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Citação
A citação é um dos mais importantes atos de comunicação processual, vez que dá conhecimento ao acusado do recebimento de uma denúncia ou queixa em face de sua pessoa, chamando-o para se defender. Considerando-se que a instrução criminal deve ser conduzida sob o crivo do contraditório, a parte contrária deve ser ouvida (audiatur et altera pars). Para que ela seja ouvida, faz-se necessário o chamamento a juízo, que é feito por meio da citação.
Funciona a citação, portanto, como misto de contraditório e ampla defesa, já que ao mesmo tempo em que dá ciência ao acusado da instrução de demanda penal contra ele, também o chama para exercer seu direito de defesa. Portanto, além de assegurar o exercício do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV, CF), a citação também dá concretude ao quanto previsto na Convenção Americana sobre Direitos Humanos, que assegura que toda pessoa acusada de delito tem direito à comunicação prévia e pormenorizada da acusação formulada (Dec. 678/1992, art. 8º, nº 2, “b”).
Tamanha é sua importância que o próprio Código de Processo Penal, em seu art. 564, inciso III, alínea “e”, estabelece que sua falta configura nulidade absoluta, a qual poderá ser arguida mesmo após o trânsito em julgado de sentença condenatória ou absolutória imprópria. Logo, se a citação não existiu ou, tendo existido, estava eivada de nulidade, o processo estará nulo ab initio. Denomina-se circundução o ato pelo qual se julga nula ou de nenhuma eficácia a citação; quando anulada diz-se citação circunduta.
Se a citação válida é providência essencial à validade do processo, a nulidade absoluta decorrente da inobservância da forma prescrita em lei poderá ser arguida mesmo após o trânsito em julgado de sentença condenatória ou absolutória imprópria, na medida em que, nessa hipótese, há instrumentos processuais aptos a fazê-lo, como a revisão criminal e o habeas corpus, que somente podem ser ajuizados em favor do condenado.
A despeito da importância da citação, sua falta ou nulidade estará sanada, desde que o interessado compareça, antes de o ato consumar-se, embora declare que o faz para o único fim de argui-la. Afinal o fim da citação será alcançado. Nesse caso, a lei permite que o juiz ordene a suspensão ou o adiamento do ato, quando reconhecer que a irregularidade poderá prejudicar o direito da parte (art. 570, CPP).
Diante do comparecimento do preso em juízo em virtude de requisição à autoridade carcerária, não é possível invocar nulidade por ausência de citação. Com efeito, a apresentação do denunciado ao juízo, a despeito de não cumprir o disposto no art. 360, CPP, supre a eventual ocorrência de nulidade nos exatos termos do art. 570 do CPP.
A citação deve ser realizada ainda que o acusado tenha constituído advogado antes do início do processo. Quando o advogado é constituído antes do oferecimento da denúncia (v.g., prisão em flagrante), é, de fato, possível que tenha informado o cliente sobre o desenrolar do processo, mas isso se trata de mera conjectura que não pode agastar o gravíssimo vício de eventual relação processual que se desenvolva sem a presença do acusado pelo fato não ter sido citado.
Não se pode objetar que não teria havido prejuízo em virtude de o advogado particular ter atuado durante a instrução probatória, porquanto não se pode perder de vista que a ampla defesa se subdivide em defesa técnica e autodefesa, esta última relaciona-se à intervenção direta e pessoal do citado na realização dos atos processuais. Não se trata a autodefesa de direito indisponível do acusado, tal qual a defesa técnica, mas o seu cerceamento produzido pela ausência de citação enseja grave prejuízo ao acusado, por suprimir dele a possibilidade de participação ativa da melhor reconstrução histórica dos fatos sob julgamento.
No âmbito do processo penal, a citação é feita uma única vez, sendo que, uma vez citado o acusado, fica este vinculado à instância com todos os ônus daí decorrentes. Portanto não há necessidade de uma nova citação para a execução, já que a pretensão deduzida na ação penal somente se realiza com o cumprimento da sentença condenatória, e, assim, uma vez proferida sentença condenatória, ou mesmo absolutória com imposição de medida de segurança, segue-se a fase da execução, que no processo penal, constitui um prolongamento da relação processual.
Ressalva especial quanto à desnecessidade de se proceder à nova citação na execução diz respeito à pena de multa. De fato, de acordo com o art. 164 da Lei de Execução Penal (Lei 7.210/1984), “extraída certidão da sentença condenatória com trânsito em julgado, que valerá como título judicial, o Ministério Público requererá, em autos apartados, a citação do condenado para, no prazo de 10 (dez) dias, pagar o valor da multa ou nomear bens à penhora”.
No processo penal o único efeito da citação é estabelecer a angularização da relação processual, fazendo surgir a instância. Forma-se assim a relação angular que instala em um ponto a acusação, noutro o juiz a quem o pedido é endereçado e, por último, o acusado, que, citado, passa a compor essa relação, formando-se o actum trium personarum. Nessa linha, aliás, o art. 363, caput, do CPP, conceitua que “o processo terá completada a sua formação quando realizada a citação do acusado”.
Importe destacar que no processo penal a litispendência é verificada a partir do recebimento da segunda inicial acusatória (denúncia ou queixa) e não com a citação válida como é no processo civil.
O que torna o juízo prevento é a distribuição (art. 75, CPP) ou a prática de algum ato de caráter decisório, ainda que anterior ao oferecimento da denúncia ou queixa, quando houver dois ou mais juízes igualmente competentes ou com jurisdição cumulativa (art. 83, CPP). Ademais, não é a citação válida que interrompe a prescrição, mas sim o recebimento da inicial acusatória pelo juízo competente, nos exatos termos do art. 117, inciso I, do Código Penal.
Dita as primeiras palavras sobre a citação, vamos distinguir as suas modalidades. A primeira diferenciação é feita entre a (i) citação pessoal ou real e a (ii) ficta ou presumida.
A citação pessoal (regra no processo penal) é por mandado (entregue pelo oficial) ou, no caso do Juizado Especial Criminal (Lei 9.099/1995), via correios com aviso de recebimento (AR), estipulando o Código de Processo Penal, inclusive, os dados essenciais que devem constar no mandado (art. 352) e a forma como deve ser feita a citação (art. 357).
Ademais, acaso o acusado resida em comarca distinta da de jurisdição do Juízo, a citação será feita por precatória (art. 353, CPP), existindo também um disciplinamento legal sobre as informações que devem nela constar (art. 354, CPP).
O Código de Processo Penal estipula 2 (duas) hipóteses OBRIGATÓRIAS de citação pessoal:
a) o militar, que é citado na pessoa do respectivo chefe de serviço;
b) o réu que esteja preso: especificamente quanto ao réu preso, os Tribunais Superiores já consolidaram entendimento de que diz respeito a preso na mesma UNIDADE DA FEDERAÇÃO do Juízo criminal que determina o ato citatório.
Há duas espécies de citação ficta, quais sejam, (i) por hora certa; e, (ii) por edital.
A primeira modalidade ficta (ou seja, não pessoal) de citação é a por hora certa, que é uma decorrência da impossibilidade de concluir a citação pessoal (art. 362, CPP).
Neste sentido, o oficial de justiça se dirige ao endereço do citando e não o encontra em 02 (duas) oportunidades, em horários e turnos distintos (deve-se usar o bom senso e considerar a necessidade de extrapolar o horário comercial), de modo que nesta segunda tentativa infrutífera avisa a vizinho ou parente do acusado que estará no local em certo dia e em certa hora para realizar a citação (o quantitativo de 03 vezes não está no CPP, mas a doutrina e a jurisprudência consideram que deve ser aplicada analogicamente a disposição do CPC que fala expressamente neste sentido). Porém, deve-se deixar muito claro que não é apenas o fato de não encontrar o citando, mas é essencial que se configure o requisito essencial de suspeitas de que o réu se oculta para não ser citado.
A jurisprudência dos Tribunais Superiores já consolidou que devem ser ESGOTADAS as buscas de endereço do citando em outros órgãos públicos, a fim de garantir que não se trata de mera dificuldade de citação por conta de endereço alterado, mas que o acusado efetivamente busca a ocultação para impedir que o processo se forme.
Por sua vez, acaso o réu esteja em local incerto ou não sabido, recorre-se, então, à CITAÇÃO POR EDITAL (2ª espécie de citação ficta), definindo o Código de Processo Penal os dados que devem constar no edital (art. 365) e os prazos para a resposta do réu (art. 364).
Ainda, se, no prazo definido no edital, o acusado não comparecer nem constituir advogado, o feito será suspenso e também seu prazo prescricional (e os Tribunais Superiores1 consideram que este prazo prescricional é o mesmo lapso da pretensão punitiva – calculado segundo a máxima em abstrato), e, ainda, o juízo poderá decretar a prisão preventiva (diante da presença dos requisitos do art. 312 do CPP e/ou determinar a realização das diligências probatórias consideradas urgentes, consoante disciplina o art. 366 do Código de Processo Penal.
Súmulas importantes sobre citação:
- Súmula n. 366, STF: Não é nula a citação por edital que indica o dispositivo da lei penal, embora não transcreva a denúncia ou queixa, ou não resuma os fatos em que se baseia.
- Súmula n. 351, STF: É nula a citação por edital de réu preso na mesma unidade da federação em que o juiz exerce a sua jurisdição.
- Súmula n. 455, STJ: A decisão que determina a produção antecipada de provas com base no art. 366 do CPP deve ser concretamente fundamentada, não a justificando unicamente o mero decurso do tempo.
Na prática, não há qualquer relevância na distinção entre intimação e notificação. Na verdade, pelo que se percebe da própria redação do Código de Processo Penal e da legislação especial, é comum a utilização equivocada de tais expressões. De todo modo, pelo menos sob um ponto de vista doutrinário, é possível trabalhar com seguinte distinção:
a) Intimação: é a comunicação feita a alguém no tocante a ato já realizado. A título de exemplo, podemos citar a intimação da degravação de audiência, a intimação de sentença prolatada pelo magistrado etc.
b) Notificação: diz respeito à ciência dada a alguém quanto à determinação judicial impondo o cumprimento de certa providência. Exemplos: notificação para que a testemunha compareça em juízo para prestar seu depoimento; notificação do acusado para que compareça à audiência una de instrução e julgamento para fins de reconhecimento pessoal.
Em sede processual penal, os prazos fatais, contínuos, peremptórios, não se interrompendo por férias, domingo ou dia feriado, nos termos do art. 798, caput, do CPP, salvo nos casos de impedimento do juiz, força maior ou obstáculo judicial oposta pela parte contrária (art. 798, § 4º, CPP).
A regra constante no art. 798, caput, do CPP diz respeito ao início do prazo, o que não se confunde com o início da contagem do prazo. O marco inicial do prazo, é, em regra, aquele em que ocorre a intimação; a contagem, que é coisa distinta, obedece a regras diversas. Com efeito, quanto à contagem do prazo, há de se lembrar que o dia do começo não é computado, incluindo, porém, o do vencimento.
Ademais, o prazo que terminar em domingo ou feriado considerar-se-á prorrogado até o dia útil imediato. A título de exemplo, se a intimação ocorrer numa segunda-feira, sendo o prazo recursal de 5 (cinco) dias, isso significa dizer que o prazo começará a fluir a partir de terça-feira, já que é excluído o dia do começo. Evidentemente, desde que terça-feira não seja feriado, já que o prazo somente começa a fluir a partir do primeiro dia útil subsequente. O prazo então irá expirar no sábado, prorrogando-se, por consequência, para o primeiro dia útil subsequente – segunda-feira.
SEMANA | ||||||
Segunda | Terça | Quarta | Quinta | Sexta | Sábado | Domingo |
Intimação | 1° dia | 2° dia | 3° dia | 4° dia | X | X |
5° dia |
Por outro lado, se a intimação ocorrer na sexta-feira, a contagem do prazo só terá início na segunda-feira seguinte, salvo se for feriado. Cuidando-se de um prazo de 5 (cinco) dias, a contagem iniciada na segunda, irá expirar na sexta-feira. Nesse sentido é o entendimento sumular n. 310 do Supremo Tribunal Federal: “Quando a intimação tiver lugar na sexta-feira, ou a publicação com efeito de intimação for feita nesse dia, o prazo judicial terá início na segunda-feira imediata, salvo se não houver expediente, caso em que começará no primeiro dia útil que se seguir”.
SEMANA | ||||||
Segunda | Terça | Quarta | Quinta | Sexta | Sábado | Domingo |
Intimação | X | X | ||||
1° dia | 2° dia | 3° dia | 4° dia | 5° dia |
A Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, constitui prerrogativa do membro do MP, no exercício de sua função, além de outras, a de receber intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição, através da entrega dos autos com vista.
Prevalece o entendimento de que a entrega dos autos em setor administrativo do MP, formalizada a carga pelo servidor, configura intimação direta, pessoal, cabendo tomar a data em que ocorrida como a da ciência da decisão judicial.
Os defensores públicos também têm assegurada a prerrogativa de receber, inclusive quando necessário, mediante entrega dos autos com vista, intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição ou instância administrativa, contando-se-lhes em dobro todos os prazos da Lei Complementar 80/1994.
Quando o Defensor Público for intimado pessoalmente em audiência, há controvérsias se o início do cômputo do prazo para recorrer começa a fluir daquele momento, ou se, na verdade, o prazo somente se inicia com a remessa dos autos com vista à instituição.
Nas hipóteses em que o ato judicial decisório é proferido em audiência, haverá intimação pessoal das partes presentes (acusação e defesa). A 3ª Turma do STJ, afirma que essa intimação não é suficiente para permitir ao membro da defensoria o exercício pleno do contraditório e ampla defesa, vez que naquele momento não poderá levar os autos e ainda, pode nem ser esse membro que impugnará o ato decisório proferido em audiência. Assim, para engendrar a contagem do prazo recursal, necessário a remessa dos autos à Defensoria Pública.
A partir da edição da Lei n. 9.271/1996, que incluiu o § 4º ao art. 370 do CPP, os defensores nomeados, dentre os quais se incluem o defensor dativo, também passaram a possuir prerrogativas da intimação pessoal. Assim sendo, de acordo com o STF, há de se considerar inválido o trânsito em julgado de sentença penal condenatória se o advogado dativo foi intimado por meio de publicação no Diário de Justiça.
Lado outro, a intimação do defensor constituído, dos advogados do querelante e do assistente far-se-á por publicação no órgão incumbido da publicidade dos atos judiciais da comarca, incluindo, sob pena de nulidade, o nome do acusado. Se não houver órgão de publicação, pode ser feita diretamente pelo escrivão, por mandado ou via postal com comprovante de recebimento.
Na hipótese de intimação por meio de carta precatória, conta-se o prazo recursal a partir da data da intimação e não da juntada aos autos da carta precatória. 2
Quando a intimação ocorre por meio de publicação feita em fins de semana, o termo a quo para contagem do prazo recursal é o primeiro dia útil subsequente, consoante explicitado item acima.
As intimações realizadas por meio de diário eletrônico acontecem no primeiro dia útil subsequente à data da publicação, e não a partir do momento em que o acórdão impugnado se torna público, de acordo com o Superior Tribunal de Justiça.
Estando todos os interessados na intimação, realizados por ocasião da audiência, a intimação poderá ser feita pessoalmente (art. 372, CPP). Se houver decisão proferida na própria audiência, o prazo começa a fluir desse ato, se a ele estiverem presentes as partes. Logo, no Tribunal do Júri, como a sentença é publicada em plenário, estando presentes o acusado e seu defensor, assim como o órgão do MP, o termo inicial do prazo recursal será a data da sessão de julgamento. Se o acusado, opta por não comparecer, o prazo recursal para ele somente começará a fluir do momento em que for intimado da sessão.
Por fim, convém salientar que também é possível a intimação por hora certa no processo penal.
A ausência de defensor, devidamente intimado, à sessão de julgamento não implica, por si só, nulidade processual.
REFERÊNCIAS
- LIMA, RENATO BRASILEIRO DE. Manual de processo penal: volume único. 11. Ed. ver., ampl. e atual – São Paulo: Ed. Juspodivm, 2022.
- GRECO FILHO, Vicente. Manual de Processo Penal: 8. Ed. São Paulo: Saraiva.2010.
- OLIVEIRA E NETO, Massilon de Oliveira e Silva Neto, disponível em https://massilonneto.jusbrasil.com.br/artigos/121935043/processo-penal-descomplicado-1-3
Autora: Carolina Carvalhal Leite. Mestranda em Direito Penal. Especialista em Direito Penal e Processo Penal; e, Especialista em Ordem Jurídica e Ministério Público. Graduada em Direito pelo UniCeub – Centro Universitário de Brasília em 2005. Docente nas disciplinas de Direito Penal, Processo Penal e Legislação Extravagante em cursos de pós-graduação, preparatórios para concursos e OAB (1ª e 2ª fases). Ex-Servidora pública do Ministério Público Federal (Assessora-Chefe do Subprocurador-Geral da República na Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão – PFDC). Advogada inscrita na OAB/DF.
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Fonte: Gran Cursos Online