leilão extrajudicial é independente da descrição no contrato que constituiu a propriedade fiduciária e qual a consequência jurídica da mudança de descrição do imóvel.
Nos termos do art. 886, I do Código de Processo Civil, “o leilão será precedido de publicação de edital, que conterá: […] a descrição do bem penhorado, com suas características, e, tratando-se de imóvel, sua situação e suas divisas, com remissão à matrícula e aos registros”.
Diante disso, a descrição do inciso I do art. 886 ocorrerá no edital de leilão extrajudicial em conformidade com a avaliação atualizada do bem. Isso deve acontecer em razão de o artigo determinar a descrição do imóvel para que se possa alcançar a finalidade do leilão, qual seja, atribuir liquidez ao bem dado em garantia e assim satisfazer a dívida.
Portanto, o contrato de mútuo, o registro do contrato para constituição da propriedade fiduciária, o registro da penhora e o edital de leilão são atos independentes realizados em suas próprias circunstâncias, e cada um deverá conter a descrição atualizada do imóvel, conforme a realidade à época de sua formalização, devendo-se, a cada ato registral, proceder à atualização do livro de registros com a atual descrição do imóvel.
Na hipótese em tela é perceptível o prejuízo, na medida em que o imóvel do devedor foi arrematado na importância de 23% do valor avaliado, em função do erro na descrição do imóvel no edital, o qual não apresentava a completa dimensão do imóvel, tendo em vista que estava sendo descrito apenas como um terreno.
Nesse sentido, o erro na descrição do imóvel faz com que ele seja vendido por preço vil, considerando a dimensão real, sendo, portanto, inválida a alienação judicial.
Com efeito, caso ocorra uma valorização expressiva do imóvel em função de uma obra ou benfeitoria significativa, é necessário que a descrição do bem no edital acompanhe a situação fática atual, em prol da efetividade da execução e da menor onerosidade ao devedor. Pois, de outro modo, proceder com leilão constando uma descrição incorreta do bem ou uma avaliação desatualizada, poderá implicar no desinteresse dos possíveis arrematantes ou no enriquecimento sem causa do arrematante e em excessiva onerosidade para o devedor.
Destarte, o edital do leilão deve conter avaliação adequada e descrição atualizada do imóvel, para assim auferir o maior valor possível no leilão e, dessa forma, satisfazer o crédito, bem como proteger o patrimônio do executado, de modo que este não seja onerado excessivamente. Portanto, na hipótese de ser arrematado o imóvel a preço vil, deve ser declarada a nulidade da arrematação nas execuções extrajudiciais de imóveis alienados fiduciariamente.
6. Impugnação ao valor da causa em contrarrazões à apelação
Destaque
A impugnação ao valor da causa pode ser apresentada em contrarrazões à apelação quando a parte não teve oportunidade de fazê-lo em primeira instância, não havendo preclusão.
REsp 2.113.605-CE, Rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 16/9/2025, DJEN 22/9/2025
Conteúdo-Base
???? CPC, arts. 292 §3º e 293.
???? O valor da causa é matéria de ordem pública e pode ser revisto de ofício.
???? A ausência de oportunidade anterior impede a preclusão.
???? A impugnação pode ocorrer em contrarrazões, dispensando recurso adesivo.
Discussão e Tese
???? O STJ reafirmou que a parte só está sujeita à preclusão se tiver tido oportunidade anterior de impugnar o valor da causa.
O Tribunal reconheceu a possibilidade de impugnação em sede recursal, quando o réu foi chamado ao processo apenas após sentença.
Como será Cobrado em Prova
???? A impugnação ao valor da causa deve ser feita em contestação, sob pena de preclusão.
Errado. É possível a impugnação posteriormente, inclusive em contrarrazões, quando não houve oportunidade anterior.
???? O valor da causa pode ser questionado em qualquer grau de jurisdição se a parte não teve chance de fazê-lo antes.
Correto. Esse foi o entendimento aplicado no REsp 2.113.605-CE.
Versão Esquematizada
| ???? Impugnação ao valor da causa |
| ???? CPC, arts. 292 §3º e 293 ???? Valor da causa → matéria de ordem pública ???? Impugnação possível em contrarrazões |
Inteiro Teor
A controvérsia reside em saber se houve a preclusão ao direito de impugnar o valor atribuído à causa, na situação em que a pretensão autoral de declaração de nulidade de testamento público foi extinta, com resolução do mérito, em virtude de decadência e a parte contrária somente foi intimada para figurar no feito em grau recursal (contrarrazões da apelação), ocasião em que se insurgiu contra o valor da causa e se a parte demandada estaria obrigada a interpor recurso de apelação adesivo para tal mister.
Pela leitura do art. 292, § 3º c/c o art. 293 do CPC, ocorre a preclusão quando juiz, embora possa alterar ou corrigir de ofício do valor da causa, não o faz durante o curso do processo, e o réu não impugna tal questão em preliminar de contestação, o que não é a hipótese.
Ora, se nos termos da jurisprudência, se mostra preclusa a discussão sobre tema que não foi impugnado no primeiro momento em que a parte podia sobre ele falar nos autos e configura-se a preclusão quando a parte não providencia aquilo que lhe é devido na primeira oportunidade de manifestação nos autos, o inverso também é verdadeiro.
No mais, na linha da jurisprudência do STJ, o valor da causa é matéria de ordem pública, sendo possível seu exame até de ofício, não podendo ser reconhecida a preclusão quando a parte não teve a oportunidade de impugná-la em primeiro grau de jurisdição. Assim, é viável que o incidente seja manejado em contrarrazões a apelação.
Diante desse contexto, em que chamada aos autos somente por ocasião da interposição de recurso de apelação, nenhuma outra forma de impugnação ao valor da causa seria possível, senão por meio das contrarrazões ao recurso de apelação, tal como realizado. Poiso recurso adesivo previsto no art. 997 e parágrafos do CPC pressupõe, além da existência de sucumbência recíproca, uma conformação inicial da parte, no caso, a recorrente, com a sentença, ainda que tácita, circunstâncias que não se mostraram presentes na hipótese.
7. Operação Barter e exclusão do crédito da recuperação judicial
Destaque
O crédito decorrente de cédula de produto rural representativa de operação Barter não se submete aos efeitos da recuperação judicial, mesmo quando convertida a execução para entrega de coisa em execução por quantia certa.
REsp 2.178.558-MT, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 9/9/2025, DJEN 15/9/2025.
Conteúdo-Base
???? Lei 8.929/1995; Lei 14.112/2020.
???? A CPR de liquidação física representativa de operação Barter é crédito extraconcursal.
???? A conversão da execução em quantia certa não altera a natureza da obrigação.
???? A exclusão visa preservar o equilíbrio contratual e a segurança jurídica do agronegócio.
Discussão e Tese
???? O STJ analisou a natureza dos créditos de CPR física no contexto da recuperação judicial do produtor rural.
O Tribunal entendeu que o crédito extraconcursal permanece excluído, mesmo após conversão da obrigação em dinheiro.
Como será Cobrado em Prova
???? A conversão da execução de CPR física em execução por quantia certa sujeita o crédito à recuperação judicial.
Errado. O crédito de operação Barter é excluído da recuperação judicial, ainda que convertido em dinheiro.
Versão Esquematizada
| ???? Recuperação judicial – operação Barter |
| ???? Lei 14.112/2020 ???? CPR física = crédito extraconcursal ???? Conversão → não altera natureza |
Inteiro Teor
A controvérsia cinge-se em definir se o pedido de conversão da execução aparelhada com cédula de crédito rural para execução por quantia certa implica a renúncia da garantia (penhor agrícola), acarretando a submissão do crédito aos efeitos da recuperação judicial.
A operação Barter é o negócio jurídico em que o credor fornece insumos para viabilizar a atividade agrícola e recebe como pagamento o produto agrícola. A cédula de produto rural (CPR) é o instrumento representativo desse negócio. Trata-se de um título de crédito à ordem, líquido e certo, representativo de promessa de entrega futura de produtos rurais instituída pela Lei n. 8.929/1965, cuja emissão é exclusiva dos produtores rurais, suas associações e cooperativas. Assim, tanto nas CPRs de liquidação física como nas representativas de operação Barter o pagamento é feito com produtos agrícolas.
Por seu turno, a Lei n. 14.112/2020 buscou regulamentar a recuperação judicial do produtor rural. Nesse contexto, o legislador expressamente excluiu o crédito representado na Cédula de Produto Rural Física e as garantias a ela vinculadas, com antecipação total ou parcial do preço, assim como as que resultem de permuta (operação Barter) dos efeitos da recuperação judicial do produtor rural. Nessas hipóteses, requerida a recuperação judicial pelo devedor, o credor estará excluído da recuperação judicial, salvo se o cumprimento do contrato estiver obstado por motivo de caso fortuito ou força maior.
No caso das CPRs representativas de permuta (Barter), o que se verifica é que o inadimplemento significa no mais das vezes a não existência do produto que deveria ser entregue ao credor. Trata-se do perecimento não somente da garantia (no caso de penhor dos grãos), como também do próprio objeto do contrato. Em outras palavras, a obrigação de entrega dos grãos da safra contratada não tem mais como ser cumprida, não tendo o credor outra opção senão o recebimento do valor em dinheiro.
| Nessa circunstância, a alegação no sentido de que o pedido de conversão da execução implicaria a renúncia à garantia e, em razão disso, a submissão do crédito aos efeitos da recuperação judicial, seria deixar ao alvedrio exclusivo do devedor a submissão ou não do crédito aos efeitos da recuperação judicial, bastando, para tanto, dar outra destinação aos grãos, impossibilitando o adimplemento. |
Assim, o pedido de conversão da ação executiva em execução por quantia certa em razão de o devedor não ter entregue os grãos não parece ser suficiente para transmudar a natureza do crédito, tratado pelo legislador como extraconcursal.
Nesse sentido, o crédito decorrente de CPR representativa de operação Barter não se submete aos efeitos da recuperação judicial mesmo quando há conversão da execução para entrega de coisa incerta em execução por quantia certa.
8. Princípio da saisine e supressio nas relações de administração de imóveis
Destaque
Os herdeiros não podem exigir a restituição retroativa dos frutos obtidos pelo ascendente que exerceu, por longo período e com aquiescência dos proprietários, a administração dos imóveis, pois a situação consolidada é transmitida integralmente pela sucessão, em observância ao princípio da saisine e à boa-fé objetiva.
REsp 2.214.957-PR, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 7/10/2025, DJEN 15/10/2025
Conteúdo-Base
???? CC, arts. 1.784, 421, 422 e 884.
???? O princípio da saisine assegura a imediata transmissão do patrimônio e da situação jurídica do falecido aos herdeiros.
???? A supressio impede o exercício tardio de direito que, pela inércia qualificada do titular, gerou expectativa legítima em terceiros.
???? A surrectio protege o surgimento dessa expectativa legítima e reforça a estabilidade das relações jurídicas.
???? As limitações jurídicas criadas pela conduta do de cujus integram o patrimônio transmitido.
Discussão e Tese
???? O STJ decidiu que, se o ascendente administrava imóveis e percebia frutos com a anuência dos coproprietários por longo tempo, a boa-fé consolidada se transmite aos herdeiros.
O Tribunal considerou que a situação fática consolidada pelo comportamento do falecido integra o acervo sucessório, impedindo a pretensão retroativa de restituição de aluguéis.
Como será Cobrado em Prova
???? A administração de imóveis com aquiescência dos proprietários e por longo período gera situação jurídica protegida pela boa-fé objetiva.
Correto. Os herdeiros não podem exigir retroativamente os frutos percebidos pelo ascendente que administrava imóveis com anuência dos coproprietários por longo tempo, aplicando-se os princípios da supressio e surrectio + saisine.
Versão Esquematizada
| ???? Saisine – supressio e surrectio |
| ???? CC, arts. 1.784 e 422 ???? Boa-fé objetiva e estabilidade jurídica ???? Situação consolidada → transmite-se aos herdeiros |
Inteiro Teor
A controvérsia consiste em definir se os herdeiros podem exigir a restituição retroativa dos frutos percebidos pelo ascendente que exerceu ininterruptamente, por longo período, a administração dos imóveis com pleno conhecimento e aquiescência dos proprietários.
Pelo princípio da saisine, os herdeiros sucedem o de cujus na exata situação jurídica em que este se encontrava no momento da abertura da sucessão, incluindo as relações fáticas consolidadas, as expectativas legítimas criadas por seu comportamento e, sobretudo, as limitações ao exercício de direitos decorrentes de sua própria conduta.
Essa perspectiva ampliada do princípio da saisine revela que a transmissão hereditária não se opera em abstrato, mas considera a realidade concreta das relações estabelecidas pelo de cujus. Quando alguém, por sua conduta reiterada e duradoura, cria limitações ao exercício pleno de seus direitos – seja pela aquiescência prolongada, pela criação de expectativas legítimas em terceiros, ou mesmo pela própria inércia qualificada -, essas limitações integram o patrimônio jurídico transmissível, vinculando os sucessores.
Já a supressio opera quando o titular de um direito, por sua inércia prolongada e qualificada, cria na contraparte legítima expectativa de que tal direito não será exercido, tornando inadmissível seu exercício posterior.
Paralelamente à supressão do direito, opera-se o instituto da surrectio, que representa o aspecto positivo do fenômeno: enquanto a supressio elimina a possibilidade de exercício de direito pela inércia de seu titular, a surrectio representa o nascimento de uma expectativa legítima protegida juridicamente, criada não por ato volitivo expresso, mas pela convergência entre a conduta reiterada de quem exerce determinada situação jurídica e a aquiescência duradoura daqueles que poderiam opor-se a tal exercício.
A conjugação desses institutos com o princípio da saisine oferece solução jurídica adequada: quando o de cujus, por sua conduta omissiva prolongada, opera a supressão de determinado direito e, paralelamente, consolida expectativa legítima em favor de terceiro, essa situação jurídica complexa transmite-se integralmente aos herdeiros. Não podem estes invocar direitos que o próprio antecessor, por sua conduta reiterada, havia tornado juridicamente inadmissível exercer.
No caso, a administração dos imóveis, exercida de forma transparente e ininterrupta por mais de 20 anos, com percepção integral dos aluguéis, sob pleno conhecimento e aquiescência dos proprietários, consolida situação jurídica protegida pela boa-fé objetiva e pela vedação ao comportamento contraditório.
Apenas com a notificação extrajudicial é que se comprovou o término da situação jurídica consolidada, momento em que findou a expectativa de direito gerada pela situação fática duradoura e tornou-se possível aos herdeiros exercerem plenamente a administração dos imóveis e receberem os aluguéis deles provenientes.
Até esse marco temporal, a situação permaneceu legitimamente consolidada, não sendo devida restituição alguma pelos frutos obtidos durante o período de aquiescência.
9. Contrato de promessa de compra e venda e taxa de fruição em lote não edificado
Destaque
Após a entrada em vigor da Lei 13.786/2018, é legítima a cobrança da taxa de fruição prevista contratualmente, mesmo em contratos de compra e venda de lote não edificado, desde que respeitados os limites legais e havendo prévia informação ao consumidor.
REsp 2.104.086-SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por maioria, julgado em 7/10/2025, DJEN 15/10/2025.
Conteúdo-Base
???? Lei 13.786/2018; Lei 6.766/1979, arts. 26-A e 32-A; Súmula 543/STJ.
???? O distrato permite retenção de valores e cobrança de taxa de fruição quando prevista e limitada a 0,75% do valor do contrato.
???? A lei aplica-se a contratos posteriores à sua vigência.
???? A taxa de fruição incide da posse do imóvel até sua restituição ao loteador.
Discussão e Tese
???? O STJ reafirmou a possibilidade de dedução da taxa de fruição em contratos firmados após a Lei 13.786/2018.
A Turma entendeu que o tipo de lote (edificado ou não) não altera a incidência da taxa, desde que observados os limites legais e a informação prévia.
Como será Cobrado em Prova
???? É legítima a dedução da taxa de fruição nos distratos firmados após a Lei 13.786/2018, desde que respeitados os limites legais e contratualmente previstos.
Correto. Esse foi o entendimento aplicado no REsp 2.104.086-SP.
???? A taxa de fruição só é cabível em contratos de imóveis edificados.
Errado. A Lei 13.786/2018 autoriza sua cobrança também em lotes não edificados.
Versão Esquematizada
| ???? Taxa de fruição – lote não edificado |
| ???? Lei 13.786/2018; Lei 6.766/1979 ???? Limite: 0,75% do valor do contrato ???? Contratos posteriores à lei → cobrança válida |
Inteiro Teor
Cinge-se a controvérsia a saber se, em se tratando de rescisão de contrato de compra e venda de lote não edificado, celebrado após a entrada em vigor da Lei n. 13.786, de 27 de dezembro de 2018, por iniciativa do adquirente, seria possível ao promitente vendedor, devido ao distrato, reter valores pagos pelo promissário comprador, a saber o percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor do contrato, e a denominada taxa de ocupação ou fruição.
Quanto à questão relativa à retenção de valores pagos pelo adquirente do imóvel que desistiu do negócio, registre-se que, antes mesmo do advento da Lei n. 13.786/2018, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já se orientava no sentido de que, nesses casos, o promitente vendedor poderia reter percentual de valores por ele pagos, conforme estabelecido na Súmula 543 do STJ.
Ademais, estabeleceu-se, no âmbito da Segunda Seção do STJ, que, em caso de resolução por culpa exclusiva do consumidor, se não houvesse nenhuma previsão contratual em sentido diverso ou circunstância excepcional, o percentual de 25% dos valores pagos seria valor suficiente para compensar os prejuízos do incorporador.
Com a edição da Lei n. 13.786/2018, passou a ser previsto expressamente o direito de distrato, por meio da inclusão, na Lei n. 6.766/1979, do art. 26-A, dispondo que os contratos de compra e venda, cessão ou promessa de cessão de loteamento devem ser iniciados por quadro-resumo, que deverá conter, entre outros requisitos, “as consequências do desfazimento do contrato, seja mediante distrato, seja por meio de resolução contratual motivada por inadimplemento de obrigação do adquirente ou do loteador, com destaque negritado para as penalidades aplicáveis e para os prazos para devolução dos valores ao adquirente” (inciso V). Essas consequências são delimitadas no art. 32-A também inserido na referida lei.
No caso, tendo o Tribunal de origem esclarecido que (i) a retenção de valores foi feita pela incorporadora dentro dos parâmetros previstos pela Lei n. 13.786/2018 e (ii) que houve informação prévia ao comprador a respeito das consequências da desistência do negócio, não há como afastar suas disposições, especialmente quando não constatada inconstitucionalidade na lei, nem violação ao Código de Defesa do Consumidor.
Dessa forma, tendo sido a cláusula penal estabelecida em 10% do valor atualizado do contrato, dentro dos limites estabelecidos no art. 32-A da Lei n. 6.766/1979, correto o entendimento pela legalidade da respectiva retenção.
Quanto à taxa de fruição, em se tratando de rescisão de contrato de compra e venda de lote não edificado, até 28/12/2018, quando entrou em vigor a Lei n. 13.786/2018, em regra não era devida a devolução, pelo promissário comprador ao promitente vendedor, da denominada taxa de ocupação ou fruição, haja vista que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consolidou-se no sentido de afastar a sua exigência presumida e não havia nenhuma lei regulando a questão.
Contudo, a partir da Lei n. 13.786/2018 pode haver a dedução da taxa de fruição dos valores a serem restituídos ao comprador, em caso de rescisão de promessa de compra e venda de lote não edificado, desde que respeitados todos os termos da legislação e se houver expressa disposição contratual nesse sentido.
Assim, havendo, atualmente, expressa previsão legal, o adquirente que desiste da compra e venda de lote após ser-lhe transmitida a posse, estando apto a dele usufruir, inclusive para construção, não mais pode se escusar do pagamento da taxa de fruição, ao argumento de que não houve ocupação efetiva do bem.
Como a lei não tem palavras inúteis, a fixação dos termos inicial e final para a incidência da taxa de fruição (a partir da data da transmissão da posse do imóvel ao adquirente até sua restituição ao loteador) tem a consequência lógica de definir que a referida taxa não está mais condicionada à existência de lote edificado ou não edificado, mas exclusivamente à disponibilidade do lote para o comprador.
Com a disponibilização do lote, no momento da transmissão da posse, cumpre o loteador a sua obrigação, passando o promitente comprador a ter a disponibilidade plena do imóvel para o uso que melhor lhe aprouver, inclusive decidir se e quando irá construí-lo, dar outro tipo de uso ao lote, como lazer, ou revendê-lo. O uso – ou não uso do imóvel – não deve afetar a esfera jurídica do loteador, que cumpriu sua obrigação e perdeu a disponibilidade sobre o bem.
Nesse contexto, o tipo de empreendimento (lote não edificado, lote edificado ou com destinação econômica específica) deverá ser sopesado apenas na fixação do valor da taxa de fruição, “até o equivalente a 0,75% (setenta e cinco centésimos por cento sobre o valor atualizado do contrato)”, mas não afasta a possibilidade de sua retenção, dos valores a serem restituídos ao comprador desistente, nos termos da lei.
10. Seguro de vida em grupo e interesse de agir
Destaque
O requerimento administrativo prévio é requisito necessário para o reconhecimento do interesse de agir na ação de cobrança de indenização securitária, salvo quando a seguradora já tiver manifestado resistência inequívoca ao pedido.
AgInt no REsp 2.091.602-MS, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 15/9/2025, DJEN 19/9/2025.
Conteúdo-Base
???? CC, art. 771; CPC, art. 17.
???? O aviso de sinistro equivale ao requerimento administrativo para pagamento da indenização.
???? Sem comunicação formal, não há resistência da seguradora nem lesão a direito.
???? Excepcionalmente, o interesse de agir subsiste se a seguradora contesta o pedido judicial sem alegar ausência de requerimento.
Discussão e Tese
???? O STJ reafirmou que a ausência de requerimento administrativo prévio impede o reconhecimento do interesse de agir na ação de cobrança de seguro.
Contudo, a exigência pode ser mitigada quando houver resistência expressa da seguradora ao pagamento.
Como será Cobrado em Prova
???? O ajuizamento de ação de cobrança de seguro prescinde de prévio requerimento administrativo.
Errado. O requerimento é condição para o interesse de agir.
???? A falta de requerimento administrativo não impede a ação quando a seguradora manifesta resistência expressa ao pagamento.
Correto. Esse foi o entendimento aplicado.
Versão Esquematizada
| ???? Seguro de vida – interesse de agir |
| ???? CC, art. 771 ???? CPC, art. 17 ???? Aviso de sinistro = requerimento ???? Resistência inequívoca → dispensa |
Inteiro Teor
A controvérsia consiste em analisar se o requerimento administrativo prévio constitui requisito para a existência de interesse de agir na ação de cobrança de indenização securitária.
Quanto ao assunto, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que “[…] o art. 771 do CC/2002 exige que o segurado comunique o sinistro à seguradora, logo que o saiba, sob pena de perder o direito à indenização. Embora a finalidade precípua dessa norma seja evitar o agravamento das consequências geradas pelo sinistro, o aviso de sinistro representa a formalização do pedido de pagamento da indenização securitária. Antes disso, a seguradora não está obrigada a pagar, simplesmente porque não tem ciência do evento. Portanto, não realizada a comunicação acerca do sinistro, não há lesão a direito ou interesse do segurado”. (REsp 2.050.513/MT, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 25/4/2023, DJe de 27/4/2023).
Todavia, deve ser consignado que esta Corte de Justiça também entende que, excepcionalmente, a depender do caso, a ausência de requerimento administrativo prévio não impedirá o prosseguimento do processo.
Assim, “se já tiver se operado a citação da seguradora, eventual oposição desta ao pedido de indenização deixa clara a sua resistência frente à pretensão do segurado, evidenciando a presença do interesse de agir. Porém, nem sempre a resposta da seguradora implicará impugnação ao pedido de pagamento. É possível por exemplo, que ela invoque a ausência de prévia solicitação administrativa, hipótese em que caberá a extinção do processo sem resolução do mérito, por ausência de interesse processual”. (REsp 2.050.513/MT, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 25/4/2023, DJe de 27/4/2023).
11. Parcelamento de taxas e custas judiciais
Destaque
É possível o parcelamento das taxas e custas judiciais, pois elas se enquadram no conceito de despesas processuais abrangido pelo art. 98 §6º do CPC, instrumento que concretiza o direito fundamental de acesso à Justiça.
REsp 2.208.615-SP, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 7/10/2025, DJEN 15/10/2025.
Conteúdo-Base
???? CPC, art. 98 §§1º e 6º; ADI 1378/ES; REsp 1.893.966/SP.
???? As taxas e custas judiciais são espécies de despesas processuais.
???? O parcelamento não implica renúncia ou redução, mas mera dilação do pagamento.
???? O juiz pode conceder o parcelamento como medida intermediária entre o indeferimento da gratuidade e a isenção total.
Discussão e Tese
???? CPC, art. 98 §§1º e 6º; ADI 1378/ES; REsp 1.893.966/SP.
???? As taxas e custas judiciais são espécies de despesas processuais.
???? O parcelamento não implica renúncia ou redução, mas mera dilação do pagamento.
???? O juiz pode conceder o parcelamento como medida intermediária entre o indeferimento da gratuidade e a isenção total.
Como será Cobrado em Prova
???? O art. 98 §6º do CPC não se aplica às taxas judiciais em razão de sua natureza tributária.
Errado. O STJ reconheceu que o parcelamento é aplicável.
???? O juiz pode autorizar o parcelamento das taxas e custas judiciais quando comprovada dificuldade financeira da parte.
Correto. Trata-se de medida intermediária entre o indeferimento da gratuidade e a isenção total.
Versão Esquematizada
| ???? Custas e taxas – parcelamento |
| ???? CPC, art. 98 §6º ???? Acesso à Justiça e proporcionalidade ???? Parcelamento autorizado pelo juiz |
Inteiro Teor
Cinge-se a controvérsia a definir se o disposto no art. 98, § 6º, do Código de Processo Civil, que prevê expressamente a possibilidade de parcelamento de “despesas processuais”, abrange o parcelamento das custas judiciais e das taxas judiciárias iniciais.
A questão inicial a ser dirimida, portanto, é se a expressão “despesas processuais” empregada pelo legislador abrange também as custas judiciais e as taxas judiciárias, ou se estas, por sua natureza tributária, estariam excluídas do alcance da norma federal.
Uma interpretação sistemática e teleológica do Código de Processo Civil conduz à conclusão inequívoca de que as custas judiciais e as taxas judiciárias integram o gênero despesas processuais, para fins de aplicação do art. 98, § 6º.
No entendimento consolidado da doutrina processualista, as despesas processuais abrangem a totalidade dos desembolsos necessários à instauração, desenvolvimento e conclusão da relação processual. Essa conceituação abrangente encontra respaldo na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que sistematicamente reconhece as despesas processuais como categoria ampla (gênero), da qual derivam, como espécies, as custas judiciais, a taxa judiciária e os emolumentos.
Cabe observar que o próprio CPC, ao disciplinar os benefícios da gratuidade da justiça em seu art. 98, § 1º, incluiu expressamente “as taxas ou as custas judiciais” (inciso I) entre os itens abrangidos pelo conceito mais amplo de despesas processuais. O legislador adotou técnica redacional que estabelece clara sistemática jurídica, posicionando as custas e taxas judiciárias como espécie das despesas processuais.
Ademais, o parcelamento das custas judiciais e das taxas judiciárias previsto no art. 98, § 6º, do CPC representa nítida aplicação do princípio da proporcionalidade na concretização do direito fundamental de acesso à Justiça. Trata-se de medida que se situa entre dois extremos: de um lado, a imposição do pagamento integral das taxas de uma só vez, potencialmente impeditiva do acesso ao Judiciário; de outro, a concessão da gratuidade total, que dispensa o pagamento de qualquer valor.
A própria ratio legis do parcelamento fundamenta-se no princípio de que quem pode o mais pode o menos – sendo ilógico conferir ao magistrado o poder de conceder gratuidade total (isenção do tributo), dispensando integralmente o recolhimento das taxas, mas negar-lhe a prerrogativa de autorizar simples parcelamento, providência manifestamente menos onerosa aos cofres públicos. Tal mecanismo não representa nenhuma dispensa ou redução do valor devido, constituindo mera dilação do prazo para adimplemento, com integral preservação do montante e garantia de sua efetiva arrecadação.
Cumpre ressaltar ainda que a natureza tributária das custas judiciais e das taxas judiciárias, reconhecida pelo STF no julgamento da ADI n. 1378/ES e pelo STJ no REsp n. 1.893.966/SP, não constitui óbice à aplicação do art. 98, § 6º, do CPC/2015.
As custas judiciais e as taxas judiciárias constituem tributo diretamente vinculado à efetivação da garantia constitucional de acesso ao Judiciário. Em virtude de sua relevância para o exercício da cidadania, o próprio Código de Processo Civil estabeleceu mecanismos de flexibilização de seu pagamento, conferindo ao magistrado a prerrogativa de, mediante análise criteriosa do caso concreto, conceder isenção aos comprovadamente hipossuficientes ou autorizar o parcelamento dos valores devidos.
Nesse contexto, é necessário reconhecer que as normas processuais que disciplinam o acesso à Justiça possuem aplicabilidade imediata em todo o território nacional, não podendo ser afastadas sob o argumento de ausência de previsão específica em legislação estadual.
Desse modo, não sendo caso de concessão do benefício integral da justiça gratuita, ao magistrado é conferido o poder discricionário de determinar o fracionamento do pagamento das taxas e custas judiciais, estabelecendo suas condições e forma de adimplemento quando comprovada a dificuldade financeira da parte requerente para a quitação integral e imediata dos valores devidos.
12. Acordo de não persecução penal (ANPP) e continuidade delitiva
Destaque
A continuidade delitiva não impede a celebração do Acordo de Não Persecução Penal (ANPP), desde que a pena mínima resultante, calculada com as frações mínimas das majorantes e máximas das atenuantes, não ultrapasse quatro anos. É vedado o uso de “pena hipotética” para afastar o exame de admissibilidade do ANPP.
Processo em segredo de justiça, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Rel. p/ acórdão Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por empate, julgado em 7/10/2025, DJEN 17/10/2025.
Conteúdo-Base
???? CPP, art. 28-A §1º; Lei 13.964/2019; Lei 9.099/1995, art. 89; Súmulas 243 e 438/STJ, 723/STF.
???? O requisito objetivo do ANPP é aferido pela pena mínima em abstrato.
???? Deve-se adotar a fração mínima das majorantes e a máxima das atenuantes.
???? É vedada a projeção de “pena hipotética” em perspectiva.
???? A continuidade delitiva não obsta o ANPP se a pena mínima final não exceder quatro anos.
Discussão e Tese
???? O STJ harmonizou o art. 28-A do CPP com a jurisprudência dos Juizados Especiais (Lei 9.099/1995), aplicando analogia in bonam partem ao ANPP.
O Tribunal afastou a tese de que a continuidade delitiva excluiria automaticamente a negociação, reforçando que o cálculo deve considerar as frações mínimas e não projeções hipotéticas de pena, em coerência com a Súmula 438/STJ (vedação à prescrição em perspectiva).
Como será Cobrado em Prova
???? A continuidade delitiva impede o ANPP por elevar a pena mínima além de quatro anos.
Errado. O STJ entendeu que é possível o acordo se a pena mínima com frações mínimas não exceder quatro anos.
???? O exame de admissibilidade do ANPP deve considerar a pena mínima em abstrato, com incidência das majorantes na fração mínima e das atenuantes na fração máxima.
Correto. Esse é o entendimento do STJ.
Versão Esquematizada
| ???? ANPP – continuidade delitiva |
| ???? CPP, art. 28-A §1º ???? Pena mínima em abstrato ???? Vedação à “pena hipotética” (Súmula 438/STJ) ???? Analogias: sursis processual e Tema 723/STF |
Inteiro Teor
A controvérsia consiste em definir se, em crimes em continuidade delitiva, a aferição do requisito objetivo previsto no art. 28-A do CPP para o ANPP deve se pautar pela pena mínima em abstrato – com incidência das causas de aumento na fração mínima -, permitindo, assim, a análise ministerial do acordo de não persecução penal.
O acordo de não persecução penal, introduzido pela Lei n. 13.964/2019, exige, entre outros requisitos, que o crime seja sem violência ou grave ameaça e que a pena mínima em abstrato seja inferior a 4 anos, cabendo ao Ministério Público avaliar motivadamente o cabimento, sem que haja direito subjetivo do investigado ao acordo.
Dada a função despenalizadora que lhe é atribuída pela Lei n. 13.964/2019, o ANPP exige interpretação teleológica e sistémica, em consonância com institutos congêneres que partilham o mesmo horizonte normativo e valorativo, entre os quais se inclui a suspensão condicional do processo, nos termos do art. 89 da Lei n. 9.099/1995. Ambos os mecanismos orientam-se pela reduzida intervenção estatal e pela busca de soluções que privilegiem a consensualidade e a efetividade da tutela penal mínima, exigindo, por isso, leitura harmonizadora que preserve a coesão do ordenamento e a finalidade despenalizadora do legislador.
No plano interpretativo, a exigência do art. 28-A, caput, do CPP quanto à “pena mínima inferior a 4 (quatro) anos” reclama entendimento técnico: a expressão deve ser aferida no plano abstrato da tipicidade sancionatória, isto é, tomando-se por parâmetro a pena mínima legalmente cominada ao tipo, e não projeções hipotéticas resultantes da dosimetria concreta ou de cálculos prospectivos sobre as consequências da continuidade delitiva. Assim compreendida, a previsão legal assegura previsibilidade e delimitação normativa ao critério de elegibilidade para o instituto, afastando avaliações que se confundam com o juízo de dosagem sancionatória próprio da fase de culpabilidade e pena.
Admitir o cálculo “em perspectiva”, como pretende o Ministério Público, importaria em introduzir no exame de admissibilidade do ANPP raciocínios análogos à extinta figura da chamada prescrição em perspectiva, cuja instrumentalização pelo intérprete fora severamente rechaçada pela jurisprudência que culminou na consolidação da Súmula n. 438/STJ.
Em substância, referido raciocínio permitiria valoração de penas hipotéticas como parâmetro decisório, prática que fragiliza a segurança jurídica e enseja discricionariedades indefinidas. Em suma, a interpretação coerente com o texto legal e com o sistema recomenda que a aferição da aptidão ao acordo se faça à luz da pena mínima em abstrato, preservando-se, na fase própria, a liberdade do magistrado para a dosimetria concreta e para a valoração dos elementos fáticos.
É certo que o art. 28-A, § 1º, do CPP dispõe que, “para aferição da pena mínima cominada ao delito a que se refere o caput deste artigo, serão consideradas as causas de aumento e de diminuição aplicáveis ao caso concreto.” Tal enunciado demanda, porém, interpretação em chave sistemática e finalística. Tratando-se de requisito objetivo de elegibilidade, a norma não autoriza que o exame preliminar se converta em ensaio prospectivo de dosimetria; impõe-se, ao revés, que se adote como parâmetro inicial a pena mínima em abstrato, valorizando-se, na aplicação das majorantes, a fração mínima legal pertinente, porquanto essa solução resguarda a delimitação normativa do critério de admissibilidade e preserva a separação de funções entre a fase de seleção do instrumento despenalizador e a fase sentencial de individualização da pena.
A jurisprudência que trata do sursis processual consagrou raciocínio análogo. Não obstante a omissão da Lei n. 9.099/1995 quanto à continuidade delitiva, sedimentou-se entendimento segundo o qual, para aferição da elegibilidade ao benefício, procede-se à soma da pena mínima da infração mais grave com o acréscimo de 1/6, conforme sedimentado na Súmula n. 243/STJ e Súmula n. 723/STF. A analogia in bonam partem impõe a transposição desse raciocínio ao ANPP, em razão da proximidade da causa finalística entre os institutos.
Desse modo, à luz do texto e da finalidade do art. 28-A, § 1º, do CPP, o qual determina considerar causas de aumento e diminuição para aferição da pena mínima, a interpretação normativa correta é a que, nas variáveis, toma a fração mínima das majorantes e a fração máxima das atenuantes, na medida em que o critério legal visa precisamente à aferição da pena mínima em abstrato, e não a sua projeção na dimensão máxima; em suma, procura-se a menor pena possível em abstrato, não a pena em sua extensão máxima.
13. Tribunal do Júri e nulidade por prova exclusivamente extrajudicial
Destaque
A pronúncia e a condenação não podem ser fundamentadas exclusivamente em elementos colhidos na fase extrajudicial; é imprescindível a produção de provas em contraditório judicial.
REsp 2.232.036-DF, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 14/10/2025.
Conteúdo-Base
???? CPP, arts. 155 e 197; CF, art. 5º LIV e LVII.
???? É vedado ao juiz utilizar elementos inquisitoriais como prova exclusiva de pronúncia ou condenação.
???? A confissão extrajudicial isolada não sustenta denúncia, pronúncia ou condenação.
???? A decisão deve respeitar a presunção de inocência e o devido processo legal.
Discussão e Tese
???? O STJ analisou caso em que o réu foi pronunciado e condenado com base apenas em confissões e depoimentos prestados na fase inquisitorial.
A Sexta Turma reconheceu a nulidade do processo, por violação ao contraditório e à ampla defesa, determinando o trancamento da ação penal, com possibilidade de nova denúncia se houver elementos válidos.
Como será Cobrado em Prova
???? É válida a condenação baseada exclusivamente em provas colhidas na fase extrajudicial.
Errado. O STJ declarou a nulidade por ofensa ao contraditório e à presunção de inocência.
???? A pronúncia e a condenação exigem provas colhidas em juízo sob o crivo do contraditório.
Correto. Esse foi o entendimento aplicado.
Versão Esquematizada
| ???? Tribunal do Júri – provas extrajudiciais |
| ???? CPP, arts. 155 e 197 ???? CF, art. 5º LIV e LVII ???? Confissão isolada → insuficiente ???? Nulidade da pronúncia e da condenação |
Inteiro Teor
A controvérsia consiste em definir se a pronúncia e a condenação podem ser fundamentadas exclusivamente em elementos colhidos na fase extrajudicial, sem confirmação em juízo; e se o entendimento jurisprudencial mais benéfico ao recorrente pode ser aplicado após o trânsito em julgado da condenação.
De inicio, registre-se que, nos autos da revisão criminal, é fato incontroverso que o acusado foi submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri mediante elementos de informação coletados apenas na fase extrajudicial, quais sejam, sua confissão e o relato dos corréus, exclusivamente, sem que o Juízo tenha aliado esses elementos a qualquer outro decorrente da larga investigação instaurada para apurar a prática dos crimes.
Ademais, no caso, salta aos olhos que existiu séria contradição entre os depoimentos dos corréus prestados em fase inquisitorial, em que imputam a autoria ao recorrente, e as considerações apresentadas em juízo, ocasião na qual o consideraram inocente.
Caberia ao magistrado singular, a fim de afastar o depoimento judicial que inocenta o recorrente, minimamente, corroborar o depoimento extrajudicial que o incrimina com outros elementos de convicção, mas isso não consta da decisão de pronúncia, que apenas opta pelo depoimento extrajudicial incriminador para submeter o acusado a julgamento pelo Conselho de juízes leigos, sem sequer mencionar a existência dos depoimentos judiciais exculpantes.
O mais grave no caso em questão é que existe prova judicial que aponta para a inocência do sentenciado, mas esta foi totalmente desconsiderada e ignorada pelo Magistrado singular.
Daí por diante, a pergunta que se deve fazer é a seguinte: poderia um acusado ser submetido a julgamento por um Tribunal de Juízes leigos, mediante a sobreposição de um depoimento extrajudicial, que nem sequer menciona a forma de execução dos crimes imputados, ao depoimento prestado em juízo, pelos mesmos corréus que o apontaram como executor, de que ele seria inocente?
Ainda no campo dos questionamentos, indago: o brocardo in dubio pro societate, considerado na ocasião da decisão de pronúncia, que nem sequer faz parte da categoria dos princípios processuais penais, poderia justificar o julgamento de um acusado por juízes leigos apenas com base em depoimentos de corréus, sem qualquer elemento dos autos que confirmassem a veracidade dessas acusações? Não estaria o magistrado dando a esses depoimentos um valor maior do que eles de fato ostentem?
E o que dizer da própria confissão do acusado, que vacilou em diversas ocasiões em que indagado pela autoridade policial? Poderia sua confissão ser considerada para submissão a um julgamento pelo Júri, sem que tal elemento de convicção tenha sido confrontado com as demais provas dos autos, em total afronta ao art. 197 do Código de Processo Penal?
Para todos esses questionamentos, a resposta se baseia no fato de que, ainda que em algum momento a jurisprudência tenha admitido a submissão do acusado a julgamento pelo Tribunal do Júri, mediante elementos produzidos exclusivamente na fase investigatória, considerada à base constitucional do Estado Democrático de Direito garantido pela Constituição Federal de1988, mesmo que o Código de Processo Penal no qual nos baseamos seja de 1941 e ostente alguns resquícios inquisitoriais, nenhum dispositivo legal dali constante pode se sobrepor às garantias constitucionais, dentre elas a presunção de inocência e o devido processo legal (art. 5º, LVII e LIV, da CF/1988).
Ainda que se sustente a respeito da instrução em plenário, da análise da ata de julgamento do Tribunal do Júri, observa-se que a tese defensiva é de negativa de autoria, ou seja, contrária à confissão extrajudicial do recorrente e dos corréus que o incriminaram somente naquela ocasião.
Ademais, é importante reconhecer e consignar que este Superior Tribunal, em relação à impossibilidade de submeter o acusado a julgamento pelo Tribunal do Júri com base apenas em elementos de convicção da fase extrajudicial, firmado a partir de meados de 2022, mas não em precedente qualificado, não estabeleceu balizas para sua aplicação retroativa.
Daí porque a análise tem sido feita de acordo com o caso concreto, a depender do quanto a nulidade é manifesta, a título de cognição, inerente a recurso ou habeas corpus, da destreza do advogado em demonstrar a violação do dispositivo legal e do prejuízo causado ao acusado, podendo o vício ser reconhecido até mesmo após a sentença condenatória.
Nesse contexto, não existe outra providência a não ser o trancamento da ação penal, uma vez que a mera confissão desvinculada de outros elementos de informação não é capaz de sustentar sequer a denúncia, razão pela qual o recorrente deverá ser colocado imediatamente em liberdade, sem prejuízo de que outra denúncia seja formulada pelo órgão da acusação, desde que mediante suficientes elementos de informação que denotem a existência de indícios de autoria em relação ao acusado.
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