Conteúdo liberado – Informativo STJ Comentado – Revisão 2023.2 Civil e Processo Civil

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Informativo do STJ COMENTADO. Não paramos nem nas férias! Bora revisar o que de mais importante apareceu em 2023, em nossa parte 2 rumando para Direito Civil e Processo Civil.

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PROCESSO EM SEGREDO DE JUSTIÇA

Na execução de alimentos, não pode a genitora, na condição de representante legal, se sub-rogar nos direitos da credora, menor, sobre a prestação referente a alimentos in natura que aquela pagou em virtude da inadimplência do genitor/executado, devendo ajuizar ação própria.

Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 7/2/2023, DJe 9/2/2023. (Info 763)

1.1.                       Situação FÁTICA.

Em uma execução de alimentos, Craudete, mãe de Creide, pagou as refeições e alimentos in natura na escola e necessários ao sustento da menor em razão do inadimplemento do genitor e executado Creiton. Em razão disso, requereu a sub-rogação nos valores a receber da filha.

1.2.                       Análise ESTRATÉGICA.

1.2.1.                        Questão JURÍDICA.

CC/2002:

Art. 346. A sub-rogação opera-se, de pleno direito, em favor:

I – do credor que paga a dívida do devedor comum;

II – do adquirente do imóvel hipotecado, que paga a credor hipotecário, bem como do terceiro que efetiva o pagamento para não ser privado de direito sobre imóvel;

III – do terceiro interessado, que paga a dívida pela qual era ou podia ser obrigado, no todo ou em parte.

1.2.2.                        Possível a sub-rogação?

R: Nooops!!!!

Discute-se se há ilegalidade flagrante ou teratologia em decisão que decretou a prisão civil de genitor, por não ter adimplido integralmente sua obrigação alimentar.

No caso, a representante legal da infante pagou suas refeições em determinado período, obrigação descumprida pelo executado.

À luz da jurisprudência do STJ, a genitora, mesmo na condição de representante legal, na presente execução por via reflexa, não poderia se sub-rogar nos direitos da credora dos alimentos, cujo direito é PESSOAL e INTRANSFERÍVEL, não obstante o genitor tenha descumprido a obrigação alimentar, contida no título executivo judicial.

Seria necessário, com efeito, o ajuizamento de ação de conhecimento AUTÔNOMA, para que ela venha a obter o reembolso da referida despesa efetuada (adiantada) no período, porque não há que se falar em sub-rogação legal na hipótese em comento, diante da ausência das hipóteses do art. 346 do CC/2002.

Dessa forma, deve-se afastar o decreto de prisão civil do genitor, especificamente em relação aos referidos alimentos in natura, que foram pagos pela genitora da credora (como medida de proteção para a filha menor, que não poderia ficar sem refeição na escola), que devem ser objeto de ação de cobrança própria, sob o crivo do contraditório, não podendo ser realizada na presente execução.

1.2.3.                        Resultado final.

Na execução de alimentos, não pode a genitora, na condição de representante legal, se sub-rogar nos direitos da credora, menor, sobre a prestação referente a alimentos in natura que aquela pagou em virtude da inadimplência do genitor/executado, devendo ajuizar ação própria.

PROCESSO SOB SEGREDO DE JUSTIÇA

É possível a conversão da prisão civil em regime fechado, em virtude de dívida de natureza alimentar, para regime domiciliar quando a devedora de alimentos for responsável pela guarda de outro filho de até 12 anos de idade.

Processo sob segredo de justiça, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 7/2/2023. (Info 763)

2.1.                       Situação FÁTICA.

Craudinha foi presa e cumpria pena em regime fechado em razão do inadimplemento de prestações alimentícias devidas. Ocorre que ela também é mãe de Lurdinha, atualmente com 08 anos de idade, sendo também a única responsável pela menina. Em razão disso, sua defesa requereu a conversão do regime fechado para o domiciliar.

2.2.                       Análise ESTRATÉGICA.

2.2.1.                        Questão JURÍDICA.

Código de Processo Penal:

Art. 318.  Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for: 

V – mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos; 

2.2.2.                        Aplica-se o art. 318, V, do CPP prisão alimentícia?

R: Yeaph!!!!

Cinge-se a controvérsia a definir se a prisão civil da devedora de alimentos pode ser convertida, do regime fechado para o domiciliar, na hipótese em que tenha ela filho de até 12 anos de idade, aplicando-se, por analogia, o art. 318, V, do Código de Processo Penal.

Quanto ao ponto, é importante destacar, inicialmente, que se trata de regra introduzida à legislação processual penal por força da Lei nº 13.257/2016, que “Dispõe sobre as políticas públicas para a primeira infância”. Em razão dessa lei, foram alteradas inúmeras disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente.

O art. 318, V, do Código de Processo Penal, que se pretende seja aplicado por analogia à hipótese do devedor de alimentos, não é uma regra isoladamente criada com o fim específico de atender ao direito processual penal, mas, ao revés, compõe um conjunto de regras destinadas à promoção de uma política pública de proteção à primeira infância.

Uma das faces dessa ampla política pública diz respeito à relação entre os pais em situação de cárcere e os seus filhos, especialmente aqueles que ainda estão nos primeiros anos de vida, diante da necessidade do desenvolvimento infantil, da personalidade e do ser humano. Pretende-se, com esse conjunto de regras, minimizar os riscos e diminuir os efeitos naturalmente nocivos que o afastamento parental produz em relação aos filhos.

Tratando especificamente da regra do art. 318, V, do Código de Processo Penal, compreende a jurisprudência do STJ que “a concessão de prisão domiciliar às genitoras de menores de até 12 anos incompletos não está condicionada à comprovação da imprescindibilidade dos cuidados maternos, que é legalmente presumida”. Nesse sentido: AgRg no HC 731.648/SC, 5ª Turma, DJe 23/06/2022, HC 422.235/MS, 6ª Turma, DJe 19/12/2017 e HC 383.606/RJ, 6ª Turma, DJe 08/03/2018.

Trata-se, aliás, de entendimento que se alinha ao pretérito posicionamento do Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento do HC 143.641/SP, em que adequadamente se diagnosticou o problema do encarceramento das mães e os reflexos nocivos à vida dos filhos.

A presunção de necessidade de cuidado materno que justifica a prisão domiciliar das mães de filhos de até 12 anos, aliás, decorre da própria observação da realidade, em que o encarceramento atinge, sobremaneira, as mães solo, únicas responsáveis pela criação da prole.

Desse modo, se a finalidade essencial da regra do art. 318, V, do CPP, é a proteção integral da criança, minimizando-se as chances de ela ser criada no cárcere conjuntamente com a mãe ou colocada em família substituta ou em acolhimento institucional na ausência da mãe encarcerada, mesmo diante da hipótese de possível prática de um ilícito penal, não há razão para que essa mesma regra não se aplique às mães encarceradas em virtude de dívida de natureza alimentar, observada a necessidade de adaptação desse entendimento às particularidades dessa espécie de execução.

Nesse contexto, anote-se que a prisão domiciliar prevista no art. 318, V, do CPP, possui natureza de medida cautelar alternativa à prisão preventiva em regime fechado e tem por finalidade segregar a pessoa do convívio social, ao passo que a prisão em decorrência da dívida de natureza alimentar possui a natureza de medida coercitiva que tem por finalidade dobrar a renitência da devedora e compeli-la a adimplir rapidamente a obrigação em virtude da necessidade de suprimento das necessidades básicas do exequente.

Desse modo, não há dúvida de que, na hipótese de inadimplemento da dívida, deve haver a segregação da devedora de alimentos, com a finalidade de incomodá-la a ponto de buscar todos os meios possíveis de solver a obrigação, mas essa restrição ao direito de ir e vir deve ser compatibilizada com a necessidade de obter recursos financeiros aptos não apenas a quitar a dívida alimentar em relação ao exequente, mas também suprir as necessidades básicas do filho que se encontra sob a sua guarda.

2.2.3.                        Resultado final.

É possível a conversão da prisão civil em regime fechado, em virtude de dívida de natureza alimentar, para regime domiciliar quando a devedora de alimentos for responsável pela guarda de outro filho de até 12 anos de idade.

RECURSO ESPECIAL

A suspensão do cumprimento de sentença, em virtude da ausência de bens passíveis de excussão, por longo período de tempo, sem diligência por parte do credor, não configura supressio, de modo que não obsta a fluência dos juros e da correção monetária.

REsp 1.717.144-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 14/2/2023. (Info 765)

3.1.                       Situação FÁTICA.

Em uma execução movida pelo Banco Brasa em face de Creosvaldo, o tribunal local entendeu que a inação do exequente foi significativa na convicção de que o direito não mais se exerceria — isso porque o banco deixou o processo longo tempo parado enquanto não se achavam bens penhoráveis. Como consequência, o juizão excluiu do montante devido os juros e atualização monetária desde o momento da suspensão do feito.

Inconformado, o Banco interpôs sucessivos recursos sustentando não ser possível a configuração da supressio nas hipóteses em que, no processo de execução, o feito permanece suspenso por longo período de tempo em virtude da falta de bens passíveis de excussão.

3.2.                       Análise ESTRATÉGICA.

3.2.1.                        Questão JURÍDICA.

Código Civil:

Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.

3.2.2.                        Configurada a supressio?

R: Nooops!!!!

O Tribunal de origem, malgrado tenha afastado a prescrição intercorrente, ou seja, tenha reconhecido que a fluência do tempo não extinguira a pretensão do exequente, identificou que a inação do exequente foi significativa na convicção de que o direito não mais se exerceria. Como consequência, excluiu do montante devido os juros e atualização monetária desde o momento da suspensão do feito.

O instituto da supressio não se confunde com a extinção dos direitos, de exigência ou formativos, pela prescrição ou pela decadência, embora tais institutos tenham como ponto comum seu fundamento na necessidade de estabilização das relações jurídicas.

supressio consubstancia-se na impossibilidade de se exercer um direito por parte de seu titular em razão de seu não exercício por certo período variável de tempo e que, em razão dessa omissão, gera da parte contrária uma expectativa legítima de que não seria mais exigível. Portanto, pelo não exercício do direito passível de ser exercido por um lapso temporal – não determinável a priori – a outra parte da relação obrigacional confia que a situação se estabilizou e que não será compelida a cumpri-la, revelando-se, pois, certo abrandamento do princípio pacta sunt servanda, não mais tomado no sentido absoluto típico de sua formulação liberal.

Há, por conseguinte, um deslocamento do eixo meramente temporal e, em decorrência, subjetivamente indiferente, para a análise da omissão do credor distendida no tempo e do correlato efeito quanto à expectativa do devedor na preservação da estabilidade jurídica gerada por aquele comportamento. A omissão, portanto, ganha relevância jurídica ao provocar na outra parte a convicção de que o direito subjetivo não mais será exercido.

Portanto, para a configuração da supressio e a decorrente perda do direito subjetivo de exigência ou formativo, deve-se perquirir, concretamente, acerca da relevância jurídica da omissão da parte e de sua repercussão na convicção da outra parte, confiante de que o direito não será exercido. Torna-se patente, por conseguinte, que o instituto da supressio constitui fragmento do princípio da boa-fé objetiva, em sua feição limitadora de direitos e, por esse motivo, é tratado pela doutrina como o exercício inadmissível de direitos. Embora reconhecido pela jurisprudência antes mesmo de sua previsão normativa, atualmente o princípio da boa-fé objetiva tem assento no art. 422 do Código Civil.

Contrariamente, na prescrição – extinção da pretensão – e na decadência – extinção do direito potestativo ou formativo – não há que se indagar acerca da observância da boa-fé ou do dever de lealdade ou confiança, porquanto seu elemento operativo é a simples fluência do tempo legalmente determinado. Assim, independentemente da conduta do credor, o mero transcurso do tempo implicará a extinção do direito de seu titular.

Curiosamente, o desenvolvimento do instituto da supressio, como de outros relacionados à inadmissibilidade do exercício de direitos, liga-se exatamente ao fenômeno inflacionário e ao abrandamento do princípio do nominalismo, para, com fundamento na boa-fé em sua vertente objetiva, interferir no cumprimento das obrigações.

No caso presente, contudo, a supressio não tem aplicação, porquanto não se permite o reconhecimento de que a suspensão do processo de execução, em razão da inexistência de bens, tenha incutido no executado a expectativa legítima de que não seria mais exercido. Ora, o direito do exequente foi efetivamente exercido ao ajuizar a ação e ao ser dado início ao cumprimento da sentença transitada em julgado. Conquanto determinadas vicissitudes a que estão sujeitos os processos judiciais possam implicar delongas em seu desenvolvimento ou mesmo na concretização do direito das partes, tais circunstâncias não podem ser consideradas verdadeiramente significativas, de modo a qualificar uma omissão como relevante para a extinção do direito.

Em casos tais, o exequente permanece em uma situação de espera, e o elemento significativo para a circunstância da suspensão do processo – e o protraimento da concretização do direito reconhecido na sentença – não é sua omissão, mas a ausência de patrimônio passível de excussão para o adimplemento da obrigação. Infere-se, pois, que não se pode caracterizar a relevância jurídica da paralisação do processo como causa para a extinção do direito, integral ou parcialmente, pela ocorrência da supressio.

3.2.3.                        Resultado final.

A suspensão do cumprimento de sentença, em virtude da ausência de bens passíveis de excussão, por longo período de tempo, sem diligência por parte do credor, não configura supressio, de modo que não obsta a fluência dos juros e da correção monetária.

AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DECLARATÓRIOS NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL

O fato de o bem imóvel ter sido adquirido no curso da demanda executiva não afasta a impenhorabilidade do bem de família.

AgInt nos EDcl no AREsp 2.182.745-BA, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 18/4/2023. (Info 771)

4.1.                       Situação FÁTICA.

Em uma execução movida por Cobromesmo em face de Crementina, foi determinada a penhora do imóvel recém-adquirido por esta. Crementina alegou a impenhorabilidade do bem, tese acatada pelo juízo de primeiro grau.

Inconformada, Cobromesmo interpôs sucessivos recursos nos quais alega que houve violação da exceção prevista no art. 4º da Lei 8.009/90, referente à penhora sobre bem de família, uma vez que o imóvel fora adquirido pela devedora após ajuizada a ação de execução de origem.

4.2.                       Análise ESTRATÉGICA.

4.2.1.                        Questão JURÍDICA.

Lei n. 8.009/1990:

Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:

II – pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato;

III – pelo credor da pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida;                

IV – para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar;

V – para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar;

VI – por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.

VII – por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.                 

4.2.2.                        O fato de ser adquirido após o início da execução afasta a impenhorabilidade?

R: Nooops!!!!

As regras que estabelecem hipóteses de impenhorabilidade não são absolutas. O art. 3º da Lei n. 8.009/1990 prevê uma série de EXCEÇÕES à impenhorabilidade.

A aquisição do imóvel posteriormente à dívida não configura, por si só, fraude à execução, tampouco afasta proteção conferida ao bem de família (REsp 573.018/PR, relator Ministro Cesar Asfor Rocha, Quarta Turma, julgado em 9/12/2003, DJ 14/6/2004, p. 235, e REsp 1.792.265/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 14/12/2021, DJe 14/3/2022).

A regra de impenhorabilidade do bem de família trazida pela Lei n. 8.009/1990 deve ser examinada à luz do princípio da BOA FÉ OBJETIVA, que, além de incidir em todas as relações jurídicas, constitui diretriz interpretativa para as normas do sistema jurídico pátrio.

4.2.3.                        Resultado final.

O fato de o bem imóvel ter sido adquirido no curso da demanda executiva não afasta a impenhorabilidade do bem de família.

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL

A oferta voluntária de seu único imóvel residencial em garantia a um contrato de mútuo, favorecedor de pessoa jurídica em alienação fiduciária, não conta com a proteção irrestrita do bem de família.

EREsp 1.559.348-DF, Rel. Ministro Moura Ribeiro, Segunda Seção, por maioria, julgado em 24/5/2023. (Info 776)

5.1.                       Situação FÁTICA.

Creosvalda firmou um contrato de mútuo com o Banco Cobromesmo. Assessória ao contrato, foi lançada uma cédula de crédito bancário, assegurada por alienação fiduciária em garantia do único imóvel de Creosvalda.

Quanto o empréstimo não foi pago, o banco ajuizou execução cobrando os valores. Creosvalda contra-atacou com uma ação cautelar na qual alega a nulidade da alienação fiduciária e das cláusulas contratuais relacionadas a essa garantia. Tratar-se-ia de bem de família e os valores obtidos com o empréstimo não teriam sido revertidos em favor do imóvel ou em favor da unidade familiar.

5.2.                       Análise ESTRATÉGICA.

5.2.1.                        Proteção irrestrita do bem de família?

R: Não é bem assim!!!

A controvérsia diz respeito à impenhorabilidade do bem de família quando ocorrer a alienação fiduciária de imóvel em operação de empréstimo bancário.

Rememora-se que o bem de família e sua impenhorabilidade são regidos pela Lei n. 8.000/1990 (art. 1º). O instituto visa assegurar ao indivíduo um patrimônio mínimo, sendo também, expressão do princípio da dignidade da pessoa humana, consagrado no art. 1°, III, da Constituição Federal. Antes do advento da Lei n. 9.514/1997 (que criou o Sistema Financeiro Imobiliário e regulou o instituto da alienação fiduciária de imóvel), a principal garantia dos financiamentos envolvendo bens imóveis era a hipoteca. Por tal razão, a Lei n. 8.009/1990 somente dispôs sobre a hipoteca, prevendo a exceção do art. 3º, inciso V, que permitia a penhora de bem dado em hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar.

O STJ, ao interpretar referida norma, concluiu que, na hipótese de oferecimento de imóvel em garantia hipotecária, a impenhorabilidade do bem de família somente estará comprometida se a dívida objeto dessa garantia tiver sido assumida em benefício da própria entidade familiar (EAREsp 848.498/PR, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, DJe de 7/6/2018).

Por sua vez, o instituto da alienação fiduciária foi introduzido na legislação brasileira pela necessidade de superar a inadequação da garantia hipotecária, que depende do Poder Judiciário para a sua execução. Com o intuito de permitir maior celeridade no recebimento do crédito, ampliando a circulação de recursos e a realização de negócios, a Lei n. 9.514/1997 dispensou o ajuizamento de ação judicial, prevendo a consolidação da propriedade perante o oficial do Registro de Imóveis.

Segundo o rito previsto para o instituto, o devedor poderá purgar a mora no prazo fixado, convalescendo o contrato de alienação fiduciária (art. 25, § 5º, da Lei n. 9.514/1997), caso em que não se consolida a propriedade em favor do credor. Já na alienação fiduciária, não se discute a “impenhorabilidade” do bem, uma vez que a propriedade foi transmitida, ainda que em caráter resolúvel, pelos devedores. Cumpre-se verificar, isto sim, a “alienabilidade” do bem.

Nesse sentido, a Terceira Turma ao distinguir o bem de família legal (disciplinado na Lei n. 8.009/1990) e o bem de família voluntário (estabelecido pelo Código Civil, nos arts. 1.711 a 1.722), concluiu pela possibilidade de alienação fiduciária do bem de família legal: “a própria Lei n. 8.009/1990, com o escopo de proteger o bem destinado à residência familiar, aduz que o imóvel assim categorizado não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, mas em nenhuma passagem dispõe que tal bem não possa ser alienado pelo seu proprietário” (REsp 1.560.562/SC, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 2/4/2019, DJe de 4/4/2019).

Desse modo, não se afigura possível beneficiar aquele que, com reserva mental, ofereceu em garantia imóvel de sua propriedade, por meio de alienação fiduciária, a fim de obter recursos em contrato de mútuo sob condições mais favoráveis e, em momento posterior, após o inadimplemento da dívida, alega a invalidade do ato de disposição em razão da proteção conferida ao bem de família.

5.2.2.                        Resultado final.

A oferta voluntária de seu único imóvel residencial em garantia a um contrato de mútuo, favorecedor de pessoa jurídica em alienação fiduciária, não conta com a proteção irrestrita do bem de família.

RECURSO ESPECIAL

A despeito de não se exigir prova de abuso ou fraude para aplicação da Teoria Menor da desconsideração da personalidade jurídica, não é possível a responsabilização pessoal de sócio que não desempenhe atos de gestão, ressalvada a prova de que contribuiu, ao menos culposamente, para a prática de atos de administração.

REsp 1.900.843-DF, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino (in memorian), Rel. para acórdão Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por maioria julgado em 23/5/2023, DJe 30/5/2023. (Info 777)

6.1.                       Situação FÁTICA.

Crementino ajuizou execução em face de Impar Construtora. Como não foram encontrados bens em nome da empresa, requereu ao juízo a desconsideração da personalidade jurídica da empresa para atingir bens de todos os sócios.

Nirso, sócio da empresa que não desempenha atos de gestão, interpôs recurso contra a medida e alegou que figurou apenas como sócio formal da sociedade (detendo menos de 0,0001% do capital social), com o objetivo de viabilizar a constituição da sociedade por quotas de responsabilidade limitada, nunca tendo exercido cargos de administração ou recebido remuneração ou distribuição de lucros.

6.2.                       Análise ESTRATÉGICA.

6.2.1.                        Questão JURÍDICA.

CDC:

Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.

§ 5° Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.

Código Civil:

Art. 49-A.  A pessoa jurídica não se confunde com os seus sócios, associados, instituidores ou administradores. 

Parágrafo único. A autonomia patrimonial das pessoas jurídicas é um instrumento lícito de alocação e segregação de riscos, estabelecido pela lei com a finalidade de estimular empreendimentos, para a geração de empregos, tributo, renda e inovação em benefício de todos.

6.2.2.                        Possível a responsabilização do meramente sócio?

R: Somente se provado que contribuiu, ao menos culposamente, para a prática de atos de administração!!!

De acordo com a pacífica jurisprudência do STJ, para fins de aplicação da denominada Teoria Menor da desconsideração da personalidade jurídica, não se exige prova da fraude ou do abuso de direito, tampouco é necessária a prova de confusão patrimonial, bastando que o consumidor demonstre o estado de insolvência do fornecedor ou o fato de a personalidade jurídica representar um obstáculo ao ressarcimento dos prejuízos causados. Considerando que o § 5º do art. 28 do Código de Defesa do Consumidor – CDC, em virtude do mero inadimplemento e da ausência de bens suficientes à quitação do débito, admite, a princípio, a responsabilização pessoal do sócio, torna-se necessário investigar a atuação na condução dos negócios da empresa.

A rigor, a considerar as origens históricas da disregard doctrine, não se poderia afirmar que a hipótese contemplada no § 5º do art. 28 do CDC trata do mesmo instituto, a despeito das expressões utilizadas pelo legislador, tendo em vista que a desconsideração propriamente dita está necessariamente associada à fraude e ao abuso de direito, com desvirtuamento da função social da pessoa jurídica, criada com personalidade distinta da de seus sócios. Como bem acentua a doutrina, o instituto da desconsideração da personalidade jurídica é frequentemente confundido com hipóteses em que se atribui aos sócios, por mera opção legislativa, a responsabilidade ordinária por dívidas da sociedade.

No julgamento do REsp n. 1.766.093/SP, tratou-se da possibilidade da inclusão, no polo passivo de ação de rescisão contratual cumulada com pedido de restituição de valores pagos, já em fase de cumprimento de sentença, de membros do conselho fiscal de uma cooperativa habitacional, à luz do disposto no § 5º do art. 28 do CDC. Nesse julgado, tudo o que se disse a respeito das regras aplicáveis às sociedades cooperativas teve como único propósito fixar a premissa de que membros do conselho fiscal desse tipo de sociedade não praticam, em regra, atos de gestão, a exigir, por isso, a comprovação da presença de indícios de que estes contribuíram, ao menos culposamente, e com desvio de função, para a prática de atos de administração. Também destacou-se que, de acordo com a doutrina, ainda que seja possível considerar o § 5º do art. 28 do CDC como hipótese autônoma e independente daquelas previstas em seu caput, na linha do que já decidiu o STJ a desconsideração da personalidade jurídica, mesmo em tal hipótese, somente pode atingir pessoas incumbidas da gestão da empresa.

Assim, a denominada Teoria Menor da desconsideração da personalidade jurídica, de que trata o § 5º do art. 28 do CDC, a despeito de dispensar a prova de fraude, abuso de direito ou confusão patrimonial, não dá margem para admitir a responsabilização pessoal I) de quem não integra o quadro societário da empresa, ainda que nela atue como gestor, e II) de quem, embora ostentando a condição de sócio, não desempenha atos de gestão, independentemente de se tratar ou não de empresa constituída sob a forma de cooperativa.

Vale lembrar que a desconsideração, mesmo sob a vertente da denominada Teoria Menor, é uma EXCEÇÃO à regra da autonomia patrimonial das pessoas jurídicas, “instrumento lícito de alocação e segregação de riscos, estabelecido pela lei com a finalidade de estimular empreendimentos, para a geração de empregos, tributo, renda e inovação em benefício de todos” (art. 49-A do Código Civil, incluído pela Lei nº 13.874/2019), a justificar, por isso, a interpretação mais restritiva do art. 28, § 5º, do CDC.

6.2.3.                        Resultado final.

A despeito de não se exigir prova de abuso ou fraude para aplicação da Teoria Menor da desconsideração da personalidade jurídica, não é possível a responsabilização pessoal de sócio que não desempenhe atos de gestão, ressalvada a prova de que contribuiu, ao menos culposamente, para a prática de atos de administração.

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL

Não cabe condenação em danos morais coletivos em razão da exigência, pela instituição financeira, de tarifa bancária considerada indevida.

AgInt no AREsp 1.754.555-RN, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 28/8/2023, DJe 31/8/2023. (Info 786)

7.1.                       Situação FÁTICA.

O MP ajuizou ação contra o Banco OMG, visando à condenação da instituição financeira à devolução em dobro de valores reputados indevidamente recolhidos (comissão de permanência, Serviço de Proteção, Perda e Roubo de Cartão de Crédito, Tarifa de Confecção de Cadastro…) e ao pagamento de danos morais coletivos. O pedido foi julgado improcedente.

Inconformado, o MP interpôs sucessivos recursos nos quais insiste em afirmar que ficou caracterizado, na espécie, o dano moral coletivo em virtude das condutas praticadas pela instituição financeira.

7.2.                       Análise ESTRATÉGICA.

7.2.1.                        Sujou pro banco?

R: Nada!! Tá limpinho!!

Trata-se, na origem, de ação civil pública promovida pelo Ministério Público contra instituição financeira visando i) à abstenção da cobrança da comissão de permanência cumulada com outros encargos da mora e das Tarifas de Confecção de Cadastro e de Aditamento Contratual, ii) à vedação da prática de venda casada no tocante ao Serviço de Proteção, Perda e Roubo de Cartão de Crédito e iii) à condenação da instituição financeira à devolução em dobro dos valores indevidamente recolhidos e ao pagamento de danos morais coletivos.

Quanto à cobrança da denominada Tarifa de Confecção de Cadastro, aplica-se a tese firmada no julgamento do REsp 1.251.331/RS, submetido ao rito do art. 543-C do Código de Processo Civil de 1973: “Teses para os efeitos do art. 543-C do CPC: – 1ª Tese: Nos contratos bancários celebrados até 30.4.2008 (fim da vigência da Resolução CMN 2.303/96) era válida a pactuação das tarifas de abertura de crédito (TAC) e de emissão de carnê (TEC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador, ressalvado o exame de abusividade em cada caso concreto. – 2ª Tese: Com a vigência da Resolução CMN 3.518/2007, em 30/4/2008, a cobrança por serviços bancários prioritários para pessoas físicas ficou limitada às hipóteses taxativamente previstas em norma padronizadora expedida pela autoridade monetária. Desde então, não mais tem respaldo legal a contratação da Tarifa de Emissão de Carnê (TEC) e da Tarifa de Abertura de Crédito (TAC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador. Permanece válida a Tarifa de Cadastro expressamente tipificada em ato normativo padronizador da autoridade monetária, a qual somente pode ser cobrada no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira. – 3ª Tese: Podem as partes convencionar o pagamento do Imposto sobre Operações Financeiras e de Crédito (IOF) por meio de financiamento acessório ao mútuo principal, sujeitando-o aos mesmos encargos contratuais. 10. Recurso especial parcialmente provido” (REsp 1.251.331/RS, Rel. Ministra Maria Izabel Gallotti, Segunda Seção, julgado em 28/8/2013, DJe 24/10/2013).

Seguindo o mesmo raciocínio, também não há óbice à cobrança da Tarifa de Aditamento Contratual, porquanto prevista no art. 5º, II, da Resolução n. 3.919/2010, do Conselho Monetário Nacional, conforme consignado no acórdão recorrido.

No tocante aos danos morais coletivos, prevalece no STJ o entendimento de que “(…) a exigência de uma tarifa bancária considerada indevida não infringe valores essenciais da sociedade, tampouco possui os atributos da gravidade e intolerabilidade, configurando a mera infringência à lei ou ao contrato, o que é insuficiente para a caracterização do dano moral coletivo” (REsp 1.502.967/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 7/8/2018, DJe 14/8/2018).

7.2.2.                        Resultado final.

Não cabe condenação em danos morais coletivos em razão da exigência, pela instituição financeira, de tarifa bancária considerada indevida.

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL

Mesmo quando o devedor aliena o imóvel que lhe sirva de residência, deve ser mantida a cláusula de impenhorabilidade.

AgInt no AREsp 2.174.427-RJ, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 18/9/2023, DJe 20/9/2023. (Info 791)

8.1.                       Situação FÁTICA.

Em uma execução fiscal movida pela União em face de Jaiminho, Crementino ajuizou embargos de terceiro para afastar a penhora realizada sobre seu imóvel, sob o argumento da impenhorabilidade do bem de família.

Por sua vez, a Fazenda sustenta que o devedor alienou o imóvel em questão, o que retiraria a proteção da impenhorabilidade.

8.2.                       Análise ESTRATÉGICA.

8.2.1.                        Permanece a impenhorabilidade?

R: Aparentemente, SIM!!!

As Turmas integrantes da Primeira Seção firmaram a tese segundo a qual, mesmo que o devedor aliene imóvel que sirva de residência sua e de sua família, deve ser mantida a cláusula de impenhorabilidade, porque o imóvel em questão seria imune aos efeitos da execução, não havendo falar em fraude à execução na espécie.

Nesse sentido:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL.FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL. BEM DE FAMÍLIA. ALIENAÇÃO DE BEM IMÓVEL. MANUTENÇÃO DA CLÁUSULA DE IMPENHORABILIDADE. 1. Mesmo quando o devedor aliena o imóvel que lhe sirva de residência, deve ser mantida a cláusula de impenhorabilidade porque imune aos efeitos da execução; caso reconhecida a invalidade do negócio, o imóvel voltaria à esfera patrimonial do devedor ainda como bem de família. 2. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no REsp 1.719.551/RS, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 21/5/2019, DJe 30/5/2019).

8.2.2.                        Resultado final.

Mesmo quando o devedor aliena o imóvel que lhe sirva de residência, deve ser mantida a cláusula de impenhorabilidade.

RECURSO ESPECIAL

O reconhecimento da prescrição da pretensão impede tanto a cobrança judicial quanto a cobrança extrajudicial do débito.

REsp 2.088.100-SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 17/10/2023. (Info 792)

9.1.                       Situação FÁTICA.

Creiton era devedor da empresa Cobromesmo. Apesar das cobranças, nunca pagou o devido. O tempo passou e ocorreu a prescrição do crédito. Mesmo assim, Cobromesmo continuou a cobrar Creiton, daí em diante por meio de empresa de recuperação de créditos. Além de ter seu nome inscrito no cadastro de inadimplentes, Creiton era cobrado por SMS e mensagens de WhatsApp.

 A sentença entendeu legal a cobrança, mas o Tribunal local reformou a decisão por entender que a prescrição da dívida tornaria inexigível a cobrança, seja judicial ou extrajudicial.

9.2.                       Análise ESTRATÉGICA.

9.2.1.                        Questão JURÍDICA.

Código Civil de 2002:

Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.

Art. 882. Não se pode repetir o que se pagou para solver dívida prescrita, ou cumprir obrigação judicialmente inexigível.

R: Yeap!!!!

Para o deslinde da controvérsia, é necessário que se examine a atuação da prescrição no plano da eficácia, o que perpassa, inicialmente, pela distinção entre os conceitos de direito subjetivo e de pretensão, pois, somente esta é, propriamente, atingida pela prescrição.

Segundo a doutrina, a pretensão é o poder de exigir um comportamento positivo ou negativo da outra parte da relação jurídica. Observa-se, desse modo, que, antes do advento da pretensão, já existe direito e dever, mas em situação estática. Isso porque a dinamicidade do direito subjetivo surge, tão somente, com o nascimento da pretensão, que pode ser ou não concomitante ao surgimento do próprio direito subjetivo. Somente a partir desse momento, o titular do direito poderá exigir do devedor que cumpra aquilo a que está obrigado.

No que diz respeito ao seu modo de atuação, restou demonstrado que a prescrição não atingiria a ação, mas sim a pretensão, o que representou fundamental virada dogmática com reflexos não só na nomenclatura, mas, sobretudo, na essência do instituto. Na doutrina brasileira, era relativamente comum, antes do advento do Código Civil de 2002, e em alguns casos, até mesmo, depois de sua entrada em vigor -, se apontar como alvo da eficácia da prescrição a própria ação.

No entanto, o art. 189 do Código Civil de 2002, que representou importante inovação legislativa em face do direito anterior, acolheu a novel construção doutrinária ao estabelecer, expressamente, que o alvo da prescrição é mesmo a pretensão, instituto de direito material. Dessa forma, a doutrina defende que “eventuais projeções ao direito de ação (em sentido processual) só se justificam de modo reflexo.” Isso porque, sendo a pretensão e a ação em sentido material encobertas pela prescrição, o seu titular não pode se servir dos remédios processuais da ação em sentido processual.

A doutrina adverte que “a consequência processual de não poder se servir da ‘ação’, no entanto, não tem o condão de explicar o instituto. Trata-se de um resultado decorrente de uma prévia eficácia que se sucedeu no direito material”. Nessa esteira de intelecção, não se pode olvidar, ainda, que a “pretensão se submete ao princípio da indiferença das vias, isto é, pode ser exercida tanto judicial, quanto extrajudicialmente“.

Nesse sentido, ao cobrar extrajudicialmente o devedor, o credor está, efetivamente, exercendo sua pretensão, ainda que fora do processo. Se a pretensão é o poder de exigir o cumprimento da prestação, uma vez paralisada em razão da prescrição, não será mais possível exigir o referido comportamento do devedor, ou seja, não será mais possível cobrar a dívida. Logo, o reconhecimento da prescrição da pretensão impede tanto a cobrança judicial quanto a cobrança extrajudicial do débito.

Não há, portanto, duas pretensões, uma veiculada por meio do processo e outra veiculada extrajudicialmente. Independentemente do instrumento utilizado, trata-se da mesma pretensão, haurida do direito material. É a pretensão e não o direito subjetivo que permite a exigência da dívida. Uma vez prescrita, resta impossibilitada a cobrança da prestação. Nessas situações, não há que se falar em pagamento indevido, nem sequer em enriquecimento sem causa, nos termos do art. 882 do Código Civil, uma vez que o direito subjetivo (crédito) continua a existir. O que não há, de fato, é a possibilidade de exigí-lo.

9.2.3.                        Resultado final.

O reconhecimento da prescrição da pretensão impede tanto a cobrança judicial quanto a cobrança extrajudicial do débito.

RECURSO ESPECIAL

É obrigatória a cobertura, pela operadora do plano de saúde, de cirurgias de transgenitalização e de plástica mamária com implantação de próteses em mulher transexual.

REsp 2.097.812-MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 21/11/2023, DJe 23/11/2023. (Info 798)

10.1.                   Situação FÁTICA.

Laurete, mulher transsexual, ajuizou ação em face da operadora de seu plano de saúde, Unimais, pretendendo a cobertura de cirurgias de transgenitalização e de inclusão de próteses mamárias.

Unimais contesta o pedido e recorre da condenação sob o argumento de que o procedimento de mudança de sexo seria experimental, sendo, inclusive, disponibilizado pelo SUS em caráter experimental, bem como que a cirurgia plástica mamária possuiria cobertura somente para tratamento de câncer – o que não é o caso em tela, em que Laurete apenas pleiteia o implante de prótese mamaria estética. Por fim, sustenta que o procedimento não está previsto no rol da ANS, que tem natureza taxativa.

10.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

10.2.1.                    Questão JURÍDICA.

Lei n. 9.656/1998:

Art. 10.  É instituído o plano-referência de assistência à saúde, com cobertura assistencial médico-ambulatorial e hospitalar, compreendendo partos e tratamentos, realizados exclusivamente no Brasil, com padrão de enfermaria, centro de terapia intensiva, ou similar, quando necessária a internação hospitalar, das doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde, respeitadas as exigências mínimas estabelecidas no art. 12 desta Lei, exceto: (

I – tratamento clínico ou cirúrgico experimental; 

II – procedimentos clínicos ou cirúrgicos para fins estéticos, bem como órteses e próteses para o mesmo fim;

III – inseminação artificial;

 IV – tratamento de rejuvenescimento ou de emagrecimento com finalidade estética;

V – fornecimento de medicamentos importados não nacionalizados;

VI – fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar, ressalvado o disposto nas alíneas ‘c’ do inciso I e ‘g’ do inciso II do art. 12;     

VII – fornecimento de próteses, órteses e seus acessórios não ligados ao ato cirúrgico; 

IX – tratamentos ilícitos ou antiéticos, assim definidos sob o aspecto médico, ou não reconhecidos pelas autoridades competentes;

X – casos de cataclismos, guerras e comoções internas, quando declarados pela autoridade competente.

10.2.2.                    Cobertura obrigatória?

R: Aparentemente, SIM!!!

Os procedimentos de afirmação de gênero do masculino para o feminino são reconhecidos pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) e foram também incorporados ao SUS, com indicação para o processo transexualizador, constando, inclusive, na tabela de procedimentos, medicamentos, órteses, próteses e materiais especiais do SUS, vinculados ao CID 10 F640 – transexualismo (atual CID 11 HA60 – incongruência de gênero), não se tratando, pois, de procedimentos experimentais.

Os procedimentos que integram a redesignação sexual no sexo masculino e a plástica mamária incluindo prótese, descritos na Portaria 2.803/2013 do Ministério da Saúde, constam do anexo I do rol de procedimentos e eventos em saúde da ANS (Resolução ANS 465/2021), sem diretrizes de utilização, a saber: orquiectomia, amputação total do pênis, neovagina, reconstrução da mama com prótese, dentre outros.

No processo transexualizador, a cirurgia plástica mamária reconstrutiva bilateral incluindo prótese mamária de silicone é procedimento que, muito antes de melhorar a aparência, visa à afirmação do próprio gênero, incluída no conceito de saúde integral do ser humano, enquanto medida de prevenção ao adoecimento decorrente do sofrimento causado pela incongruência de gênero, pelo preconceito e pelo estigma social vivido por quem experiencia a inadequação de um corpo masculino à sua identidade feminina.

Tratando-se de procedimentos cirúrgicos prescritos pelo médico assistente, que não se enquadram nas exceções do art. 10 da Lei n. 9.656/1998, que são reconhecidos pelo CFM e foram incorporados ao SUS para a mesma indicação clínica (CID 10 F640 – transexualismo, atual CID 11 HA60 – incongruência de gênero), e que estão listados no rol da ANS sem diretrizes de utilização, encontram-se satisfeitos os pressupostos que impõem à operadora do plano de saúde a obrigação de sua cobertura, conforme preconizado no projeto terapêutico singular norteado por protocolos e diretrizes vigentes para o processo transexualizador.

A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que o descumprimento contratual por parte da operadora de saúde, que culmina em negativa de cobertura para procedimento médico-hospitalar, enseja compensação por dano moral quando houver agravamento da condição de dor, abalo psicológico ou prejuízos à saúde já debilitada da paciente.

10.2.3.                    Resultado final.

É obrigatória a cobertura, pela operadora do plano de saúde, de cirurgias de transgenitalização e de plástica mamária com implantação de próteses em mulher transexual.

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL

Em caso de dissolução, por decisão judicial, da associação autora de ação civil pública, é possível a substituição processual pelo Ministério Público.

AgInt no REsp 1.582.243-SP, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 14/2/2023. (Info 764)

11.1.                   Situação FÁTICA.

ANADEC (Associação Nacional de Defesa do Consumidor) ajuizou ACP contra Fiado Consórcios para declarar a nulidade de cláusula supostamente abusiva existente nos contratos de desta.

Enquanto o processo seguia, A ANADEC teve sua dissolução determinada judicialmente. Fiado então requereu o provimento de recurso para acolher a preliminar de ilegitimidade passiva da autora. A ANADEC, por sua vez, requereu a intimação do MP para que se habilitasse como substituto processual no feito.

11.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

11.2.1.                    Questão JURÍDICA.

Lei de Ação Civil Pública:

Art. 5o  Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar:

§ 3º Em caso de desistência infundada ou abandono da ação por associação legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa.

Lei n. 4.717/65:

Art. 9º Se o autor desistir da ação ou der motiva à absolvição da instância, serão publicados editais nos prazos e condições previstos no art. 7º, inciso II, ficando assegurado a qualquer cidadão, bem como ao representante do Ministério Público, dentro do prazo de 90 (noventa) dias da última publicação feita, promover o prosseguimento da ação.

Lei n. 7.347/85:

Art. 5o  Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar

§ 3º Em caso de desistência infundada ou abandono da ação por associação legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa.

11.2.2.                    Possível a substituição pelo MPE?

R: Yeaph!!!!

Cinge-se a controvérsia a determinar a possibilidade de interpretação extensiva do art. 5º, § 3º, da Lei de Ação Civil Pública (LACP) no caso em que a associação que ajuizara a ação é dissolvida por decisão judicial em que se reconhece a ausência de representatividade adequada e o desvio de finalidade, permitindo-se a sua substituição pelo Ministério Público.

Como não cabe ao intérprete estabelecer distinções onde a própria lei não distinguiu, é IRRELEVANTE ao deferimento da substituição processual a circunstância de a associação haver sido extinta por decisão judicial. Nesse sentido, também o STJ já deixou claro que “se o dispositivo não restringiu, não pode o aplicador do direito interpretar a norma a ponto de criar uma restrição nela não prevista” (REsp 1.113.175/DF, Rel. Ministro Castro Meira, Corte Especial, julgado em 24/5/2012, DJe 7/8/2012). O que importa é que tanto nos casos de desistência infundada ou de abandono da ação quanto na hipótese de extinção da associação por decisão judicial, o objetivo legítimo consiste em não deixar desprotegidas as pessoas que de fato tinham o interesse naquela tutela e até então eram substituídas pela associação. Assim sendo, o fundamento para o deferimento da substituição processual não depende de se tratar de desistência infundada ou de abandono da ação, mas, sim, da necessidade de proteger os consumidores.

Nesse sentido, “consoante previsão dos arts. 9º da Lei n. 4.717/65 e 5º, § 3º, da Lei n. 7.347/85, tendo ocorrido a dissolução da autora coletiva originária, deve ser possibilitado aos outros legitimados coletivos a assunção do polo ativo, como forma de se privilegiar a coletividade envolvida no processo e a economia dos atos processuais” (REsp 1.800.726/MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 2/4/2019, DJe 4/4/2019).

11.2.3.                    Resultado final.

Em caso de dissolução, por decisão judicial, da associação autora de ação civil pública, é possível a substituição processual pelo Ministério Público.

CONFLITO DE COMPETÊNCIA

Cabe à Justiça comum estadual e/ou distrital processar e julgar as demandas oriundas de ações de repactuação de dívidas decorrentes de superendividamento, ainda que exista interesse de ente federal.

CC 193.066-DF, Relator Ministro Marco Buzzi, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 22/3/2023. (Info 768)

12.1.                   Situação FÁTICA.

Ezequiel ajuizou ação de repactuação de dívidas em razão de superendividamento contra vários bancos, dentre eles, a CEF.  O juízo federal, a quem inicialmente distribuída a demanda, declinou da competência sob o fundamento de falta de interesse da União.

Por sua vez, o juízo estadual suscitou conflito de competência por entender que a presença de empresa pública (CEF) implicaria no interesse da União e consequente competência da Justiça Federal.

12.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

12.2.1.                    Questão JURÍDICA.

Código de Defesa do Consumidor:

Art. 104-A. A requerimento do consumidor superendividado pessoa natural, o juiz poderá instaurar processo de repactuação de dívidas, com vistas à realização de audiência conciliatória, presidida por ele ou por conciliador credenciado no juízo, com a presença de todos os credores de dívidas previstas no art. 54-A deste Código, na qual o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, e as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas.

Constituição Federal:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

I – as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;

12.2.2.                    A quem compete julgar?

R: Justiça ESTADUAL!!!!

A discussão que abrange o presente caso consiste na declaração do juízo competente para processar e julgar ação de repactuação de dívidas por superendividamento do consumidor em que é parte, além de outras instituições financeiras privadas, a Caixa Econômica Federal.

A Lei n. 14.181/2021, ao alterar o Código de Defesa do Consumidor, cuidou especificamente do instituto da repactuação de dívidas por superendividamento, a saber: o juiz, a requerimento do devedor, poderá instaurar processo de repactuação de dívidas, tutelado pelo art. 104-A e seguintes da legislação consumerista, com vistas à realização de audiência conciliatória, presidida por ele ou por conciliador credenciado, com a presença de todos os credores de dívidas, oportunidade em que o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o mínimo existencial, as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas.

Em interpretação do art. 109, I, da Constituição Federal, que trata da competência dos juízes federais, o Supremo Tribunal Federal (STF), na oportunidade do julgamento do RE 678162, relator para acórdão Ministro Edson Fachin, DJe 13/5/2021, firmou tese no sentido de que “a insolvência civil está entre as exceções da parte final do art. 109, I, da Constituição da República, para fins de definição da competência da Justiça Federal“.

Anota-se que, uma vez identificada a existência de concurso de credores, excepciona-se a competência da Justiça Federal prevista no art. 109, I, da Constituição Federal. Tal circunstância decorre da redação do art. 104-A do CDC, introduzido pela Lei n. 14.181/2021, que estabelece a previsão de que, para instaurar o processo de repactuação de dívidas, impõe-se a presença, perante o juízo, de todos os credores do consumidor superendividado, a fim de que este possa propor àqueles o respectivo plano de pagamentos de seus débitos.

De fato, o procedimento judicial relacionado ao superendividamento, tal como o de recuperação judicial ou falência, possui inegável e nítida natureza concursal, de modo que as empresas públicas federais, excepcionalmente, sujeitam-se à competência da Justiça estadual e/ou distrital, justamente em razão da existência de concursalidade entre credores, impondo-se, dessa forma, a concentração, na Justiça comum estadual, de todos os credores, bem como o próprio consumidor para a definição do plano de pagamento, suas condições, o seu prazo e as formas de adimplemento dos débitos.

Eventual desmembramento ensejará notável prejuízo ao devedor (consumidor vulnerável, reitere-se), porquanto, consoante dispõe a própria legislação de regência (art. 104-A do CDC), todos os credores devem participar do procedimento, inclusive na oportunidade da audiência conciliatória. Caso tramitem separadamente, em jurisdições diversas, federal e estadual, estaria maculado o objetivo primário da Lei do Superendividamento, qual seja, o de conferir a oportunidade do consumidor – perante seus credores – de apresentar plano de pagamentos a fim de quitar suas dívidas/obrigações contratuais. Haverá o risco de decisões conflitantes entre os juízos acerca dos créditos examinados, em violação ao comando do art. 104-A do CDC.

Assim, adota-se a compreensão segundo a qual cabe à Justiça comum estadual e/ou distrital analisar as demandas cujo fundamento fático e jurídico possuem similitude com a insolvência civil – como é a hipótese do superendividamento -, ainda que exista interesse de ente federal. A exegese do art. 109, I, da Constituição Federal, deve ser teleológica de forma a alcançar, na exceção da competência da Justiça Federal, as hipóteses em que existe o concurso de credores.

12.2.3.                    Resultado final.

Cabe à Justiça comum estadual e/ou distrital processar e julgar as demandas oriundas de ações de repactuação de dívidas decorrentes de superendividamento, ainda que exista interesse de ente federal.

PROCESSO SOB SEGREDO DE JUSTIÇA

Não compete ao juízo estatal, em execução de título executivo extrajudicial que contenha cláusula compromissória ajuizada por credor sub-rogado, analisar questões alusivas às disposições do contrato em si, o que deve ser discutido na jurisdição arbitral.

Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Moura Ribeiro, Rel. para acórdão Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por maioria, julgado em 11/4/2023. (Info 770)

13.1.                   Situação FÁTICA.

A empresa Pagonada firmou um contrato com a empresa Quebradeira. No contrato, havia cláusula arbitral que previa arbitragem em caso de inadimplência de uma das partes. Dito e feito! A arbitragem foi necessária e o árbitro entendeu que a empresa Quebradeira deu causa ao inadimplemento. Com a sentença arbitral favorável em mãos, a empresa Pagonada ajuizou ação de execução de título extrajudicial, mas Quebradeira contesta a decisão em juízo requerendo inclusive a análise de questões alusivas às disposições do contrato em si.

13.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

13.2.1.                    Questão JURÍDICA.

Lei n. 9.307/1996:

Art. 8º A cláusula compromissória é autônoma em relação ao contrato em que estiver inserta, de tal sorte que a nulidade deste não implica, necessariamente, a nulidade da cláusula compromissória.

Parágrafo único. Caberá ao árbitro decidir de ofício, ou por provocação das partes, as questões acerca da existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha a cláusula compromissória.

CPC/2015:

Art. 919. Os embargos à execução não terão efeito suspensivo.

§ 1º O juiz poderá, a requerimento do embargante, atribuir efeito suspensivo aos embargos quando verificados os requisitos para a concessão da tutela provisória e desde que a execução já esteja garantida por penhora, depósito ou caução suficientes.

13.2.2.                    Pode o juízo estatal analisar tais questões?

R: Nooooops!!!!!

De início, é relevante anotar que, salvo situações excepcionais de manifesta ilegalidade (cláusula patológica), é da jurisdição arbitral a atribuição para apreciar as controvérsias em torno da validade e dos efeitos da cláusula inserida pelas partes nos negócios jurídicos que formalizam.

Entretanto, no caso de execução, no julgamento do REsp 1.373.710/MG, esta Turma assentou que a existência de cláusula de arbitragem não pode impedir a execução de título extrajudicial perante a Justiça, justamente porque esta é a única competente para o exercício de medidas que visem à expropriação de bens do devedor.

Sendo assim, mostra-se correta a iniciativa de credora sub-rogada que ajuizou a execução do título perante o Poder Judiciário, pois outro modo não haveria de receber seu crédito na hipótese de renitência no cumprimento voluntário das obrigações contratuais.

Assim, a execução de título executivo que contenha cláusula compromissória por credor sub-rogado deve ser processada na jurisdição estatal, que, contudo, não tem competência para analisar as questões alusivas às disposições do contrato em si invocadas em embargos à execução.

Nessas situações, cabe ao executado que pretende questionar a própria exequibilidade do título dar início ao procedimento arbitral respectivo, nos termos do art. 8º, parágrafo único, da Lei n. 9.307/1996.

Não pode haver discussão, no processo executivo e em seus respectivos embargos, acerca da sub-rogação ou não da cláusula de arbitragem, pois as questões ligadas à sua validade e aos seus efeitos perante a exequente devem ser discutidas na jurisdição adequada, que seria a arbitral.

Caso julgue necessário, a embargante pode pleitear, perante o juízo, e desde que atendidos os requisitos legais (como, por exemplo, o oferecimento de garantia – art. 919, § 1º, do CPC/2015), a suspensão da execução até que as questões relativas à avença sejam definidas na jurisdição competente.

13.2.3.                    Resultado final.

Não compete ao juízo estatal, em execução de título executivo extrajudicial que contenha cláusula compromissória ajuizada por credor sub-rogado, analisar questões alusivas às disposições do contrato em si, o que deve ser discutido na jurisdição arbitral.

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL

Na hipótese de execução de dívida de natureza não alimentar, é possível a penhora de salário, ainda que este não exceda 50 salários mínimos, quando garantido o mínimo necessário para a subsistência digna do devedor e de sua família.

EREsp 1.874.222-DF, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Corte Especial, por maioria, julgado em 19/4/2023. (Info 771)

14.1.                   Situação FÁTICA.

Em uma execução na qual se cobrava dívida de natureza não alimentar, Craudio requereu a penhora de parte do salário de Nirso, tendo em vista que as demais medidas executivas se mostraram vãs.

Foi deferida a penhora do salário de Nirso no percentual de 30%. Inconformado, o devedor interpôs sucessivos recursos nos qual alega que o ato constritivo agrediria a garantia do executado e de seu núcleo essencial.

14.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

14.2.1.                    Questão JURÍDICA.

CPC/2015:

Art. 833. São impenhoráveis:

§ 2º O disposto nos incisos IV e X do caput não se aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, bem como às importâncias excedentes a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais, devendo a constrição observar o disposto no art. 528, § 8º , e no art. 529, § 3º .

14.2.2.                    Possível a penhora do salário?

R: Como diria o Prof. Raimundo: “E o salário, oh!”

A divergência reside em definir se, na hipótese de pagamento de dívida de natureza não alimentar, a impenhorabilidade está condicionada apenas à garantia do mínimo necessário para a subsistência digna do devedor e de sua família ou se, além disso, há que ser observado o limite mínimo de 50 salários-mínimos recebidos pelo devedor.

De precedente da Corte Especial deste Superior Tribunal de Justiça (EREsp 1.518.169/DF, Rel. Ministro Humberto Martins, Rel. para acórdão Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, julgado em 3/10/2018, DJe 27/2/2019), é possível extrair que a exegese do dispositivo processual (art. 649, IV, do CPC/1973) deve ser orientada também pela teoria do mínimo existencial, admitindo a penhora da parcela salarial excedente ao que se pode caracterizar como notadamente alimentar. Prosseguindo e lançando o olhar sobre o critério previsto no § 2º do art. 833 do CPC/2015 – na parte alusiva às importâncias excedentes a 50 salários mínimos mensais – salientou-se o descompasso do critério legal com a realidade brasileira, a implicar na sua ineficácia.

Ao suprimir a palavra “absolutamente” no caput do art. 833, o novo Código de Processo Civil passa a tratar a impenhorabilidade como relativa, permitindo que seja atenuada à luz de um julgamento principiológico, em que o julgador, ponderando os princípios da menor onerosidade para o devedor e da efetividade da execução para o credor, conceda a tutela jurisdicional mais adequada a cada caso, em contraponto a uma aplicação rígida, linear e inflexível do conceito de impenhorabilidade.

Esse juízo de ponderação entre os princípios simultaneamente incidentes na espécie há de ser solucionado à luz da dignidade da pessoa humana, que resguarda tanto o devedor quanto o credor, e mediante o emprego dos critérios de RAZOABILIDADE e PROPORCIONALIDADE.

A fixação desse limite de 50 salários mínimos merece críticas, na medida em que se mostra muito destoante da realidade brasileira, tornando o dispositivo praticamente inócuo, além de não traduzir o verdadeiro escopo da impenhorabilidade, que é a manutenção de uma reserva digna para o sustento do devedor e de sua família. Segundo a doutrina, “Restringir a penhorabilidade de toda a ‘verba salarial’ ou apenas permití-la no que exceder cinquenta salários mínimos, mesmo quando a penhora de uma parcela desse montante não comprometa a manutenção do executado, pode caracterizar-se como aplicação inconstitucional da regra, pois prestigia apenas o direito fundamental do executado, em detrimento do direito fundamental do exequente”.

Portanto, mostra-se possível a relativização do § 2º do art. 833 do CPC/2015, de modo a se autorizar a penhora de verba salarial inferior a 50 salários mínimos, em percentual condizente com a realidade de cada caso concreto, desde que assegurado montante que garanta a dignidade do devedor e de sua família.

Importante salientar, porém, que essa relativização reveste-se de caráter EXCEPCIONAL e dela somente se deve lançar mão quando restarem inviabilizados outros meios executórios que garantam a efetividade da execução e, repita-se, desde que avaliado concretamente o impacto da constrição sobre os rendimentos do executado.

14.2.3.                    Resultado final.

Na hipótese de execução de dívida de natureza não alimentar, é possível a penhora de salário, ainda que este não exceda 50 salários mínimos, quando garantido o mínimo necessário para a subsistência digna do devedor e de sua família.

RECURSO ESPECIAL

Em respeito ao princípio da não surpresa, é vedado ao julgador decidir com base em fundamentos jurídicos não submetidos ao contraditório no decorrer do processo.

REsp 2.049.725-PE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 25/4/2023. (Info 772)

15.1.                   Situação FÁTICA.

Em uma ação que tratava da legalidade de um Decreto Municipal que deu denominação a uma área de proteção ambiental, Creiton, proprietário de parte da área, alega que esse negócio de mera denominação é balela e que houve, na verdade, desapropriação indireta.

Segundo o Creiton, o processo não andou direito, tendo havido lesão ao princípio da não-surpresa. Por quê? Ora, não se teria conferido a ele a possibilidade questionar o ato (deu denominação à área de proteção ambiental) e demandar a ponderação do argumento e construção de contra-argumento no pleno exercício do contraditório e da ampla defesa. Teria havido decisão com base em argumento não submetido ao contraditório.

15.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

15.2.1.                    Questão JURÍDICA.

CPC:

Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.

Art. 933. Se o relator constatar a ocorrência de fato superveniente à decisão recorrida ou a existência de questão apreciável de ofício ainda não examinada que devam ser considerados no julgamento do recurso, intimará as partes para que se manifestem no prazo de 5 (cinco) dias.

15.2.2.                    Houve violação ao princípio da não surpresa?

R: E como…

O argumento fático novo apresentado em sustentação oral, em segunda instância, foi a alegação de que a Lei municipal n. 17.337/2017, ato administrativo concreto, com roupagem de lei formal, que tão somente deu uma denominação a uma área de proteção ambiental, significou reconhecimento municipal da ocorrência da desapropriação indireta.

Vê-se, então, que não foi apenas a alegação em plenário de fundamento legal novo, mas sim de construção argumentativa com conclusão de postura municipal de reconhecimento administrativo de realização de desapropriação indireta, tudo com base em fato jurídico apresentado de forma surpreendente, sem prévia possibilidade, com antecedência devida, de ponderação do argumento e construção de contra-argumento no pleno exercício do contraditório e da ampla defesa.

Tal lei em sentido material configura, de forma inequívoca, um ato administrativo que apenas deu nova denominação à área de proteção ambiental em epígrafe, com característica essencialmente individual, referindo-se a imóvel específico e determinado, não regulamentando, assim, eventuais e futuras relações jurídicas de forma geral e impessoal, particularidades essenciais para caracterizá-lo como fundamento legal.

Dessarte, de acordo com o art. 933, em sintonia com o art. 10, todos do CPC, veda-se a decisão-surpresa no âmbito dos tribunais, tendo decidido de forma acertada, o Tribunal de origem, no sentido de abrir vista às partes para que possam manifestar-se, em respeito ao devido processo legal.

Nesse diapasão, o entendimento jurídico adotado no STJ é no sentido de respeito ao princípio da não surpresa, o qual ensina que é vedado ao julgador decidir com base em fundamentos jurídicos não submetidos ao contraditório no decorrer do processo, com fulcro no art. 10 do CPC.

Dessa forma, é necessária a observância da cooperação processual nas relações endoprocessuais e do direito à legítima confiança de que o resultado do processo seja decorrente de fundamentos previamente conhecidos e debatidos pelas partes litigantes.

15.2.3.                    Resultado final.

Em respeito ao princípio da não surpresa, é vedado ao julgador decidir com base em fundamentos jurídicos não submetidos ao contraditório no decorrer do processo.

RECURSO ESPECIAL

A competência para julgamento de ação de indenização por danos morais, decorrente de ofensas proferidas em rede social, é do foro do domicílio da vítima, em razão da ampla divulgação do ato ilícito.

REsp 2.032.427-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 27/4/2023, DJe 4/5/2023. (Info 774)

1.1.                       Situação FÁTICA.

Creosvaldo ofendeu Crementina em uma rede social. Inconformada, Crementina ajuizou ação por meio da qual pretendia a condenação de Creosvaldo ao pagamento de danos morais. A ação foi ajuizada no foro do domicílio de Crementina, mas o juízo local entendeu que a competência seguiria a regra geral do art. 46 do CPC, que prevê que as ações devem ser propostas no foro do domicílio do réu.

1.2.                       Análise ESTRATÉGICA.

1.2.1.                        Questão JURÍDICA.

Código de Processo Civil:

Art. 46. A ação fundada em direito pessoal ou em direito real sobre bens móveis será proposta, em regra, no foro de domicílio do réu.

Art. 53. É competente o foro:

IV – do lugar do ato ou fato para a ação:

a) de reparação de dano;

1.2.2.                        A quem compete julgar?

R: Juízo do FORO DO DOMÍCILIO DA VÍTIMA!!!

O Tribunal de origem consignou que ações fundadas em direito pessoal devem ser propostas no domicílio do réu, ponderando que o ilícito praticado pela internet não constaria do rol das exceções à regra da competência (art. 46 do Código de Processo Civil).

Contudo, o STJ firmou o entendimento de que, havendo divulgação de ofensas por redes sociais, a competência para julgamento da ação é do foro do domicílio da vítima, em razão da ampla divulgação do ato ilícito. Nesse sentido: (REsp n. 1.347.097/SE, Relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 3/4/2014, DJe de 10/4/2014 e AgRg no Ag 808.075/DF. Relator Ministro Fernando Gonçalves, Quarta Turma, DJe 17/12/2007).

Da mesma forma, no julgamento do Conflito de Competência n. 154.928/SP, decidiu-se que “a competência para apreciar as demandas que envolvam danos morais por ofensas proferidas na internet é o local em que reside e trabalha a pessoa prejudicada, local de maior repercussão das supostas ofensas“.

Apesar de os precedentes citados terem sido proferidos sob a égide do Código de Processo Civil de 1973 (art. 100, V, “a”), o art. 53, IV, “a”, do atual Código reproduziu idêntica norma processual.

1.2.3.                        Resultado final.

A competência para julgamento de ação de indenização por danos morais, decorrente de ofensas proferidas em rede social, é do foro do domicílio da vítima, em razão da ampla divulgação do ato ilícito.

RECURSO ESPECIAL

Nas ações em que se busca o fornecimento de medicamentos de forma gratuita, os honorários sucumbenciais podem ser arbitrados por apreciação equitativa, tendo em vista que o proveito econômico, em regra, é inestimável.

REsp 2.060.919-SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 6/6/2023. (Info 779)

17.1.                   Situação FÁTICA.

Creiton ajuizou ação para obrigar o poder público a arcar com os custos de um medicamento para seu tratamento de câncer de próstata, no que teve sucesso. O remédio tem custo de R$ 148 mil reais, mas o TJ local arbitrou os honorários do advogado de Creiton em apenas mil reais, utilizando-se do critério da equidade.

17.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

17.2.1.                    Questão JURÍDICA.

CPC/2015:

Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.

§ 8º Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2º.

17.2.2.                    Possível o arbitramento por apreciação equitativa?

R: Yeap!

O STJ possui entendimento reiterado de que a fixação da verba honorária com base no art. 85, § 8º, do CPC/2015 estaria restrita às causas em que não se vislumbra benefício patrimonial imediato, como, por exemplo, as de estado e de direito de família.

Nessa linha, veja-se: […] “(II) Apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo” (REsp 1.850.512/SP, relator Ministro Og Fernandes, Corte Especial, por maioria, julgado em 16/3/2022). 6. Na referida assentada, a maioria dos Ministros considerou nítida a intenção do legislador em correlacionar a expressão inestimável valor econômico – prevista no § 8º do art. 85 do CPC – somente para as causas em que não se vislumbra benefício patrimonial imediato, como, por exemplo, nas causas de estado e de direito de família, não se devendo confundir o termo “valor inestimável” com “valor elevado”. […] (AgInt nos EDcl nos EREsp 1.866.671/RS, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado em 21/9/2022, DJe de 27/9/2022).

O mesmo se aplica às demandas voltadas ao custeio de medicamentos para tratamento de saúde, haja vista que não se vislumbra benefício patrimonial imediato.

17.2.3.                    Resultado final.

Nas ações em que se busca o fornecimento de medicamentos de forma gratuita, os honorários sucumbenciais podem ser arbitrados por apreciação equitativa, tendo em vista que o proveito econômico, em regra, é inestimável.

RECURSO ESPECIAL

Para a comprovação da mora nos contratos garantidos por alienação fiduciária, é suficiente o envio de notificação extrajudicial ao devedor no endereço indicado no instrumento contratual, dispensando-se a prova do recebimento, quer seja pelo próprio destinatário, quer por terceiros.

REsp 1.951.662-RS, Rel. Ministro Marco Buzzi, Rel. para acórdão Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Seção, por maioria, julgado em 9/8/2023. (Info 782)

18.1.                   Situação FÁTICA.

Craudio financiou um veículo junto ao Banco Cobromesmo em contrato garantido por alienação fiduciária. Algum tempo depois, deixou de pagar as parcelas combinadas, razão pela qual o banco enviou notificação extrajudicial no endereço indicado no instrumento contratual.

Sem resposta e sem os pagamentos, o banco então ajuizou ação de busca e apreensão do veículo. Inconformado, Craudio alega que não foi constituído em mora, uma vez que não mais residia no endereço do contrato e que o banco não juntou o comprovante de recebimento da notificação extrajudicial.

18.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

18.2.1.                    Questão JURÍDICA.

Decreto-Lei n. 911/1969:

Art. 2o  No caso de inadimplemento ou mora nas obrigações contratuais garantidas mediante alienação fiduciária, o proprietário fiduciário ou credor poderá vender a coisa a terceiros, independentemente de leilão, hasta pública, avaliação prévia ou qualquer outra medida judicial ou extrajudicial, salvo disposição expressa em contrário prevista no contrato, devendo aplicar o preço da venda no pagamento de seu crédito e das despesas decorrentes e entregar ao devedor o saldo apurado, se houver, com a devida prestação de contas.

§ 2o A mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento e poderá ser comprovada por carta registrada com aviso de recebimento, não se exigindo que a assinatura constante do referido aviso seja a do próprio destinatário. 

Código Civil:

Art. 394. Considera-se em mora o devedor que não efetuar o pagamento e o credor que não quiser recebê-lo no tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer.

Art. 396. Não havendo fato ou omissão imputável ao devedor, não incorre este em mora.

18.2.2.                    Necessário o comprovante do recebimento da notificação enviada ao endereço constante no contrato?

R: Nooopsss!!!!

A controvérsia cinge-se a definir se, para a comprovação da mora nos contratos garantidos por alienação fiduciária, é suficiente, ou não, o envio de notificação extrajudicial ao endereço do devedor indicado no instrumento contratual e se é dispensável, por conseguinte, a prova de que a assinatura do Aviso de Recebimento (AR) seja do próprio destinatário.

O art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei n. 911/1969 é expresso ao prever que a mora nos contratos de alienação fiduciária decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento e poderá ser comprovada por carta registrada com Aviso de Recebimento, não exigindo que a assinatura constante do referido aviso seja a do próprio destinatário.

Consequentemente, uma interpretação LITERAL do dispositivo enseja a conclusão de que, para a constituição do devedor em mora, exige-se tão somente o vencimento do prazo para pagamento, não havendo dúvida sobre isso, porquanto o texto da lei utiliza a expressão “simples vencimento”, que, nesse caso, quer literalmente dizer tão somente ou nada mais que o vencimento do prazo para pagamento.

Com efeito, ao dispensar a interpelação do devedor para sua constituição em mora, o legislador estabelece regra que a doutrina denomina de dies interpellat pro homine, ou seja, a chegada do dia do vencimento da obrigação corresponde a uma interpelação, de modo que, não pagando a prestação no momento ajustado, encontra-se em mora o devedor. Assim, se a mora decorre do mero inadimplemento, prescinde de qualquer atitude do credor, já que advém automaticamente do atraso.

Após dispor que a mora decorre do simples vencimento do prazo, o legislador estabeleceu, ainda, que a mora poderá ser comprovada por “carta registrada com Aviso de Recebimento”, dispondo expressamente que não se exige “que a assinatura constante do referido aviso seja a do próprio destinatário”. Nesse contexto, a literalidade da lei, que escolheu o vocábulo “poderá” em vez de “deverá”, e os conceitos jurídicos que ela exprime, por si sós, já são elementos suficientes para dirimir a controvérsia.

Verifica-se, portanto, que a lei estabeleceu que a comprovação é mera formalidade, pois primeiro usa o termo “poderá” e, na sequência, dispensa que a assinatura seja do próprio destinatário. Se é a própria lei que torna não exigível a demonstração cabal de ciência do próprio devedor, não pode ser outra a interpretação do Tribunal de origem e, menos ainda, a do STJ, cuja responsabilidade não se limita à análise do caso concreto, mas vincula, de forma transcendental, as relações contratuais à sua decisão.

Além dessa interpretação literal do dispositivo, da análise SISTEMÁTCIA ressai a conclusão de que pretendeu a lei tão somente estabelecer a forma do processo nas hipóteses em que a garantia do crédito deu-se por alienação fiduciária, na medida em que não se pode ignorar que a cláusula de alienação fiduciária nos contratos caracteriza-se por uma via de mão dupla, ou seja, é uma garantia bilateral, uma vez que a vantagem econômica do contrato é buscada por ambas as partes, não somente pelo credor.

Assim, se, na origem, o contrato é um negócio jurídico bilateral, em que se estabelece a alienação fiduciária em garantia e cujo objetivo é a vantagem econômica e o equilíbrio das relações entre as partes, não se pode permitir que, na conclusão desse mesmo negócio, ocorra um desequilíbrio, ou seja, as regras sejam tendenciosas e, portanto, tragam mais ônus ao credor em benefício exclusivo do devedor.

Também, uma análise TELEOLÓGICA do dispositivo legal enseja inafastável a conclusão de que a lei, ao assim dispor, pretendeu trazer elementos de estabilidade, equilíbrio, segurança e facilidade para os negócios jurídicos, de modo que é incompatível com o espírito da lei interpretação diversa, que enseja maior ônus ao credor, em benefício exclusivo do devedor fiduciante.

Observa-se, ainda, que o entendimento pacífico da Segunda Seção já é no sentido de que, na alienação fiduciária, a mora constitui-se ex re, isto é, decorre automaticamente do vencimento do prazo para pagamento. Ou seja, a mora decorre do simples vencimento do prazo. Naturalmente, tal particularidade significa que o devedor estará em mora quando deixar de efetuar o pagamento no tempo, lugar e forma contratados (arts. 394 e 396 do Código Civil).

Então, se o objetivo da lei é meramente formal, deve ser igualmente formal o raciocínio sobre as exigências e, portanto, sobre a própria sistemática da lei, concluindo-se que, para ajuizar a ação de busca e apreensão, basta que o credor comprove o envio de notificação por via postal ao endereço indicado no contrato, não sendo imprescindível seu recebimento pessoal pelo devedor.

Por fim, frisa-se que essa conclusão abarca como consectário lógico situações outras igualmente submetidas à apreciação do Tribunal, tais como quando a notificação enviada ao endereço do devedor retorna com aviso de “ausente”, de “mudou-se”, de “insuficiência do endereço do devedor” ou de “extravio do aviso de recebimento”, reconhecendo-se que cumpre ao credor demonstrar tão somente o comprovante do envio da notificação com Aviso de Recebimento ao endereço do devedor indicado no contrato.

18.2.3.                    Resultado final.

Para a comprovação da mora nos contratos garantidos por alienação fiduciária, é suficiente o envio de notificação extrajudicial ao devedor no endereço indicado no instrumento contratual, dispensando-se a prova do recebimento, quer seja pelo próprio destinatário, quer por terceiros.

RECURSO ESPECIAL

Em execução por dívida condominial movida pelo condomínio edilício, é possível a penhora do próprio imóvel que dá origem ao débito, ainda que esteja alienado fiduciariamente, devendo o condomínio exequente promover a prévia citação também do credor fiduciário, a fim de que venha integrar a execução, facultando-lhe a oportunidade de quitar o débito condominial.

REsp 2.059.278-SC, Rel. Ministro Marco Buzzi, Rel. para acórdão Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, por maioria, julgado em 23/5/2023, DJe 12/9/2023. (Info 789)

19.1.                   Situação FÁTICA.

Residencial Astra, em cumprimento de sentença de obrigação de pagar despesas condominiais inadimplidas movida em face de Crementino, requereu a penhora do imóvel gerador do débito. O pedido foi indeferido pelo juízo, sob o fundamento de que o mesmo imóvel se encontrava alienado fiduciariamente à Caixa Econômica Federal, tendo apenas admitido a penhora de direitos creditórios decorrentes do respectivo contrato de alienação fiduciária sobre o imóvel.

Inconformado, Astra interpôs sucessivos recursos nos quais sustenta ser penhorável o imóvel gerador das despesas condominiais, ainda que alienado fiduciariamente em garantia, pois referidos débitos possuem natureza propter rem.

19.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

19.2.1. Questão JURÍDICA.

Lei nº 9.514:

Art. 27. Uma vez consolidada a propriedade em seu nome, o fiduciário, no prazo de trinta dias, contados da data do registro de que trata o § 7º do artigo anterior, promoverá público leilão para a alienação do imóvel.

§ 8o Responde o fiduciante pelo pagamento dos impostos, taxas, contribuições condominiais e quaisquer outros encargos que recaiam ou venham a recair sobre o imóvel, cuja posse tenha sido transferida para o fiduciário, nos termos deste artigo, até a data em que o fiduciário vier a ser imitido na posse.

CC/2002:

Art. 1.368-B.  A alienação fiduciária em garantia de bem móvel ou imóvel confere direito real de aquisição ao fiduciante, seu cessionário ou sucessor. 

Parágrafo único.  O credor fiduciário que se tornar proprietário pleno do bem, por efeito de realização da garantia, mediante consolidação da propriedade, adjudicação, dação ou outra forma pela qual lhe tenha sido transmitida a propriedade plena, passa a responder pelo pagamento dos tributos sobre a propriedade e a posse, taxas, despesas condominiais e quaisquer outros encargos, tributários ou não, incidentes sobre o bem objeto da garantia, a partir da data em que vier a ser imitido na posse direta do bem.

19.2.2. Possível a penhora do próprio imóvel?

R: Com certeza!!!!

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que entende que não é possível a penhora do imóvel alienado fiduciariamente em execução de despesas condominiais de responsabilidade do devedor fiduciante, na forma dos arts. 27, § 8º, da Lei nº 9.514/1997 e 1.368-B, parágrafo único, do CC/2002, uma vez que o bem não integra o seu patrimônio, mas sim o do credor fiduciário. Admitindo-se, contudo, a penhora do direito real de aquisição derivado da alienação fiduciária, de acordo com os arts. 1.368-B, caput, do CC/2002, c/c o art. 835, XII, do CPC (REsp 2.036.289/RS, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 18/4/2023, DJe 20/4/2023). Tal solução se mostra correta para o contexto, para um credor comum, o credor normal de um condômino, naquela situação. O credor não poderá penhorar o imóvel do devedor, por estar o bem alienado fiduciariamente ao credor fiduciário, sendo este o titular da propriedade resolúvel da coisa imóvel.

Porém, quando o credor do condômino devedor é o próprio condomínio a solução não se ajusta. É que relativamente ao próprio condomínio-credor, dada a natureza propter rem das despesas condominiais, nos termos do art. 1.345 do Código Civil, haverá necessidade de se promover a citação, na ação de execução, também do credor fiduciário no aludido contrato para que venha integrar a lide, possibilitando ao titular do direito previsto no contrato de alienação fiduciária quitar o débito condominial existente e, em ação regressiva, tentar obter do devedor fiduciante o retorno desses valores.

A razão para tanto está em que não se pode cobrir o credor fiduciário de imunidade contra dívida condominial, outorgando-lhe direitos maiores do que aqueles que tem qualquer proprietário. Quer dizer, o proprietário fiduciário não é um proprietário especial, detentor de maiores direitos do que o proprietário comum de imóvel em condomínio edilício

A natureza propter rem se sobreleva ao direito do próprio credor fiduciário, dado que não é justo que se coloque nos ombros dos demais condôminos a obrigação de arcar com o rateio daquelas despesas, tendo em vista que, de um lado, o devedor fiduciante se sente confortável em não pagar, porque sabe que o apartamento não poderia ser objeto de nenhuma constrição. E, de outro lado, o credor fiduciário se sente tranquilo também, porque, recebendo o dinheiro correspondente ao empréstimo que realizou, não será importunado no seu direito de propriedade, apesar da existência de débitos condominiais que pairam sem uma definição de pagamento.

Dessa forma, é dever de o condomínio exequente promover a citação do credor fiduciário a fim de que ele venha integrar a execução, facultando-lhe a oportunidade de quitar o débito condominial para não ver o imóvel ser arrematado em praça na execução e, assim, se creditar para, em ação regressiva, buscar o ressarcimento desse valor junto ao devedor fiduciante.

19.2.3. Resultado final.

Em execução por dívida condominial movida pelo condomínio edilício, é possível a penhora do próprio imóvel que dá origem ao débito, ainda que esteja alienado fiduciariamente, devendo o condomínio exequente promover a prévia citação também do credor fiduciário, a fim de que venha integrar a execução, facultando-lhe a oportunidade de quitar o débito condominial.

RECURSO ESPECIAL

Uma empresa do mesmo grupo econômico da parte executada só pode ter seus bens bloqueados se o incidente de desconsideração da personalidade jurídica for previamente instaurado, não sendo suficiente mero redirecionamento do cumprimento de sentença contra quem não integrou a lide na fase de conhecimento.

REsp 1.864.620-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 12/9/2023. (Info 789)

20.1.                   Situação FÁTICA.

DGC Incorporadora integra o grupo econômico HBGS e foi surpreendida com bloqueios de seus bens provenientes de decisão judicial em um processo no qual não foi instaurado o incidente de desconsideração da personalidade jurídica.

Na decisão que autorizou os bloqueios, o juiz da execução fez constar que a empresa seria a mesma que a executada, com denominação diversa, constando expressamente na certidão que DGC CONSTRUTORA LTDA seria uma das suas cinco denominações anteriores.

Inconformada, DGC interpôs sucessivos recursos nos quais sustenta obrigatória a instauração de incidente para desconsideração da personalidade jurídica, a fim de que terceiros, além do executado, sejam responsabilizados pelo pagamento de dívida objeto de processo judicial.

20.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

20.2.1.                    Questão JURÍDICA.

CPC:

Art. 134. O incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial.

§ 1º A instauração do incidente será imediatamente comunicada ao distribuidor para as anotações devidas.

§ 2º Dispensa-se a instauração do incidente se a desconsideração da personalidade jurídica for requerida na petição inicial, hipótese em que será citado o sócio ou a pessoa jurídica.

§ 3º A instauração do incidente suspenderá o processo, salvo na hipótese do § 2º.

§ 4º O requerimento deve demonstrar o preenchimento dos pressupostos legais específicos para desconsideração da personalidade jurídica.

CDC:

Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.

§ 2° As sociedades integrantes dos grupos societários e as sociedades controladas, são subsidiariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código.

20.2.2.                    Necessário o IDPJ?

R: Com certeza!!!!

A previsão de responsabilidade civil subsidiária, inerente ao direito material, não exclui a observância das normas processuais, garantidoras do contraditório e da ampla defesa, incluindo, entre outras, o incidente de desconsideração da personalidade jurídica.

Nesse aspecto, numa interpretação SISTEMÁTICA do Código de Defesa do Consumidor, é possível observar que a previsão de responsabilidade civil subsidiária das sociedades integrantes de um mesmo grupo encontra-se inserida na seção que trata da desconsideração da personalidade jurídica.

Dessa forma, para que uma empresa, pertencente ao mesmo grupo econômico da executada, sofra constrição patrimonial, é necessária prévia observância dos procedimentos específicos da desconsideração da personalidade jurídica, que pode ser instaurada, inclusive, na fase de cumprimento de sentença ou na execução fundada em título executivo extrajudicial, nos termos do art. 134 do CPC.

Ressalte-se que a instauração do incidente de desconsideração é norma processual de observância obrigatória, como forma de garantir o devido processo legal.

Nesse sentido, a Terceira Turma do STJ  manifestou-se quanto à impossibilidade de mero redirecionamento do cumprimento de sentença àquele que não integrou a lide na fase de conhecimento: Uma vez formado o título executivo judicial contra uma ou algumas das sociedades, poderão responder todas as demais componentes do grupo, desde que presentes os requisitos para a desconsideração da personalidade jurídica, na forma do art. 28, § 2º, do CDC, sendo inviável o mero redirecionamento da execução contra aquela que não participou da fase de conhecimento. (AgInt no REsp 1.875.845/SP, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 16/5/2022, DJe 19/5/2022.)

20.2.3.                    Resultado final.

Uma empresa do mesmo grupo econômico da parte executada só pode ter seus bens bloqueados se o incidente de desconsideração da personalidade jurídica for previamente instaurado, não sendo suficiente mero redirecionamento do cumprimento de sentença contra quem não integrou a lide na fase de conhecimento.

RECURSO ESPECIAL

O exequente responde objetivamente pela reparação de eventuais prejuízos causados ao executado, tendo em vista o risco da execução.

REsp 1.931.620-SP, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, por maioria, julgado em 5/12/2023. (Info 798)

21.1.                   Situação FÁTICA.

CobroMesmo ajuizou ação de execução em face de Coitadeza Ltda. A executada se viu obrigada a realizar contratação de carta de fiança para segurança de juízo, a fim de exercer o contraditório e evitar excussão patrimonial, que lhe seria ainda mais gravosa, com a inevitável penhora de valor de grande monta – o valor executado era a “ninharia” de R$ 34.2 mião (trinta e quatro milhões e duzentos mil reais).

Ocorre que a execução foi posteriormente extinta, razão pela qual Coitadeza então requereu a responsabilização do exequente pelos prejuízos por ela sofridos.

21.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

21.2.1.                    Questão JURÍDICA.

CPC:

Art. 520. O cumprimento provisório da sentença impugnada por recurso desprovido de efeito suspensivo será realizado da mesma forma que o cumprimento definitivo, sujeitando-se ao seguinte regime:

I – corre por iniciativa e responsabilidade do exequente, que se obriga, se a sentença for reformada, a reparar os danos que o executado haja sofrido;

Art. 776. O exequente ressarcirá ao executado os danos que este sofreu, quando a sentença, transitada em julgado, declarar inexistente, no todo ou em parte, a obrigação que ensejou a execução.

21.2.2.                    O exequente responde?

R: OBJETIVAMENTE!!!

Cinge-se a controvérsia à análise atinente ao cumprimento dos requisitos previstos no art. 776 do CPC para viabilizar a responsabilização do exequente pelos danos provocados ao executado na hipótese de extinção da execução.

O exequente é responsável pelos prejuízos que acarretar ao executado, quando buscar em juízo a satisfação de dívida inexistente ou inexequível, seja pela via executiva, seja pela via do cumprimento de sentença. Essa expressa responsabilização do exequente encontra-se prevista no sistema processual vigente, cujas normas dos arts. 520, I, e 776 do CPC apenas reproduzem as normas extraídas dos arts. 475-O e 574 do CPC/1973, não se tratando, pois, de inovação legislativa.

A leitura do texto legal evidencia a irrelevância do elemento subjetivo do exequente para fins de atribuição de sua responsabilidade, razão por que pode-se afirmar, em regra, a adoção da modalidade objetiva para responsabilização do exequente.

Esse entendimento no sentido da responsabilidade objetiva do exequente vem sendo acolhido pacificamente pelo STJ quando se está diante de cumprimento provisório de sentença, bem como nas hipóteses de execução de título extrajudicial. Também no que tange à responsabilização do exequente em hipóteses de cumprimento definitivo da sentença, tem-se admitido doutrinariamente a dispensa de perquirição de culpa.

A questão da extinção da execução encontra-se superada, em virtude da imutabilidade da decisão que efetivamente extinguiu o cumprimento de sentença arbitral. É fato consumado – albergado pela coisa julgada – a extinção do cumprimento da sentença arbitral, que se deu sob o fundamento de ausência dos requisitos de exequibilidade do título (certeza, liquidez e exigibilidade).

Nesse cenário, deve prevalecer a imputação da responsabilidade civil objetiva do exequente, que deverá suportar o ônus da extinção definitiva da execução, compreendendo a reparação dos prejuízos concretos experimentados pela parte executada, ora recorrida, nos termos do art. 776 do CPC.

Outrossim, no caso, a contratação de carta de fiança foi necessária para segurança de juízo, a fim de ensejar o contraditório e resguardar o executado da excussão patrimonial, que lhe seria ainda mais gravosa, com a inevitável penhora de valor de grande monta – valor executado de R$ 34.200.000,00 (trinta e quatro milhões e duzentos mil reais). Os custos comprovados dessa contratação, portanto, enquadram-se no conceito jurídico de prejuízo, sendo passível de ressarcimento, em hipóteses de extinção da demanda executiva.

21.2.3.                    Resultado final.

O exequente responde objetivamente pela reparação de eventuais prejuízos causados ao executado, tendo em vista o risco da execução.

RECURSO ESPECIAL

Os honorários advocatícios sucumbenciais devem ser fixados, em regra, com observância dos limites percentuais e da ordem de gradação da base de cálculo estabelecida pelo art. 85, § 2º, do CPC/2015, sendo subsidiária a aplicação do art. 85, § 8º, do CPC/2015, apenas possível na ausência de qualquer das hipóteses do § 2º do mesmo dispositivo.

REsp 1.931.669-SP, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, por maioria, julgado em 5/12/2023. (Info 799)

22.1.                   Situação FÁTICA.

Dr. Creysson, advogado da RH Informática, defendeu seu cliente em ação em promovida por empresa concorrente, na qual foram formulados vários pedidos na petição inicial que alcançam valor milionário. Em recurso, sustenta que tendo a autora sucumbido na maior parte de seus pedidos, deveria a condenação dos honorários ter como base esse valor.

Ao tratar do tema, o TJ local decidiu que a parte ré é que deveria pagar honorários, considerando que vencedora exclusivamente nos danos emergentes, cujo valor não foi especificado e estaria sujeito a eventual liquidação.

22.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

22.2.1.                    Questão JURÍDICA.

CPC/2015:

 Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.

§ 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:

I – o grau de zelo do profissional;

II – o lugar de prestação do serviço;

III – a natureza e a importância da causa;

IV – o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.

§ 8º Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2º.

22.2.2.                    Apreciação equitativa só em últimos casos?

R: Mais ou menos por aí…

O entendimento jurisprudencial da Segunda Seção do STJ, firmado por ocasião do julgamento do REsp 1.746.072/PR em 13/2/2019, afirma que os honorários advocatícios sucumbenciais devem ser fixados, em regra, com observância dos percentuais e da ordem de gradação da base de cálculo estabelecida pelo art. 85, § 2º, do CPC/2015, nos seguintes termos: 1º) com base no valor da condenação; 2º) não havendo condenação ou não sendo possível valer-se da condenação, com base no proveito econômico obtido pelo vencedor; ou 3º) não sendo possível mensurar o proveito econômico obtido, sobre o valor atualizado da causa.

Segundo essa posição, é subsidiária a aplicação do art. 85, § 8º, do CPC/2015, apenas possível na ausência de qualquer das hipóteses do § 2º do mesmo dispositivo: “assim, a incidência, pela ordem, de uma das hipóteses do art. 85, § 2º, impede que o julgador prossiga com sua análise a fim de investigar eventual enquadramento no § 8º do mesmo dispositivo, porque a subsunção da norma ao fato já se terá esgotado“.

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, recentemente, no julgamento do Tema 1.076 dos Recursos Repetitivos, reafirmou o entendimento da Segunda Seção e assentou jurisprudência no sentido de que: I) a fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória nesses casos a observância dos percentuais previstos nos §§ 2º ou 3º do artigo 85 do CPC – a depender da presença da Fazenda Pública na lide -, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa; II) apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo (REsp 1.850.512/SP, Relator Ministro Og Fernandes, Corte Especial, DJe de 31/5/2022).

22.2.3.                    Resultado final.

Os honorários advocatícios sucumbenciais devem ser fixados, em regra, com observância dos limites percentuais e da ordem de gradação da base de cálculo estabelecida pelo art. 85, § 2º, do CPC/2015, sendo subsidiária a aplicação do art. 85, § 8º, do CPC/2015, apenas possível na ausência de qualquer das hipóteses do § 2º do mesmo dispositivo.

Fonte: Estratégia Concursos

Download disponível – Informativo STJ Comentado – Revisão 2023.2 Civil e Processo Civil



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